Correio da Cidadania

O Socialismo e a Ecologia

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A questão ecológica trouxe novos desafios aos que têm convicções socialistas. Significa que o instrumental analítico histórico dos socialistas não é mais suficiente, embora continue essencial, para compreender a realidade.

 

O capitalismo não tem solução para a questão ecológica. O capitalismo verde é um jogo de aparências, de marketing, não uma solução para problemas reais. Basta ver que o "mercado de carbono", assim como os "selos verdes", serve para alimentar a propaganda de certas empresas, mas não para resolver o problema fundamental do planeta.

 

Portanto, não está em discussão nesse texto o capitalismo esverdeado, mas as insuficiências dos instrumentais analíticos do socialismo para compreender a nova realidade em que se encontra a humanidade e o planeta no qual habitamos.

 

Hoje precisamos incorporar em nossas análises os instrumentos analíticos que nos oferecem as ciências da Terra, particularmente a climatologia. Esse instrumental analítico ainda está para ser organicamente construído.

 

A dificuldade da esquerda, em geral, é que não consegue compreender e respeitar a "alteridade da Terra". É difícil para quem pensa deter a chave de interpretação da história admitir que a Terra é autônoma em relação ao ser humano, que tem suas próprias leis, enfim, que ela não depende do ser humano, mas o ser humano depende dela. É a quarta humilhação humana. As três primeiras nos foram ensinadas por Lúcio Flório, um teólogo argentino.

 

A primeira humilhação é que nos julgávamos o centro do universo e descobrimos que a Terra é um planeta que gira em torno do Sol, uma estrela de quinta categoria numa franja de uma galáxia. A segunda humilhação nos foi imposta por Darwin. O ser humano, biologicamente, não é mais que um descendente dos macacos. A terceira humilhação nos foi imposta por Freud. Cada pessoa é um poço de desejos e interesses instintivos e inconfessos. A quarta humilhação humana eu acrescento por conta própria e nos foi imposta por Lovelock: a Terra é um ser vivo autônomo que não depende do ser humano, ao contrário, o ser humano depende dela para existir.

 

A esquerda está aberta para compreender e respeitar as leis da Terra? Ou vai continuar dependendo dos paradigmas produtivistas dos capitalistas?

 

Enfim, hoje não há como falar do socialismo do século XXI sem considerar teórica e praticamente a queda do muro de Berlim e os desafios que a crise ecológica nos coloca. Do contrário, vamos continuar interpretando a realidade, propondo soluções estruturais, com as calças curtas de nossa infância.

 

Roberto Malvezzi (Gogó), ex-coordenador da CPT, é agente pastoral.

 

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Comentários   

0 #3 Marx e o EcossocialismoRonaldo Oliveira 03-10-2009 12:20
Camarada Gogó e demais,

Para uma boa compreensão da história da construção socialista e a ecologia recomendo ler: "A Ecologia de Marx", de John Foster.
Lá, Foster faz uma retorno a Marx para demostrar que não é o caso de nova construção, mas de percebemos que as esquerdas (quase todas) cairam no erro da hiper valorização do "avanço das forças produtivas" em detrimento do outro lado da moeda, apontado por Marx, a preocupação com a "quebra do metabolismo entre o ser humano e a natureza".
Repetindo "O Capital", será necessário, na sociedade de produtores associados, "governar o metabolismo humano com a natureza de modo racional".
No mais chamamos a tod@s a repensar nossa civilização e construirmos as bases da nova sociedade sustentável.
Saudações Ecossocialistas, logo, Libertárias.
Axé
BAguinha
PSOL/BA
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0 #2 O Socialismo e a EcologiaWilliam Jorge Gerab 25-09-2009 13:04
O preâmbulo do Livro, cuja autoria divido com Waldemar Rossi, "Para Entender os Sindicatos no Brasil: Uma Visão Classista", me parece uma contribuição pertinente a essa discussão.

