Correio da Cidadania

Conciliar Plano de Direitos Humanos com o interesse das Forças Armadas é “inaceitável”

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Lançado nos estertores de 2009, o 3º. Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3) ganhou corpo no debate público apenas no início deste ano. Atacado pela mídia grande por todos os lados, o ponto nevrálgico do plano indiscutivelmente foi a idéia de se criar uma ‘Comissão da Verdade’ a fim de investigar e elucidar os crimes cometidos por agentes da ditadura que transcorreu de 1964 a 1985.

 

Em extensa entrevista ao Correio da Cidadania, o jornalista e ex-militante da Ala Vermelha Alípio Freire aponta Nelson Jobim, ministro da Defesa, como nefasto defensor dos interesses em tapar a história por parte das Forças Armadas. Além de lembrar de suas articulações para ocupar o atual cargo, lembra que o Jobim, antes de tudo, é um fraudador da Constituição, que, nas discussões do plano, atropelou os três poderes da república, o que culminou na retirada do termo ‘repressão política’ do texto do plano.

 

A respeito do PNDH 3, diz ser um importante instrumento de aprofundamento da democracia nacional, não apenas no que se refere a jogar luzes sobre o passado, mas também no que concerne às atuais lutas por um Brasil igualitário. E sobre a tentativa de se obstruir o debate completo, assinala que todas as entidades envolvidas estão apoiando, primeiro, a existência do plano, para depois tratarem de discuti-lo com a sociedade. Como exemplo, Alípio fala da própria igreja católica, contrária ao aborto, mas a favor da instauração completa do PNDH 3.

 

A entrevista completa pode ser conferida a seguir.

 

Correio da Cidadania: O que o senhor pensa do 3º Plano Nacional de Direitos Humanos, anunciado pelo governo no final de 2009?

 

Alípio Freire: Em primeiro lugar, acho muito bom, com muitas coisas que há tempos são reivindicadas por parcelas de nossa sociedade. Este plano é mais completo que os dois anteriores, pois busca contemplar também direitos e necessidades econômicas e sociais. Portanto, vejo um grande avanço.

 

Pela forma como é conduzido o processo, com os representantes de diversos setores da sociedade civil, dos direitos humanos, mulheres, negros, homossexuais, movimentos organizados dos trabalhadores, será fantástico se conseguirmos aprová-lo.

 

Mas tem um capítulo, que gerou a crise criada pelo senhor Jobim, que é a questão do julgamento e responsabilização de torturadores da ditadura. Esse é o grande mote da atitude do Jobim no final do ano passado.

 

CC: No caso específico da instauração de uma Comissão da Verdade para tentar apurar crimes da ditadura, qual a sua opinião?

 

AF: Essa que é a bola da vez. É fundamental que tenhamos tal comissão, que originalmente é da Verdade e da Justiça. Mas em negociações do Jobim com o presidente já havia sido retirada a palavra justiça. A palavra é o de menos, pois obviamente, se procuram a verdade, a conseqüência tem de ser justiça. No entanto, para eles o importante era retirar essa palavra.

 

Em relação ao plano, o centro da questão para eles é a luta armada. E com relação à luta armada, eu diria o seguinte (aliás, eu e outros fomos processados pela luta armada): nos ordenamentos jurídicos da colônia e do império, existia uma cláusula dizendo que todo patrão que assassinasse seus escravos o fazia em legítima defesa. O grande Luiz Gama inverteu a equação: todo escravo que matasse seu patrão o fazia em legítima defesa. Em relação à ditadura e à reação armada, estou com Luiz Gama também, enquanto que eles continuam com os ordenamentos do tempo da colônia e do império. Querem reeditar algo que vem do escravismo.

 

Mas digo que todos que reagiram, não importa por quais meios, contra um regime que atropelou nossa Constituição, tinha a violência como parte do programa (pois sem ela não chegariam ao poder) e que, ao chegar ao poder, montou um projeto de subordinação ao grande capital internacional, ou seja, de venda do Brasil, baseado na concentração de renda e esbulho da classe trabalhadora, o fizeram de forma legítima.

