Correio da Cidadania

Migrações

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Nestes dias se realiza na Espanha, na cidade de Rivas, proximidades de Madri, o Terceiro Fórum Social Mundial das Migrações. A Pastoral dos Migrantes do Brasil foi convidada a participar.

 

O fenômeno migratório continua sendo o termômetro mais sensível dos impasses que se apresentam hoje para a convivência justa e pacífica entre povos, nações e civilizações.

 

Os Fóruns anteriores já constataram, com suficiente clareza, que os migrantes são "profetas de mudanças", em vista de avanços na consciência dos direitos humanos universais e na consignação destes direitos na legislação internacional, que precisa ir sendo traduzida no interior de cada país, de modo a se tornar prática e objetiva.

 

Este Fórum se defronta, inevitavelmente, com um fato que veio comprovar de novo a incidência das migrações no contexto da situação mundial. Trata-se da "Diretiva de Retorno", a rígida decisão da Comunidade Européia de obstaculizar a entrada de migrantes, autorizando simplesmente a deportação de todos os indocumentados.

 

Sem diminuir a repulsa que merece esta decisão da Comunidade Européia, somos desafiados a superar o clima de simples rejeição desta providência legal, para buscar uma compreensão mais profunda do impasse que está em curso hoje no contexto de nossa civilização.

 

Na verdade, a "Diretiva de Retorno" não se limita a ser uma medida cautelar contra os migrantes, tomada circunstancialmente pelos países da Europa. Ela acaba revelando a crise interna, profunda, de esgotamento de uma civilização que está chegando a um impasse. Para superar este impasse é necessária uma profunda mudança de paradigmas.

 

Para assumir a causa dos migrantes, precisamos assumir a causa da humanidade. Diante de uma lei como esta, nos damos conta de que as vítimas não são apenas os migrantes. Os que querem rejeitar os migrantes, achando que assim resolvem seu problema, também acabam sendo vítimas da visão estreita em que se enclausuraram, pensando ser possível criar ao redor de si mesmos ilhas de prosperidade enquanto o resto do mundo pode continuar na penúria e na miséria. Aí está o grande engano.

 

Este planeta em que vivemos, com a natureza que nos acolhe, nos aponta o caminho da equação dos impasses da humanidade de maneira a encontrarmos soluções globais e inclusivas, e não falsas soluções parciais e excludentes.

 

O momento atual da civilização está carente de utopias, que inspirem soluções abertas e criativas, que façam avançar a consciência ética da humanidade e despertem novas possibilidades de relacionamento com a natureza e de convívio solidário entre os povos.

 

O atual impasse migratório indica a urgente necessidade de recuperar a utopia da solidariedade entre os povos, da fraternidade universal, da justiça nos relacionamentos econômicos, dos direitos humanos para toda pessoa, da cidadania universal a que todos têm direito, independentemente de sua origem nacional.

 

A crise migratória, mesmo que à primeira vista não pareça, tem estreita ligação com a crise ecológica. Esta se traduz hoje na preocupação com o aquecimento global e as severas conseqüências que dele podem advir. Ela mostra como os fenômenos repercutem no mundo todo. Uma ação que incide sobre a natureza, por mais isolada que pareça, acaba tendo repercussão mundial.

 

O planeta em que vivemos nos ensina que dentro dele tudo precisa tomar dimensão planetária. Nada fica isolado, tudo precisa circular.

 

Não se pode pensar um desenvolvimento que fique restrito a um só país, ou a um só continente. Não existe progresso que possa ser reservado a minorias privilegiadas.

 

Riquezas mal distribuídas provocam desigualdades insustentáveis. Quando isto acontece, em vez de bênção, as riquezas se tornam maldição, pois provocam simultaneamente a insegurança dos que têm e a desgraça dos que não têm.

 

A crise migratória revela a urgente necessidade de se rever o modelo atual de desenvolvimento econômico, que levou o ocidente à loucura do desperdício e que está levando o oriente à mesma insanidade econômica.

 

É urgente recuperar as utopias que nos fazem sonhar um mundo solidário, justo, sustentável, fraterno, sóbrio, respeitador da natureza e dos direitos fundamentais de toda pessoa. Então, o convívio e a integração entre os povos poderiam se dar de maneira positiva e enriquecedora para toda a família humana.

 

D. Demétrio Valentini é bispo da Diocese de Jales.

Website: http://www.diocesedejales.org.br/

 

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