Correio da Cidadania

Temos Rio-2016, mas as campanhas políticas esqueceram

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Terminou a rinha eleitoral e enquanto alguns infantes fazem suas lamúrias de quinta categoria, quem sabe até começar um novo BBB ou novela pra relaxar o “gigante”, vencedores, vencidos e fisiológicos em geral já articulam seus próximos passos e projetos de poder.

 

Não cabe tentar neste espaço uma análise de todo o processo eleitoral e expor o que estava em jogo para cada lado; muito menos me atreverei a elencar evidências de como a polarização vivida à flor da pele por grande parte da população está há séculos-luz da realidade do que virá a ser o próximo governo – qualquer fosse o vencedor das urnas.

 

A única afirmação que lançamos, sem hesitar, é de que todos os grandes assuntos da vida nacional foram olimpicamente dissimulados. A gritaria moralista e acusatória mais uma vez foi o “programa político” dos candidatos e suas claques.

 

Fomos estonteados de números que buscavam afirmar quem roubou e desviou mais que quem ao longo dos anos. Pra variar, a mídia espetaculosa deu sua contribuição para toda a indigência do debate, afinal, ela mesma é um partido e milita ferrenhamente por seus interesses – ideológicos, políticos, econômicos e culturais. O simulacro lhe beneficia.

 

Energia, água, meio ambiente, secas, mudanças climáticas, gestão geopolítica de imensas bacias petrolíferas, indústria, infraestrutura e logística nacionais, auditoria da dívida pública; direitos indígenas, das mulheres, dos LGBTs, dos negros; saúde e educação públicas, habitação, transporte, mobilidade urbana, reformas urbana e agrária, fomento à cultura, legalização das drogas, democratização da mídia, desmilitarização das polícias e sabe-se lá o que mais ficam, novamente, no imaginário dos “ignorantes que não entendem a realpolitik”.

 

Provavelmente, precisaremos “estudar e se informar direito”, como exortaram milhares de fanáticos virtuais, cujo interesse em política desconhecíamos até anteontem, para entender os mestres da maturidade democrática.

 

Portanto, é claro que o tema de interesse deste espaço não pôde ser pautado em momento algum. O próximo mandato presidencial terá o prazer (?) de promover a primeira Olimpíada em solo brasileiro e sul-americano, mas parece que ninguém se importou em rascunhar uma política nacional de esportes para o próximo período.

 

Não vamos perder tempo especulando motivos. Absolutamente ninguém, nem mesmo os candidatos ditos alternativos, leva a sério a pauta esportiva como parte constituinte de uma nação mais saudável.

 

O motivo do descaso é notório: assim como a Copa do Mundo, trata-se apenas de um golpe publicitário para angariar ótimos negócios em parceira com os amigos que asfaltam as vitórias políticas dos nobres mandatários. Uma retribuição a favores passados, sob a imbatível justificativa de sediar os maiores eventos da humanidade e afirmar o Brasil mundialmente.

 

Pois bem: assim como o futebol brasileiro não avançou um milímetro com o advento da Copa, as modalidades ditas olímpicas (ou seja, todos os esportes além do bolapé) tampouco ameaçam um progresso real. E, pior de tudo, não há esboço algum de investir pesadamente no esporte de base, aquele que forma atletas e cidadãos, num país onde menos de 20% das escolas públicas contam com espaços poliesportivos.

 

Se a organização da Copa foi a festa de Ricardo Teixeira e seus comparsas, nos jogos olímpicos a situação pouco difere. O monarca do COB, Carlos Arthur Nuzman, fortaleceu seu poder e nadou de braçada.

 

É certo que a experiência do mundial de futebol deixou todo mundo mais esperto, de modo que tanto o Comitê Olímpico Internacional (COI) como o governo federal tiraram-lhe um pouco de protagonismo na organização e apertaram a marcação. Provavelmente, a correria contra os atrasos será menor, ainda que Olimpíadas signifiquem uma série de obras e construções concentradas numa única cidade.

