Correio da Cidadania

Farsa e tragédia

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A farsa são as eleições.

 

A tragédia é o resultado do pleito com financiamento milionário de bancos, capitalistas e empreiteiras, que pagam e controlam o governo.

 

Vença Dilma, Marina ou até o tucano Aécio Neves, a situação não será boa. Teremos tempos duros pela frente. Claro que Marina e Aécio implicam na retomada do neoliberalismo puro.

 

Fuçando jornais do passado é fácil constatar que jornalistas da mídia comercial imaginavam que o saudoso Ulisses Guimarães  seria vitorioso em 1989, nas primeiras eleições diretas presidenciais, depois de 20 anos de ditadura.

 

Mas aí a poderosa FIESP - Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a mesma entidade golpista e que seria presidida nos anos recentes por Paulo Skaf - fez pesquisa e constatou que o perfil do candidato preferencial dos eleitores era Fernando Collor de Mello, com discurso populista de direita. Um homem jovem, “honesto”, com idéias novas e não vinculado à Nova República.

 

 

E pau para cima de José Sarney, presidente eleito indiretamente pelo último colégio eleitoral, mas sem os votos de petistas, que praticamente colocaram para fora os deputados dissidentes Ayrton Soares, Betty Mendes e José Eudes. Na campanha eleitoral de então, Fernando Collor chamava José Sarney de “ladrão”.

 

Mas já havia pesquisa e, ainda assim, o Caçador de Marajás estava somente com 2% das intenções de votos. Depois ele virou o jogo, batendo Leonel Brizola, com 17% da preferência, dois por cento a mais do que Lula.

 

O programa do PT, representando pela Frente Brasil Popular, formada pelo PT e PCdoB - que ainda não havia se transformado em legenda de comunistas de logotipo -, queria a estatização do sistema financeiro, da grande mídia e a reforma agrária, além de outros pontos importantes para mudar aquele Brasil já não tão agrário, mas que continuava atrasado. Era programa democrático, popular e considerado radical pela burguesia, que entrou em pânico com a possibilidade de segundo turno entre Lula e Brizola.

 

Mas o gaúcho da Rede da Legalidade foi derrotado e no segundo turno transferiu todos seus votos para Lula, que havia acusado o ex-governador de ser capaz de “pisar o pescoço da própria mãe para ser presidente da República”.

 

O momento definidor da virada de Fernando Collor foi o último debate político na Rede Globo, depois editado e reprisado pelo Jornal Nacional da pim-pimplim, quando Collor foi para cima de Lula, que estaria cansado das viagens. Mas Lula também amarelou, pois Collor dizia que ele possuía um aparelho de som sofisticado. Nos intervalos do debate, assessores de Fernando Collor exibiam cópia de nota fiscal do som que Lula teria comprado. Comentou-se na época que não era para si, mas para a namorada. Os problemas de caráter e a fraqueza ideológica do petista eram antigos e ele perdeu a eleição.

 

Na época, os brizolistas disseram que, se o interlocutor no debate fosse Leonel Brizola, ele pegaria Collor pelo rabo e o jogaria na parede, pois valentia pessoal não lhe faltava.

 

Depois veio o Plano Collor, início do neoliberalismo, apoiado por vários petistas e pela economista Maria da Conceição Tavares. Antes houve o mandato tampão de Itamar, em seguida os dois mandados de FHC e os escândalos das privatizações do patrimônio público.

 

Mas Collor se enforcou na própria corda e foi afastado da presidência da República. Itamar Franco tomou posse e houve o defenestramento de Luiza Erundina do PT por ter participado do seu governo.

 

Mas a luta dos caras pintadas redundou em amizade forte de Lula com Fernando Collor, José Sarney e outros mais. Andam de braços dados, mui amigos.

 

Adiante aconteceu o desgaste de Paulo de Tarso Venceslau, que, ao perceber o PT indo para a direita, denunciou que Lula, de origem operária, morava num apartamento de classe média, em São Paulo, comprado pelo compadre, chefe da sua campanha.

 

De roldão, Paulo de Tarso caiu em desgraça.

 

Assim, o futuro presidente ou presidenta, seja Dilma ou Marina Silva, terá de enfrentar uma situação de quase barbárie.

 

Embora os números indiquem que ainda há crescimento do emprego, os últimos dados do IBGE mostram que acabou o céu de brigadeiro para o governo social liberal, que a crise capitalista mundial está chegando ao Brasil e há início de recessão econômica.

 

Enquanto isso, o sistema político continua corrupto, favorecendo a burguesia para ampliar ainda mais o seu poderio no Congresso Nacional, estabelecendo nova correlação de forças que modificou o modelo econômico do atual governo federal, o chamado neodesenvolvimentismo ou social liberalismo. Portanto, houve o rompimento da aliança entre o sistema financeiro, banqueiros, gente do agronegócio e importantes representantes da burguesia com a classe trabalhadora organizada, hegemonizada pelo PT chapa branca.