Preâmbulo dos Autores: Sindicalismo,
Luta de Classes e Meio Ambiente

As idéias de igualdade de mercado, na qual todos podem produzir, comprar e vender; da liberdade de mercado conduzir ao equilíbrio entre os preços da mercadoria, sendo que qualquer interferência externa atrapalharia; da livre e leal concorrência funcionar como uma seleção natural, propiciando a melhoria da qualidade dos produtos e estabelecendo os limites dos níveis de produção, dispensando um planejamento global da economia, além de serem bastante questionáveis, são apenas instrumentos ideológicos para mobilizar os diversos recursos disponíveis e previsíveis, em função da realização do objetivo maior do capitalismo: a realização de lucros crescentes do grande empresariado. Isso faz com que a moral e a ética vigentes sejam construídas de forma a viabilizar esses lucros. O que dá lucro é bom e deve ser fortalecido, o contrário deve ser dispensado.
A força de trabalho é um tipo de mercadoria especial nesse processo de geração do lucro. Ela é composta pelas mulheres e pelos homens que, desprovidos de qualquer posse, contam apenas com a força dos seus corpos e suas capacidades intelectuais para conseguirem sobreviver. O seu caráter especial é devido ao fato de que, às determinações de mercado, somam-se as necessidades e interesses imediatos e históricos desses despossuídos para definir o seu preço, que é chamado de salário. Esses seres formam uma classe, cujos objetivos são antagônicos aos dos capitalistas: a classe dos trabalhadores assalariados.
Por isso, surgiram os sindicatos e os partidos políticos que lutam pelo socialismo. Assim, esse fator de qualquer estrutura produtiva, o da força de trabalho, teve que ser reconhecido pelos vários setores da classe dominante, desde o começo do capitalismo, como o principal limite para que se apoderasse de tudo o que é socialmente produzido. O ritmo da acumulação capitalista não pode ser determinado apenas pela vontade dos capitalistas.
Mas, a força de trabalho, o ser humano, é apenas um dos três componentes das forças produtivas; os outros dois são a natureza e a tecnologia. Os recursos tecnológicos, de acordo com os interesses de quem os utiliza, capacitam a força de trabalho para modificar as condições naturais de forma predatória ou de forma sustentável – no segundo caso garantindo a subsistência dos recursos naturais.
Se a observação nos permite afirmar, como o fez Karl Marx, que a história da humanidade, até os dias de hoje, é a história da luta de classes, agora temos que acrescentar que têm sido, também, a história da degradação ambiental.
A maioria da humanidade, assim como todos os demais elementos existentes no planeta, tem sido ameaçados de extinção pela busca incessante de privilégios dos setores sociais dominantes das várias fases evolutivas das sociedades. Acontece que, nos tempos atuais, os recursos da natureza, que eram tidos como inesgotáveis, se mostram frágeis e finitos.
Hoje, lutar pelo fim de todo tipo opressão sobre seres humanos inclui defender as formas de desenvolvimento que garantam a renovação adequada das forças produtivas como um todo. Não poderá haver uma sociedade mais justa se a subsistência adequada dos meios necessários para garantí-la não estiver garantida também. Isto é, para que a humanidade possa viver da forma digna, que é desejável, a maioria dos seus integrantes terá que agregar aos seus objetivos os cuidados com o meio ambiente; a sua ideologia e o seu projeto de um novo mundo terá que ser ecossocialista.
***
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0 #1 Antonio Julio 25-09-2009 03:04
Gogó, como sempre seus artigos são muito importantes e instigantes. assim, fico instigado a levantar questões:
1)Você diz que "a dificuldade da esquerda, em geral". É generalizante, para toda a esquerda? ou para qual esquerda a crítica é dirigida?
2) do ser humano que conheço são: 1) Copérnico nos tirou do centro do universo ao mostrar que a terra girava em torno do sol; Freud ao mostrar que temos consciência mas também temos a inconsciência; Darwin ao mostrar que tivemos um ancestral em comum com os símios (e não que somos descendentes) e Marx por mostrar que somos alienados na produção e reprodução da vida.
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