 

Sendo assim, como no império eu estaria ao lado dos escravos, com Luiz Gama, continuo pensando agora a mesma coisa. Eles não tiveram o menor prurido em usar as violências mais abjetas. E esta violência foi igual para quem fez e para quem não fez a luta armada. O deputado Rubens Paiva, por exemplo, é desaparecido até hoje. O que eles fizeram, já no período de abertura, contra o comitê central do PCB, que se opunha à saída armada pela esquerda, foi terrível. Sabe-se hoje que o David Capistrano foi esquartejado. Sabem-se também de duas execuções com a coroa de cristo, aquele torniquete que pressiona a cabeça até estourar. Eu conheço dois casos assim, da Aurora Maria do Nascimento Furtado, a Lola, no Rio de Janeiro, e do Aldo de Sá Brito, em Belo Horizonte.

 

Embora eu prefira os métodos menos violentos, contra o tirano toda rebeldia é legítima. Quem instalou a violência no país foram eles. Mas não só os militares, isso que é importante ver. A articulação do golpe, observávamos, era feita fundamentalmente pelos grandes empresários, a grande indústria, os bancos. Gente como Magalhães Pinto, Carlos Lacerda, Adhemar de Barros, todos civis aliados ao governo dos EUA, através de seu embaixador Lyncoln Gordon e outros contatos, os setores da chamada direita ideológica e todos aqueles que foram formados na ideologia da Doutrina de Segurança Nacional na Escola Superior de Guerra, tanto civis quanto militares; também parte hegemônica da alta cúpula da igreja católica, ou seja, o Vaticano, e não os cristãos brasileiros, muito pelo contrário, pois muitos foram assassinados, sendo, portanto, um problema da instituição e não da religião.Num primeiro momento, tivemos a oposição de dois leigos que eram pessoas fantásticas da igreja: Madre Cristina em São Paulo e o professor Helio Pellegrino no Rio de Janeiro; e, claro, a alta cúpula das Forças Armadas em sua maioria.

 

Não é verdade que o corte seja entre militares de um lado e civis de outro. Assim como tivemos civis no golpe, muitos militares eram contra o golpe, como os legalistas, os constitucionalistas (e esse é o papel do exército, defender nossa Constituição e fronteiras), os nacionalistas e os de esquerda. Tanto que é imenso o número de militares que foram expurgados das Forças Armadas. O Capitão Carlos Lamarca é um caso conhecido, mas não o único.

 

Portanto, acho que a discussão tem de deixar muito claro que o golpe de 64 é uma revanche. A maioria das classes dominantes, a elite econômica, estava contra um projeto que visava desenvolvimento nacional com distribuição de renda, e as reformas de base mostram isso, além de outros padrões de maior independência nas relações internacionais com outros países.

 

CC: Como encara, portanto, a crise que se instalou no governo, entre militares e ministros ligados à área de direitos humanos? A conciliação com o interesse das Forças Armadas, retirando-se a expressão ‘repressão política’, foi aceitável?

 

AF: Em primeiro lugar, eu não aceito nenhuma solução em que se tente nivelar torturadores com rebeldes que resistiram à ditadura, não importando os meios dessa resistência. E eles sempre ensaiaram, e felizmente a esquerda brasileira não assume isso, incluir todos da luta armada. E já disse o que penso disso.

 

Dessa forma, a solução para os que violaram os direitos humanos, apesar de ainda não ter lido todo o decreto, para mim é inaceitável, um retrocesso. O mais grave é o que fez o Jobim: de uma vez só ele atropelou o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

 

Como? Em primeiro lugar, a proposta elaborada pelo ministro Paulo Vannucchi foi assinada e apoiada por vários outros ministros, quase todos, e foi remetida ao presidente, que a transformou em projeto para ser avaliado, discutido e votado no Congresso Nacional, ou seja, primeiro o Executivo, depois o Legislativo. E há a questão da Lei da Anistia, que está para ser julgada no STF. Portanto, os três poderes da República. Ele e os representantes das três armas, pelo que se diz, teriam feito cartas de demissão, conspirando na ausência do presidente (pois estava viajando, por isso se tratava de uma conspiração) para derrubar algo que não passava de projeto. Eles não aceitam nem discutir o projeto.