 

Além disso, nos governos petistas de Lula e Dilma, a juventude pobre melhorou de vida, mas passou a exigir avanços. Embora beneficiada por diversos programas do governo federal, essa juventude não apóia o Bolsa Família ou o Mais Médicos, por exemplo.

 

As bandeiras das manifestações de junho de 2013 estão ao relento e não foram empunhadas por qualquer força política de esquerda ou de direita.

 

Mas, de repente, os manifestantes de 2013 podem voltar às ruas, da mesma forma que tudo começou com uma passeata do Movimento Passe Livre, exigindo e conseguindo vinte centavos a menos no preço das tarifas de ônibus urbano.

 

No início, o governo Dilma sofreu desgastes. Claro que a mídia ampliou as más notícias da economia, alimentando clima ainda mais pessimista.  Mas setores da esquerda petista cometem seus pecados, ao divulgar, sem apresentar provas, que o acidente que matou Eduardo Campos foi orquestrado pela CIA. O delírio da teoria conspirativa não ajudou a entender a complexa realidade brasileira e não levou em conta que Marina Silva tem origem no petismo.

 

Enquanto isso, o diplomata Samuel Pinheiro Guimarães diz que os EUA apóiam Marina. E apóiam mesmo.

 

Ainda que vitoriosa, Dilma não conseguirá alterar para melhor o cenário econômico. A composição do novo Congresso Nacional não terá avanços, e pode até mesmo ter retrocessos. Haverá mais repressão contra as manifestações populares e redução de direitos dos trabalhadores, duramente conquistados; ajuste fiscal e aumento da matança pela PM de pobres e negros nas periferias.

 

A classe média alta tradicional sente-se prejudicada e derrotada pelo governo petista e de comunistas de logotipo, a juventude quer mudanças, a mídia comercial conservadora atua como partido político e, pelos erros do próprio governo federal, faz denúncias do arco da velha.

 

Se o atual governo perder as eleições, haverá a retomada do modelo neoliberal da era FHC.

 

O equívoco de não ter incentivado a organização dos excluídos é legado sem volta. O governo Dilma/Lula entende que a força social que pode derrotar a direita, embora também com alianças e apoio da direita, são os setores organizados do limitado e cooptado movimento sindical e popular, em aliança com as massas desorganizadas que mostraram combatividade nas mobilizações de junho de 2013.

 

No entanto, a trolha está feita. Alguns espertalhões se fartam com negócios da China, dão tombos na praça, usam métodos policiais; e outros se lambuzam com as indenizações do bolsa ditadura.

 

Os torturadores e assassinos da época do regime militar até hoje não foram punidos.

 

Vivemos situação de pré-barbárie, as forças organizadas da esquerda revolucionária não têm base social, não acumularam na campanha eleitoral e parecem falar para si próprias - com raras exceções, a exemplo de Edmilson Costa, candidato ao Senado pelo PCB, que soube colocar a seu favor o minúsculo tempo do horário eleitoral, falando pouco e usando imagens das manifestações populares contra a propriedade privada.

 

Ainda assim, as organizações e partidos da esquerda, incluindo a esquerda revolucionária, podem ter perdido o bonde da história.

 

As pessoas mais lúcidas que ainda votam e acreditam no PT, a exemplo do amigo Carlos Galvão, dizem que a barbárie capitalista é só um momento, que ao final o socialismo triunfará. Mas que é preciso deixar as tetas do governo, voltar a fazer trabalho de base, e citam o exemplo de Jorge Zabalza, Tupamaro preso com Pepe Mujica, que se tornou presidente do Uruguai, enquanto o outro voltava para as bases e criticando o antigo companheiro.

 

Para evitar a barbárie capitalista, é preciso ajuda dos assassinados e desaparecidos pela ditadura, como fez Érico Veríssimo, em Incidente em Antares. Ter de volta Mário Alves, Carlos Marighela, Carlos Lamarca, José Arantes, Célio Guedes, Maurício Grabois, Pedro Pomar, Ângelo Arroyo, Helenira Rezende, Alexandre Vanucchi, Luiz Eduardo Merlino, Carlos Danielli, Jorge Leal Gonçalves, Raimundo Eduardo da Silva, Luiz Hirata, Paulo Stuart Wright, José Carlos da Mata Machado, Gildo Lacerda, Umberto Câmara Neto, Honestino Guimarães, Eduardo Collier, Fernando Santa Cruz, Jair Ferreira de Sá e tantos outros, os revolucionários sem rosto.

 

E punição dos torturadores, como Carlos Alberto Brilhante Ustra, o carniceiro da rua Tutóia.

 

Otto Filgueiras é jornalista e está lançando o livro Revolucionários sem rosto, uma história da Ação Popular

Comentários   

0 #1 venceráArão 30-09-2014 13:49
Eu acredito que o Brasil, melhorara quando políticos honestos, se por com interesse nacional e intrínsecos.
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