Correio da Cidadania

Abbas: independência em 2017

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No ano passado, Mahmoud Abbas, prometeu uma bomba. Criou a maior expectativa. E, de fato, o presidente da Autoridade Palestina tomou uma atitude corajosa, ao anunciar que saía do Acordo de Oslo, de 1993.

 

Esse acordo, assinado por israelenses, palestinos e a maior parte dos países civilizados, estabelecia uma série de etapas, findas as quais a Palestina estaria independente.

 

Justificando sua decisão, Abbas explicou o que todo mundo já sabia: Israel recusava-se a cumprir os termos do acordo, expandindo os assentamentos ilegais em terras palestinas, sabotando todas as negociações de paz e violando uma data de direitos humanos e resoluções da ONU. Especialmente a que mandava terminar a ocupação da Palestina, voltando para as fronteiras de 1967.

 

Rompendo com Oslo, automaticamente, os palestinos teriam de entregar a Israel a administração da parte da Cisjordânia até então exercida pela Autoridade Palestina.

 

Sem a colaboração da polícia palestina, impedindo a ação de terroristas e mesmo de opositores à submissão a Israel, o exército israelense teria de assumir essas funções.

 

Nada bom para Telavive, especialmente pelos novos e inevitáveis conflitos, além de grandes despesas não previstas no orçamento.

 

Mas a bomba de Abbas não estourou. Logo ele se esqueceu de suas promessas.

 

Meses depois, o dirigente palestino proclamou (com fanfarras) que as negociações com Israel já eram, pois esse país destruíra a solução dos dois Estados ao negar-se a interromper a escalada dos assentamentos, entre outras medidas ilegais.

 

Chegara a hora de resolver o problema, em vez de apenas dissertar sobre ele. Esperava-se que Abbas viesse com um plano radical orientado para a autodeterminação. Várias propostas foram colocadas por líderes palestinos, todas desconsideradas pelo presidente da Autoridade Palestina. Por fim, acabou dando seu aval à proposta francesa de passar à comunidade internacional a missão de achar uma saída que funcionasse.

 

De fato, a primeira etapa do plano francês foi cumprida com a realização de uma conferência em Paris de ministros do Exterior dos grandes países e dos membros da Liga Árabe, sob os olhos atentos da ONU.

 

Eles fizeram um pronunciamento, como sempre óbvio, abrindo caminho para a segunda etapa: uma reunião dos presidentes desses países, da qual deveria vir a palavra final sobre as medidas e os prazos para se chegar à solução desejada. Posteriormente sacramentada pela ONU.

 

Mas, nos meses seguintes, os franceses se defrontaram com a oposição norte-americana e a inércia dos outros Estados.

 

Netanyahu, por sua vez, vociferou: não permitiria a participação da ONU ou de outras nações, só aceitaria negociar diretamente com os palestinos.

 

Para muitos observadores, a proposta francesa estava morta. Mais recentemente, falou-se num encontro face a face entre Abbas e Netanyahu, em Moscou, para, discutirem de homem para homem, talvez forjando os fundamentos da paz.

 

Abbas fez algumas exigências para aceitar. Mas Netanyahu afirmou que só iria a Moscou se os palestinos desistissem de exigências prévias.

 

Abbas desistiu. Em troca, Netanyahu desinteressou-se, através de um barulhento silêncio.

 

Eis que em setembro deste ano, maioria novamente, o presidente da Autoridade Palestina voltou a falar grosso. Na 70ª Assembleia Geral da ONU, declarou que em 2017 a Palestina teria de ser independente. Livre da “abominável” ocupação israelense.

 

Repetiu pela enésima vez que a continuação do programa de assentamentos judaicos na Cisjordânia ocupada tornara inviável a “solução dos dois Estados”.

 

Dirigindo-se aos representantes dos países da ONU, Abbas fez um apelo: “aqueles que acreditam na solução dos dois Estados deveriam reconhecer ambos Estados e não somente um deles”.

 

Raciocínio lógico, mas... E daí?

 

Tanto os EUA quanto a União Europeia, dezenas de países de todo o planeta e, especialmente, a própria ONU concordam com a tese de Abbas.

 

Dezenas e dezenas de comunicados oficiais numa imensa pluralidade de línguas já condenaram os assentamentos como ilegais, sendo que a maioria dos autores reconhecia que esse programa bloqueava a solução dos dois Estados.

 

No entanto, Israel continua desapropriando e demolindo na Cisjordânia para oferecer ao seu povo assentamentos nos imóveis roubados, ignorando as inócuas mensagens de protestos que partem dos mais respeitáveis estadistas do planeta.

 

O que me faz lembrar de um pensamento um tanto desabusado do proeminente jornalista, Robert Fisk. “Por que nos importamos com o que os grandes líderes do Ocidente atualmente falam, quando todos sabemos que é o tipo de material que sai da extremidade traseira de um boi?”

 

Infelizmente, a comunidade internacional tem suas mãos atadas pelo veto de um país que se autointitula “excepcional” e “imprescindível”. Só que é também senhor do mais poderoso exército do mundo e da não menos poderosa economia, qualidades que pesam bem mais do que a justiça. Por tudo isso, é de se crer que, caso Abbas insista em apresentar sua causa ao Conselho de Segurança da ONU, provavelmente não conseguirá nada.

 

Ou os EUA vetam ou fazem como no ano retrasado, quando Obama convenceu governos de dois integrantes do Conselho de Segurança a se absterem.

 

E a Palestina não teve votos suficientes para seu reconhecimento como país independente, fazendo com que os EUA não precisassem vetar, o que sujaria mais sua imagem nos países árabes.

 

Abbas pode escorar-se nas leis, exigir, ameaçar... Mas não passa disso. Objetivamente: o melhor que ele faria por seu povo seria renunciar e deixar seu posto para alguém mais afeito à ação do que às palavras.

 

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Luiz Eça é jornalista.

Website: Olha o mundo.

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