 

No entanto, não há nada a esperar do doutor Nelson Jobim. Seu primeiro grande sucesso foi ter fraudado o texto da Constituição. Ele até escreveu sobre o assunto. Trata-se de um fraudador da Constituição. Em segundo, é uma pessoa que não teve o menor pudor, com seus pares, em gerar uma crise aérea artificial que terminou num desastre aéreo, matando 200 pessoas para chegar ao seu objetivo, o posto de ministro. E para quê? Para privatizar os aeroportos brasileiros. Ele se imiscui nessa questão do pré-sal sobretudo para conseguir um novo conceito de defesa e uma nova Lei de Segurança Nacional, semelhante àquela que os movimentos populares, as forças de esquerda e a classe trabalhadora brasileira conseguiram derrubar no começo dos anos 80. É possível verificar isso na internet inclusive.

 

Outra vez viria a velha doutrina de segurança nacional, onde as Forças Armadas, ao invés de terem como missão a garantia de nossas fronteiras e Constituição, fariam o papel de polícia interna, vigiando os supostos inimigos internos. E quem são os inimigos internos? Todos que não concordam com a ordem do capital, ou que concordam, mas desejam avanços na área de direitos humanos. Acho que uma pessoa dessas, que frauda a Constituição e arma uma situação que termina no extremo de um desastre de avião, para ele e seu grupo se locupletarem, deixa de ser um problema político. Passa a ser problema daquelas antigas, e extremamente conservadoras, delegacias de jogos e costumes. Nenhum cidadão brasileiro sério pode ficar calado e aceitar isso.

 

CC: Acha válida, nesse sentido, a revisão da Lei de Anistia, segundo o princípio de que a anistia não poderia ser extensiva aos militares, visto que seus crimes não teriam sido políticos?

 

AF: Ninguém está propondo a revisão da Lei de Anistia. Isso é uma coisa que a imprensa e a direita geram. O documento não propõe nada de revisão dessa lei, inclusive porque existem argumentações brilhantes sobre isso, como a do Dr. Fabio Konder Comparato, que sustentam que a citada lei não anistia torturadores e responsáveis por torturas. Isso também é uma maneira de enganar a opinião pública; ninguém quer essa revisão.

 

Processos como o da família Teles estão sendo encaminhados nessa linha inclusive.

Aliás, seria uma loucura o Congresso, com a composição atual, com a corrupção à solta, querer votar uma revisão da Lei de Anistia. A legislação que existe é essa, e vamos aprofundá-la e colocá-la em prática. Só isso.

 

CC: O senhor acredita que o plano se trata também de um desencargo de consciência do PT, que ao longo de seus sete anos no poder não atendeu às demandas populares que o elegeram?

 

AF: São três coisas diferentes: o PT, o governo Lula e o lulismo. São três esferas diferentes pra entendermos o que acontece. O governo Lula se destaca por uma composição quase esquizofrênica. De um lado, há ministros como Tarso Genro, Paulo Vannuchhi, Temporão... De outro, o Stephanes. Vimos que ele também veio pra cima defender as terras, dizendo ser um preconceito contra a agroindústria... Mandam há 500 anos no Brasil, estamos do jeito que estamos e o sujeito fala em preconceito!

 

Dessa forma, acho que as diversas áreas, com o Lula sempre no meio negociando e mantendo o controle, desenvolvem aquelas questões que lhes parecem mais adequadas. O Vannucchi e o Tarso sempre trabalharam no aprofundamento das questões de direitos humanos, desde o primeiro momento de suas gestões. Aí não se trata do lulismo, da presidência da República strictu sensu, ou do PT. É uma iniciativa fundamentalmente do Paulo e de outros petistas, ou não, que o apóiam.

 

Aliás, tiveram a virtude, juntamente com outros ministérios, de transformar essa discussão da repressão nos anos de ditadura, e a questão dos mortos e desaparecidos em particular, num assunto da sociedade. Saiu do gueto o assunto.

 

Primeiro a idéia do ministro Tarso Genro de criar uma Comissão de Anistia, similar às Caravanas da Anistia, saindo de Brasília, sendo que lá só repercutiam canalhices do gênero de ditabranda ou bolsa ditadura que alguns diziam. Isso repercutia e era o que a sociedade ficava sabendo através do sul maravilha.

