Correio da Cidadania

Sociedade precisa se mobilizar para aprovar lei que suspende demissões

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Ainda no final de 2008, a deputada federal Luciana Genro (PSOL-RS) apresentou o projeto de lei 4551/2008, que visa a proibição por seis meses das demissões sem justa causa no país, com a finalidade de estancar ao menos temporariamente a sangria já desatada pela recessão econômica.

Ainda sob apreciação das comissões da Câmara, o projeto, segundo a própria deputada nesta entrevista ao Correio da Cidadania, precisa contar com a pressão da sociedade e dos trabalhadores, pois o governo já deixou claro que não está comprometido em realmente combater os males da crise e do desemprego, apenas acatando as decisões de cortes do empresariado.

 

Luciana Genro também ressalta um importante precedente para a aprovação do PL, que foi a interferência da própria justiça nas demissões da Embraer, deferindo liminar que suspendia os cortes na empresa. Com isso, ficaria reafirmado que o governo não tem sequer o direito de se manter omisso e imóvel diante de tal quadro de agravamento do desemprego e suas inevitáveis conseqüências na economia brasileira.

 

A entrevista completa pode ser conferida a seguir.

 

Correio da Cidadania: Tendo em vista as demissões que já ocorreram e estão ocorrendo, e as atitudes tomadas até aqui pelo governo, que expectativa tem de ver o Projeto de Lei aceito?

 

Luciana Genro: Primeiramente, esse PL tem como objetivo defender os trabalhadores diante da crise, pois até agora não vimos nenhuma medida concreta tomada pelo governo em defesa dessa parcela. Para as empresas e bancos, as medidas foram fartas, mas, para os trabalhadores, de forma direta, não houve nenhuma.

 

Sendo assim, apresentamos o projeto que suspende por seis meses as demissões, proibindo as empresas de despedirem, pois não admitimos que, para manter suas margens de lucro e sob a desculpa da crise, elas simplesmente demitam os trabalhadores.

 

Essas empresas passaram os últimos anos auferindo lucros estrondosos e poderiam, certamente, arcar com o custo da manutenção do emprego a partir de uma pequena queda em sua margem de lucro. Isso faria com que as conseqüências da crise no Brasil fossem muito menos graves.

 

Do jeito que está, o desemprego aumentará, logo, a crise também; as pessoas sem emprego consomem menos, as empresas vendem e lucram menos e, assim, demitem ainda mais. Nos últimos meses já tivemos quase 800 mil demissões no Brasil. Não é possível uma coisa dessas continuar, precisamos fazer algo para parar.

 

Apresentamos a proposta, ela está à espera de um parecer das comissões, e, ao mesmo tempo, estamos fazendo articulações com deputados, senadores e outros partidos que possam vir a apoiar nossa proposta. Conseguimos o apoio dos senadores Pedro Simon (PMDB-RS) e Paulo Paim (PT-RS) e estamos trabalhando também na Câmara, especialmente na Comissão do Trabalho, que é a responsável pelo primeiro parecer do projeto, para que se tenha uma tramitação rápida.

 

Sabemos que, do ponto de vista dos trabalhadores, as coisas não são fáceis aqui na Câmara. A maioria dos parlamentares não faz do seu mandato um compromisso direto com os interesses dos trabalhadores. Muitos são ligados a empresas, bancos e a um governo que está alinhado aos interesses empresariais. Será necessária uma pressão de fora pra dentro também, portanto.

 

Ficando entre os parlamentares, a coisa se torna mais difícil, mas, com o apoio e manifestações da sociedade em relação ao problema do desemprego, nossas chances crescem bastante. Temos uma jornada de lutas, com os movimentos sociais reunidos no Fórum Social Mundial, e haverá uma série de manifestações na próxima semana para tentar criar essa mobilização na sociedade. O próprio PSOL também está se movimentando para promover atos relacionados à crise.

 

Criando esse ambiente na sociedade, exigindo do parlamento uma resposta concreta às demissões e ao desemprego, temos chances reais de aprovar o projeto rapidamente.

 

CC: Você acredita que o projeto em si, se aprovado, estancaria o processo de demissões e recessão já em andamento?

 

LG: Com o projeto aprovado, ficariam proibidas as demissões sem justa causa. Isso faria com que as empresas congelassem suas intenções de promover demissões, no período que para nós é o mais crítico no que se refere aos cortes – o primeiro semestre. E assim, o governo teria um instrumento legal contra as demissões.

 

Além do mais, vimos também que a Justiça interferiu diretamente na questão da Embraer, legitimando a avaliação e convicção que temos, a de que o Estado não pode se omitir diante dessa onda de demissões – até por conta da resolução 158 da OIT, que inspirou nosso projeto e que vigorou no Brasil por curto tempo, tendo o governo FHC a tirado de nosso arcabouço legal.