 

De toda forma, como bem disse o deputado Fraga, endossado por uma série de urbanistas e estudiosos críticos de nossos modelos de cidade, trata-se de um projeto para “vender uma cidade-negócio”, aberta a toda forma de investimento externo, em parceria com os governos. Claro que num sentido completamente segregacionista e excludente, aumentando o custo de vida, mas não necessariamente a qualidade, nas regiões por onde passa.

 

Como ninguém, especialmente os que contavam com chances reais de vitória, tem qualquer objeção a tais projetos “esportivos”, o tema jamais se fez presente nos debates. E sequer sabemos o que será do Estádio Olímpico, o Engenhão, fechado desde 2013 por falhas estruturais na cobertura!

 

Tentando vender seu peixe, o COB acena com a possibilidade de dobrar o número de medalhas conquistadas pelo país. Natural, ao levarmos em conta o desempenho corriqueiro dos países-sede.

 

No entanto, o objetivo esconde que figurar melhor no quadro de medalhas pode não dizer absolutamente nada. Apenas que se investiu com mais afinco nos atletas de alto nível, aqueles abnegados que mal sabemos como se tornaram grandes profissionais de modalidades marginalizadas, mas hoje alvo fácil da prioridade das confederações.

 

Reiterando: isso não quer dizer nada. A prova é dada pela pesquisa da Faculdade de Educação Física da UFMG em parceria com a Faculdade de Saúde da USP, dando conta de que os brasileiros praticam cada vez menos esportes, inclusive o futebol, contentando-se em suar nas proliferantes academias. Óbvio para quem percebe a existência de cada vez menos espaços públicos nas grandes cidades. E deprimente, a depender do ponto de vista.

 

Fora isso, outros candidatos e parlamentares eleitos pouco têm a oferecer. Mesmo aqueles oriundos do esporte poucas vezes se concentraram em pautar políticas públicas voltadas a este fim. Salvo na questão dos gastos da Copa, na qual Romário, agora senador, foi atuante, os ex-atletas raramente se voltam ao tema, ainda que faça parte de suas promessas.

 

Porém, na maioria dos casos seria melhor que nem entrassem na política. Geralmente, têm seu nome usado por alguma grande legenda disposta a angariar mais prestígio, carecem de uma formação política minimamente esclarecida e logo se perdem nos complexos escaninhos das casas legislativas.

 

Alguns são ainda piores, pois entram no parlamento como se fossem a um churrasco. Foi de dar vergonha a entrevista de Jardel em programa da RBS sobre sua candidatura. Mais ainda sua eleição. Não à toa, até Dinho, seu companheiro de glórias gremistas, mostrou-se indignado.

 

Já a chamada “bancada da bola”, com a reeleição de nomes como Vicente Cândido, além da ascensão de Andrés Sanchez, ex-presidente do Corinthians, a deputado estadual, tampouco sinaliza qualquer avanço.

 

Se estamos num mato sem cachorro nos principais e mais urgentes temas do país, não é o esporte que se salva. Dilma ainda não anunciou o ministro desta pasta, mas é de se crer que continue nas mãos do PC do B. A julgar pelo que foi em gestões anteriores, nada de renovador. Tudo pelo esporte de alto rendimento, nada pelo de base; confederações recebendo montantes crescentes sem prestar contas e contrapartidas, além de muitos brindes em rapapés da cacicada.

 

Está claro que sediar uma Olimpíada não significará nada, no longo prazo, para o esporte brasileiro. E novamente nos deixará traumatizados diante de mais uma grande oportunidade consumida pelos balcões e falcões de negócios.

 

 

Gabriel Brito é jornalista do Correio da Cidadania. Escreve semanalmente e apresenta os programas Central Autônoma e Conexão Sudaca na Central - http://central3.com.br/author/gabriel/#sthash.T293CQA4.dpuf, onde este texto foi também publicado.

Comentários   

0 #1 ÓcioJosé Marques 21-11-2014 12:56
no futebol, neste domingo (23/11/14) o Flamengo(RJ) enfrenta Criciúma(SC) no Castelão no Maranhão, racional? É preferível fazer um vídeo game, não gasta dinheiro em estádio. O lazer também precisa ser pensado. Não é preferível reunir as pessoas para pintar na praça? Ócio criativo
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