 

Se numa cidade como São Paulo esse assunto se dilui com outros, numa cidade menor uma Caravana da Anistia é ‘o’ assunto, todos passam a discutir. Quando o Paulo sai para colocar as placas nos lugares onde tombaram os resistentes, nas escolas, sindicatos que tiveram seus membros assassinados, também se está jogando conhecimento para a população sobre este episódio da história do Brasil, com o governo assumindo o tema como política de governo e de Estado. Nesse sentido, além de outros, as gestões de Genro e Vannucchi são excelentes, colocando nas ruas um programa que a direita sempre tentou colocar no gueto e que a esquerda não tinha conseguido transformar em discussão pública.

 

CC: O plano não corre, no entanto, o risco de virar uma peça eleitoreira do governo, por seu caráter de aprofundamento da democracia?

 

AF: Eu acho que não. Quem está tirando proveito eleitoreiro disso é a direita. E o alvo é a virtual candidata Dilma. O tipo de material contra ela que tem circulado mostra isso. Não há nada contra mim, que fui da Ala Vermelha, ou contra o Manuel Cyrillo, que foi da ALN, por exemplo. É contra a Dilma.

 

Num certo sentido é divertido, pois, quanto mais eles batem, e sem argumentos, mais se discute. Quem tenta tirar proveito disso é a ultra-direita ou alguns setores do PSDB. Não falo das bases do partido, do cidadão comum que vota neles.

 

Não vamos tratar a questão como partidária ou eleitoral, e sim como de aprofundamento da democracia no Brasil. E aí estamos com qualquer um que defenda os princípios e medidas do plano.

 

CC: O que pensa das correntes que se desagradaram com pontos específicos, como a igreja católica na questão do aborto? Pode-se dizer que tais interesses segmentados prejudicam a discussão, faltando uma visão mais ampla do que está em jogo?

 

AF: Teve até um debate sobre isso no Sindicato dos Jornalistas. Eu, particularmente, sou a favor da questão do aborto, da união dos homossexuais, mas está lá no plano e a solução é o debate dentro do Congresso, que é o instrumento oficial para tal. Para a sociedade, estamos defendendo o plano em bloco. Em específico, apenas a questão da Comissão da Verdade, por ser o alvo central dos ataques, considerando todas as discussões absolutamente legítimas enquanto parte da construção democrática. É natural que no nosso campo existam discordâncias. Eu discordo de setores da igreja que são nossos companheiros. Mas temos de saber levar e discutir essas coisas no momento e do jeito corretos.

 

Inclusive, acho muito ruim que, ao invés de ir em cima da questão da verdade, o presidente diz ser contra o aborto. Ninguém estava contestando o aborto. Que jogue a divisão para dentro do nosso exército. Eles que se dividam lá, com o Jobim. Essas são justas contradições no meio do bloco que tenta aprofundar a democracia no Brasil, que tenta transformar este num país igualitário. Não adianta liberdade sem igualdade; assim, é apenas liberdade de exploração, o mais forte sobre o mais fraco.

 

Portanto, todo esse bloco que defende o plano, mesmo os católicos, está defendendo o plano em conjunto. As nossas divergências, que não se colocam agora, podem ser debatidas depois que existir o plano.

 

Eu não vejo problema em ver representantes da igreja dizendo que não podem assinar a idéia por conta de um ou outro ponto. Não tem problema, ninguém é inimigo de ninguém, pois o sujeito está cumprindo o mandato deste setor. Pessoalmente, gostaríamos que fosse diferente, mas entendemos o que ele representa. Aliás, se os políticos cumprissem os mandatos que lhes são atribuídos, o país estaria diferente. Posso discordar do conceito deles, mas não da postura, por saber do universo que representam. E estão sendo extremamente maleáveis em retirar do centro do debate essa questão do aborto que até o presidente lançou – e não deveria fazê-lo. Essa é uma visão divisionista, não agrega, pelo contrário, apenas enfraquece.

 

CC: Quanto à cobertura da mídia, realmente, pelos meios de comunicação mais massivos, parece só haver pontos negativos e passíveis de críticas no plano...

 

AF: (risos) A grande mídia comercial está fazendo o papel que sempre fez. Essa articulação é a mesma composição de 64: a direita dos militares, os mais atrasados deles, aquele religioso que todo mundo sabe ser uma pessoa de visão extremamente residual da igreja católica e que foram buscar para falar, e a grande mídia comercial, que fala em nome de grandes setores do comércio, indústria, agora todos fundidos numa coisa só.

