Correio da Cidadania

Eu confesso

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Confesso e não nego que sou carioca. Da gema. Do bairro do Estácio. E também do subúrbio carioca. Carioca do Rio ex-capital. Da ex-Guanabara. Carioca apaulistado agora. Carioca sem sotaque agora. Carioca descariocado agora.

 

Confesso que sou professor. Professor que gosta de ensinar mais do que explicar. Sugerir mais do que proibir. Elogiar a leitura mais do que a obrigatória tortura. Professor no falar e no agir, no sorrir e no pensar, no calar e no sentir.

 

Confesso que sou leitor compulsivo, fanático, inveterado. Confesso que gasto dinheiro demais com os livros. Que sinto prazer em entrar num sebo, numa livraria, numa biblioteca. Que os livros são o meu tormento e o meu céu.

 

Confesso e não nego que sou escritor. Escritor escravo do escrever. Escritor que passa o dia escrevendo mentalmente o que há de escrever no papel ou na tela. Escritor que elogia a leitura, o leitor criativo, a arte da palavra.

 

Confesso que sou católico. Católico por um triz. Que dorme ao ouvir sermões cansativos. Católico apostólico romântico. Católico sem eira nem beira, sem carteirinha, sem ligação oficial com movimentos e outros elementos.

 

Confesso que gosto de falar. Na palestra, no debate, na mesa-redonda, no palco, na padaria, no barbeiro. E gosto de calar-me, recluir-me, fugir, enterrar-me vivo no meio dos livros.

 

Confesso que não gosto de me confessar, de revelar quem sou, o que faço, o que penso, em que acredito. Confesso que gosto de me expor, contar o segredo, confidenciar, abrir o coração.

 

Confesso que não gosto de futebol na terra do futebol. Que não gosto de carnaval na terra do carnaval. Que não gosto de praia na terra das muitas praias. Confesso e peço perdão.

 

Confesso que gosto do Brasil, com todas as suas... As nossas contradições e limitações, sua carga tributária e suas festas, seus políticos e seus apresentadores de TV, seu calor e seu frio, sua seca e sua enchente, suas belezas e misérias.

 

Confesso e não nego que muito pouco do Brasil conheço, mas guardo com carinho um caminhar nas calçadas de Manaus, uma partida de xadrez nas calçadas de Florianópolis, rápidos passeios de carro nas ruas de Porto Alegre, Campo Grande, Natal, Belo Horizonte, Recife, Curitiba, Campinas, Ribeirão Preto, Bauru, São Luís, Salvador, Palmas...

 

Confesso. Não nego. Confesso dizer a verdade. E um pouco mais do que isso.

 

Gabriel Perissé é doutor em Educação pela USP e escritor – Web Site: http://www.perisse.com.br/

 

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Comentários   

0 #5 Augusto 01-07-2010 22:34
Eu confesso que gostaria de ver o senhor mais apostólico e romano que romântico.. confesso que li e confesso que em muito sou assim..
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0 #4 Eu confessoRONALDO FERREIRA GONTIJO 04-06-2009 21:16
Dr. Gabriel, parabéns pelo seu artigo "Eu Confesso". O Sr. revela ser um Mestre, no sentido místico, porque academicamente falando já é um doutor. Mestre sim, porque nessas palavras o Sr. revela, consciente ou inconscientemente, muitos segredos esotérios. É assim, o Senhor é um "desperto", ja acordou. E só uma pessoa acordada pode ver outra acordada. Essa flexibilidade, essa disponibilidade revelada nesse pequeno trecho é quem denuncia sua grandeza. Parabéns outra vez e continui assim. Seu texto não é poético, não é científico e muito menos filosófico, mas totalmente místico, mesmo que abandonada dota e qualquer perspectiva religiosa; isso mesmo, já que religião e misticismo não se comunicam, são coisas diferentes.

Ronaldo Ferreira Gontijo, Advogado, 54 anos, Formosa-GO.
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0 #3 Eu confessoHeloisa Helena Monteiro 29-05-2008 14:35
Gabriel, confesso que não conhecia seus textos até que um amigo, muito fã seu, enviou-me essa página. Fiquei fã. Que bom, poder confessar o meu amor ao Brasil e ao fato de ser professora sem parecer ufanista ou derrotada.Valeu!!!
Heloisa Monteiro
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0 #2 Eu confessoLucinda Faria dos Anjos 29-05-2008 12:14
Olá Gabriel,

Eu confesso que gostaria de ter tido tempo de postar comentários em todos os seus artigos,(que são fascinantes!) mas confesso que não consegui administrar isto ainda.
Quantas coisas não gostaríamos de confessar mas que deixamos de fazê-lo pelo tempo escasso, pelo local inadequado, pela insegurança, pela timidez, pela educação recebida, pelo medo de ser mal interpretado...e pela pressão de uma sociedade!
Deixei um comentário, com atraso é verdade, mas no qual me solidarizo com suas perdas. Veja lá em "Leitura de Perdas"
Um abraço
Lucinda
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0 #1 Eu confessoHélio Q. Jost 29-05-2008 12:14
Grande Perissé,...Suas palavras são uma declaração de amor ao Brasil. Que grande nação seríamos se todos pensassem assim! Quando vires à Curitiba, me ligue, pago o CHOPP. At. Hélio. 3206-5662.
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