 

Essa resolução da OIT, inclusive, é mais radical que o nosso projeto, pois ela proíbe terminantemente qualquer tipo de demissão sem justa causa. Já o nosso PL dá apenas um prazo limitado, para que tenha mais chances de aprovação e entre em cena justamente neste momento em que a crise é mais aguda e as demissões correm de forma mais exponencial.

 

CC: E você acredita que tal prazo seria suficiente?

 

LG: Não necessariamente. Ainda não está claro qual será a duração da crise e das dificuldades econômicas, e tampouco desse processo de demissões.

 

Mas seria bom conseguirmos ao menos suspendê-las por seis meses, pois ganharíamos mais fôlego para impulsionar a luta dos movimentos sociais e sindicais no sentido de prorrogar esse prazo. A possibilidade de estancar por seis meses as demissões se deve ao fato de que, na nossa avaliação, esse período será o mais brusco nas campanhas de demissões.

 

A crise continuará por muito mais tempo, lamentavelmente, mas os próximos seis meses podem ser o pico. E por isso queremos intervir nesse momento crítico, impedindo que as empresas demitam mais.

 

CC: Você não enxerga o governo minimamente comprometido a combater o desemprego em massa? Ele está apenas jogando para a platéia?

 

LG: Eu não vejo uma ação concreta no sentido de intervir no desemprego. A única ação vista até agora foi a da justiça, no caso da Embraer. O governo, inclusive, teve uma postura mais defensiva no dito caso, aceitando os argumentos da empresa para demitir, o que ao menos num primeiro momento não foi aceito pela justiça.

 

Portanto, não vejo um comprometimento real do governo em impedir os cortes de vagas. Justamente por isso é tão importante que os movimentos sociais e sindicatos cobrem o governo e o Parlamento. Se o governo Lula quiser, não precisa do meu projeto para parar as demissões. Pode baixar uma Medida Provisória ou elaborar um Projeto de Lei que teria uma tramitação muito mais rápida.

 

Sendo assim, não há uma vontade nesse sentido, mas ela pode vir como uma resposta às pressões da sociedade e à insatisfação da população contra as empresas que lucraram tanto nos últimos anos e passam a conta da crise para os trabalhadores.

 

CC: E o que pensa da conduta das centrais sindicais na articulação da defesa do trabalhador? Estão mesmo enfraquecidas após um ciclo de crescimento econômico e o atrelamento ao governo Lula?

 

LG: Vejo que várias centrais - como a CUT, que tem uma história de muita atividade do ponto de vista sindical - hoje estão bastante paralisadas, ainda mais quando se olha o tamanho da crise e dos ataques aos trabalhadores.

 

Há uma relação de amizade muito nefasta para os trabalhadores entre os dirigentes de algumas centrais sindicais e o governo, o que acaba fazendo com que não exista um rodízio nessas direções para que se exijam medidas concretas de proteção aos trabalhadores.

 

Gabriel Brito é jornalista.

 

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Comentários   

0 #1 O que fazer?Augusto de Almeida 05-03-2009 18:01
Querida Luciana,

É louvável a sua intenção. No entanto, temo que ela mais atrapalhe que ajude. Hoje a imensa maioria das ditas esquerdas embarcaram na lógica da burguesia, que diz que o debate entre esquerda e direita é entre a chamada "inciativa privada" e o "estatismo". As auto proclamadas esquerdas acham que com um controle governamental adequado a exploração do homem pelo homem pode ser minorada. Talvez até possa, em tempos de bonanza, mas certamente não pode ser eliminada. A questão é que essa maioria das auto-proclamdas "esquerdas" se esqueceram que o governo é instrumento de controle das classes dominantes. A intervenção governamental só poderá ser efetiva quando tivermos um governo que seja o fruto legítimo da maioria da população. Então eu pergunto a você: temos isso? Se temos, porque é que eu, como uma grande parte da população está na situação que estamos? Se não temos, porque você fica aí com essas iniciativas simpáticas que só servem para sinalizar para as empresas que elas devem demitir o mais que puderem antes que algum parlamentar excêntrico aprove alguma lei que lhes cause mais custos? Porque você não apresenta uma proposta, por exemplo, de colocar todo o sistema bancário e financeiro sob controle popular (não governamental)? Acho que isso seria muito mais útil. O sistema bancário e financeiro é vital para as nossas vidas, tão vital que é que stão de "segurança internacional". Portanto, não deve ficar nas mãos de uns poucos, deve ficar sob dominio público. Por que você não inicia esse tipo de debate?

Beijos
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