 

Ou seja, ela continua apostando no que há de mais atrasado. A questão não é de ser contra ou a favor do aborto, por exemplo. A grande mídia é a favor do lucro antes de tudo. Prova disso é que, se pegarmos o seu Brilhante Ustra, os depoimentos dele, vemos que faz pura chantagem em cima de suas chefias. Ele entrega todo mundo, querendo dizer: ‘ou vocês seguram a minha, ou entrego todo mundo, não vou dançar sozinho’.

 

Portanto, eles têm rabo preso historicamente, têm seu projeto e seus lucros a defender. E a grande mídia comercial brasileira é a instituição mais desmoralizada do país, não é o Congresso. Pegue uma revista como a Veja: embora tenha influência em vários setores, várias falcatruas políticas também têm influência. Em termos de desmoralização, que hoje é muito extensiva, a mídia é a instituição mais desmoralizada.

 

Não houve nem clareza, por exemplo, sobre a entrega das cartas de demissão ao Lula no dia 21/12... Há também o caso da gravação do suposto grampo sobre Gilmar Mendes e Demóstenes Torres... Enfim, aquilo ali foi plantado ou vazado pelo senhor Jobim intencionalmente. O que é intolerável é uma reunião entre o ministro da Defesa e o presidente do STF em dezembro. Não acho que queriam derrubar o presidente, mas queriam dar um golpe no ministro dos Direitos Humanos.

 

CC: O senhor acabou de falar que o golpe de 64 foi uma revanche. O que pensa dos setores que tacham todo esse debate acerca das punições aos criminosos da ditadura como revanchista?

 

AF: Para finalizar, vamos deixar claro, não se trata de revanche. Isso seria se quiséssemos aplicar a eles o que aplicaram naqueles anos, levando-os para cárceres clandestinos, deixando-os incomunicáveis, pelo tempo que definíssemos, fazendo-os desaparecer para a família e a sociedade, em seguida fazendo denúncias naquela ópera bufa que era o julgamento nos tribunais de guerra. Não queremos isso, queremos um processo legal, onde eles tenham o mais pleno direito de defesa, com um processo completamente às claras e público.

 

Aquilo foi o terror de Estado no Brasil. Os maiores terroristas foram eles. Até porque nenhum processo da ditadura terminou em condenação por terrorismo. Essa palavra serve a políticas como a aplicada pelo senhor Bush, às quais Obama tentará dar mais charme para continuar. Ninguém foi condenado por terrorismo.

 

E se nós não julgarmos os terroristas, isto é, os agentes do Estado e civis organizados pela ultra-direita, que tinham uma relação promíscua com agentes do Estado, com comunicação com ministros, como a Falange Pátria Nova e o CCC, continuaremos tendo torturas em nosso país, como nas periferias de grandes cidades, no campo e suas chacinas rurais...

 

Se lembrarmos que, em maio de 2006, cerca de 490 pessoas foram assassinadas em seis dias por agentes do Estado, sem mais nem menos, por vingança à ofensiva do PCC, é algo terrível. É quase a mesma quantidade de assassinados durante toda a ditadura!

 

Por isso, vários movimentos e organizações de bairros estão lutando pelo 3º. Plano Nacional de Direitos Humanos, e têm procurado participar de todas as nossas batalhas.

 

Portanto, esse objetivo não é só nosso, dos que querem esclarecer o passado. Até porque memória sem presente e nem futuro é nostalgia ou narcisismo. O que procuramos é exatamente saber no presente como se constrói um país e se transforma isso aqui num lugar decente. Como ampliar direitos e criar isonomia. Por isso é importante se reportar ao passado, como uma arma de luta.

 

Gabriel Brito é jornalista.

