Correio da Cidadania

Que Paul Newman continue se divertindo...

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Paul Newman morreu, aos 83 anos. Não era um ator extraordinário, mas tinha carisma e um faro quase infalível para escolher papéis que o destacariam.

 

Parecia ser um sujeito simpático e de bem com a vida. Mais, pois fez campanha por Eugene McCarthy, candidato à presidência que já em 1968 propunha-se a tirar os EUA do Vietnã.

 

Não era qualquer celebridade que ousava associar sua imagem à do santo guerreiro Gene, tão amado pelos estudantes quanto detestado pela maioria silenciosa.

 

Ao desacelerar sua carreira cinematográfica, continuou em evidência como um dos proprietários da equipe Newman-Hass, uma das principais escuderias da Fórmula Indy.

 

Mesmo com câncer terminal, respondia com gracejos às indagações sobre seu estado de saúde. Impossível não simpatizarmos com ele.

 

Os críticos ressaltarão, como sempre, os seus olhos verdes. O que mais me chamava a atenção era a voz grossa, que parecia pertencer a um grandalhão, não a um indivíduo de porte mediano.

 

O boxeador Rocky Graziano foi seu primeiro grande personagem, em Marcados Pela Sarjeta (dirigido por Robert Wise, 1956). Houve quem dissesse tratar-se da cinebiografia do lendário Rocky Marciano (até eu caí nessa...), mas eram dois pugilistas diferentes.

 

Newman estrelou um filme antológico em 1962: Desafio à Corrupção (diretor: Robert Rossen). Foi a melhor atuação de sua carreira, como o craque da sinuca Eddie Felson, que enfrenta o grande campeão Minnesota Fats (Jackie Gleason) e, embora seja mais talentoso, perde por falta de personalidade. Começa, então, a descida aos infernos na qual ele forjará seu caráter, a um preço terrível.

 

Em qualquer outro ano, Newman certamente ganharia o Oscar. Naquele, entretanto, teve de competir com outra culminância: Gregory Peck, em ‘O Sol É Para Todos’ (Robert Mulligan).

 

Também ‘Desafio à Corrupção’ não levou sorte, pois bateu de frente com o superlativo ‘Lawrence da Arábia’ (David Lean).

 

Para compensar, a Academia o premiou por retomar o personagem Eddie Felson numa medíocre seqüência cometida por Martin Scorcese em 1986: ‘A Cor do Dinheiro’.

 

Muito mais merecedoras de estatuetas foram suas performances em obras-primas como ‘Um de nós Morrerá’ (Arthur Penn, 1958), ‘O Indomado’ (Martin Ritt, 1963), ‘Rebeldia Indomável’ (Stuart Rosenberg, 1967), ‘Hombre’ (Martin Ritt, 1967), ‘Oeste Selvagem’ (Robert Altman, 1976), ‘Quinteto’ (Robert Altman, 1979) e ‘O Veredicto’ (Sidney Lumet, 1982).

 

Aliás, mesmo seu desempenho em amenidades simpáticas como ‘Butch Cassidy’ (George Roy Hill, 1969), ‘Golpe de Mestre’ (George Roy Hill, 1973) e ‘Roy Bean, o Homem da Lei’ (John Huston, 1972) foi artisticamente superior ao de ‘A Cor do Dinheiro’, um papel sem verdadeiras exigências, que ele representou correta mas burocraticamente.

 

De resto, é impressionante a lista de grandes diretores com quem trabalhou. Aos citados acima, devem-se acrescentar ainda Richard Brooks (‘Gata em Teto de Zinco Quente’, 1958, e ‘Doce Pássaro da Juventude’, 1962) e Otto Preminger (‘Exodus’, 1960).

 

Na Hollywood de então, não se era cineasta de primeira linha sem saber dirigir atores. Esses medalhões souberam extrair de Paul Newman atuações quase sempre marcantes, que não sairão tão cedo da lembrança de quem, como eu, curtia intensamente o cinema nas décadas de 1950, 60 e 70, as do seu apogeu.

 

Que descanse em paz. Ou, melhor ainda, que continue se divertindo lá em cima...

 

Celso Lungaretti é jornalista e escritor. Mantém os blogs O Rebate, em que disponibiliza textos destinados a público mais amplo; e Náufrago da Utopia, no qual comenta os últimos acontecimentos.

 

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