Correio da Cidadania

Maioria dos norte-americanos não confia nos partidos

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A maioria da população dos Estados Unidos – 60% – não se sente representada por qualquer dos partidos. É o que mostra a pesquisa “Valores Americanos em 2016”, realizada pelo “Public Religion Research Institute”.

 

E a instituição informa ainda que a insatisfação com os grandes partidos – Democrata e Republicano – vem crescendo sempre, a partir de 1990.

 

Numa democracia, isso é muito grave. Se o povo não confia nos partidos, como irá confiar nos seus candidatos, a governar em nome da população?

 

Mas a descrença geral vai mais longe: mais da metade dos estadunidenses desconfia da lisura do processo eleitoral. Apenas 43% acham que seus votos serão computados corretamente, sendo que uma em cada cinco norte-americanos demonstram total falta de confiança.

 

Completando esse quadro, foi revelado pela pesquisa que, atualmente, mais norte-americanos veem de modo negativo a direção do país do que em 2012, na mesma época da campanha eleitoral. O placar é de 74% a 57%, a favor do pessimismo.

 

Uma das razões que justifica a descrença é o fato de figuras completamente fora dos establishments partidários – o populista de direita Donald Trump e o socialista democrático Bernie Sanders – terem conseguido resultados tão expressivos na corrida eleitoral.

 

Como se sabe, os dois candidatos que chegaram à final são malvistos por um número variante entre 50% e mais de 60% dos seus eleitores, conforme diversas pesquisas de opinião publicadas neste ano.

 

No-fly zone: solução ou problema?

 

Durante o último debate com Trump, Hillary Clinton enfatizou sua proposta de criação de uma no-fly zone na Síria.

 

Seria um território sírio na fronteira com a Turquia onde, sob proteção da força aérea norte-americana, aviões russos e sírios não poderiam penetrar.

 

E os refugiados sírios poderiam se instalar ali, sem riscos de serem vítimas de bombardeios.

 

O que, ademais, faria cessar o êxodo dramático de multidões em direção a uma Europa cada vez mais sem condições de recebê-las.

 

A no-fly zone, à primeira vista, parece uma solução interessante. Na verdade, seria uma tentativa de resolver um problema sério causando outro ainda pior.

 

Sendo um tanto cru, pode-se dizer que a ideia da senhora Clinton é tão leviana quanto as tiradas destemperadas de Donald Trump.

 

É a conclusão a que se chega diante do artigo publicado no The Guardian, em 25 de outubro, no qual o grande jornal inglês transcreve opiniões de quem é do ramo: chefes militares norte-americanos.

 

Em 2013, o general Martin Dempsey, então chefe do Estado-Maior conjunto das forças dos EUA no Oriente Médio, disse que, mesmo numa área limitada, uma no-fly zone custaria 1 bilhão de dólares por mês e, para ser mantida, exigiria substanciais recursos aéreos e tropas de terra.

 

Seu sucessor, o general John Dunford, declarou há poucos meses no Senado que a solução de Clinton “nos obrigaria a ir à guerra contra a Rússia e a China”.

 

Grande parte das autoridades em segurança compartilha da visão desses generais, no sentido de que os riscos de uma confrontação militar com a Rússia seriam perigosamente altos.

 

Oficiais que patrulharam no-fly zones nas regiões bem mais seguras da Bósnia, durante os conflitos racistas, e do Iraque, na era de Saddam Hussein, revelaram temor de que a provável presidente Hillary Clinton colocasse os EUA no que consideram uma fria. Para eles, uma no-fly zone na Síria arriscaria as vidas de pilotos e ensejaria um confronto com a Rússia, que anda militarmente mais agressiva do que anos atrás.

 

Mas o que se considera o problema mais sério é a presença numa no-fly zone na Síria de uma outra força aérea inamistosa, de grande poder de fogo e com um objetivo totalmente oposto ao dos EUA.

 

Atualmente, aviões russos e estadunidenses operam em território sírio, mas mantêm um canal de comunicação entre si, justamente para evitar eventuais conflitos. Muito difíceis de acontecer, pois eles voam em diferentes regiões do país, com objetivos também diferentes, porém, não opostos.

 

Os EUA agem no leste, para destruir o Estado Islâmico, enquanto a Rússia ataca a oposição anti-Assad no oeste, em defesa do regime vigente.

 

Se Hillary impuser sua ideia, as duas forças aéreas fatalmente convergirão para a no-fly zone, com objetivos claramente contrários: defender aviões de Assad e atacar aviões de Assad.

 

Não dá para saber se aviões dos EUA alvejariam aviões russos que violassem a no-fly zone e, nesse caso, como a situação poderia ser apaziguada antes que degenerasse numa conflagração generalizada.

 

O general reformado John Kuehn, hoje professor de história militar no colégio do comando militar dos EUA e do Estado-Maior, acha bastante possível ocorrer um conflito acidentalmente. E afirma: “não vejo nada de positivo que possa vir da sua implementação no momento atual na Síria. Por outro lado, o potencial de tornar pior uma situação já ruim é muito, muito grande”.

 

Certamente, ele não conhece o grande argumento da “sábia estrategista” Hillary Clinton. No debate de Las Vegas, que ela travou contra Donald Trump, a candidata democrata pontificou: “falando francamente, vamos ganhar alguma influência (com a no-fly zone) sobre o governo sírio e sobre os russos, para talvez conseguir o tipo de negociações necessário para dar fim ao conflito e seguirmos para a frente em nosso caminho político”.

 

Raciocínio contestado por Joshua Rovner, da Universidade Metodista do Sul: “eu não entendo como uma no-fly zone poderá influenciar Assad a ponto de ele e os russos aceitarem nossos termos, quando os objetivos de um dos dois é a autopreservação e do outro a preservação de um aliado”.

 

Ele concluiu: “havia no-fly zones no Iraque durante quase uma década e elas não resolveram nada”.

 

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Luiz Eça é jornalista.

Website: Olhar o Mundo.

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