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Comentários   

0 #2 A MODERNA REDENTORARicardo 23-01-2010 12:13
Nessa forma de poder abominável e inadmissível que é a ditadura há que se fazer um paralelo entre o modelo de despotismo do passado e o atual.
Contemporâneos ou sobreviventes de um regime ditatorial do passado tendem a difundir às novas gerações as características desse regime e seus componentes sempre traumáticos, tal como foram vivenciados. Nada mais coerente, não fosse o fato desse procedimento nos remeter hoje à conclusões superficiais e menos abrangentes dessa forma de poder.
Ditaduras também evoluem, se transformam e seguem imperceptíveis, fragmentadas e fugidias do modelo convencional – centralizador e compactado. Com novas cosméticas e principalmente o domínio dos meios de comunicação – bons ou ruins, mas hoje ”democratizados”, ou seja, acessível a todos – seus efeitos são ainda mais devastadores do que no modelo tradicional.
Nossos “democráticos” legisladores e executores pós-regime militar, com seus patrocinadores (poderes privados) agora explícitos, não mais sucumbem diante da total impossibilidade de eliminação da “subversão” atual e seu crescente contingente sempre à margem das chafurdas historicamente ligadas ao Poder.
Reside aí o segredo da “moderna política” – a “dita” cínica e disfarçada – e seus artífices nos poderes oficiais e paralelos, no Brasil “eleitos” eletronicamente em mídias e urnas – e nessas últimas, num ineditismo mundial (e sabidamente questionável) de manutenção dessa forma de sufrágio.
Desde o fim da “redentora”, em nosso moderno “emfa” – estado (dito) menor de forças amadas (pela população em sua maioria) – nossos comandantes sem fardas das linhas de frente, oficiais ou dos bastidores, seguem imbatíveis e múltiplos nos 3 e demais poderes “democráticos” (Comunicações, Financeiro e afins), passando ao largo de qualquer bombardeio setorial inútil e infantil por parte dos “subalternos” civis (eleitores).
Presidentes – máximos representantes das forças “amadas” – deixaram de ser o alvo principal de todos os ataques. Seus regimes e novas metodologias políticas surtem efeito com a transferência, por exemplo, de toda a discussão social para o círculo dos “subalternos” (reles eleitores), em embates políticos simplistas reduzidos a meras questões de partidos, suas doutrinas (ainda existem?), seus representantes e as respectivas “brigas” (?) entre si, num constante espetáculo pré-eleições protagonizados pelos “da esquerda” ou “da direita”, em “divergências” definitivamente eliminadas em acordos notórios pós-tomada do poder por uns ou por outros. O eterno “mais do mesmo”.
No mesmo viés metodológico, a tortura também foi aprimorada. Em outros tempos, tal método era físico, executado por outrem, concentrado e sem rodeios. Hoje é psicológico e auto-praticado, rarefeito e de morte lenta para a população subalterna e indignada (ou “subversiva”), e auto-destrutivo e de morte rápida nas crescentes formas de violência e miséria das periferias.
Em nosso modelo atual de ditadura, a violência também impera – com a diferença de ter sido transferida (ou “democratizada”) para a população entre si. Com o peso da violência nas costas e totalmente impotente para tirá-lo, nossa sociedade “bem informada” e “politizada” volta suas miras de atiradeira inúteis apenas para alguns “quartéis” em separado (vide Daniel Dantas, STF, Sarney, Senado, Arruda e afins, em exemplos mais recentes) - o que não deixa de ser motivo de orgulho “democrático” dos nossos líderes (Oh, Maquiavel!), desde sempre velhacos e modernamente eleitos (urnas eletrônicas). Líderes e ferrenhos opositores da “dita” convencional de ontem e hoje confortavelmente adaptados às bene$$e$ do poder - com o aval dos eleitores diretos (“participantes políticos”), como manda a democracia.
Fecha-se o círculo no maior dos paradoxos políticos: temos em nossa “moderna e democrática política” uma nova forma de ditadura – a eleita diretamente por quase toda a população.
Justo é abominar o que passou. Difícil e menos cômodo é “cair na real” do tempo presente em meio ao colossal bombardeio informativo civil, moderno e fragmentado, a “fazer cabeças” no estalar de dedos da correria contemporânea do eterno Brasil de baixo.
Nesse contexto, palmas para o 1º Mundo e sua sábia reinvenção das comunicações, agora de fácil manipulação, acessível a todos e “democratizadas”. Primeiro Mundo a também elogiar – agora e mais do que nunca - a “competência” dos nossos “caras”, entre outras “gentilezas”.
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0 #1 Baitas EditoriaisRaymundo Araujo Filho 21-01-2010 12:52
Considero desnecessária apublicaçãodocomentárioque fiz, ao artigo do Paulo Metri, na direçãodiametralmente oposta as dosartigos do rof.Mario maestri, este editorial do excelente Gabriel Brito.

Mas, se alguémquiser obêr otal comentário, é sósolicitarpelo e-mail
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