Correio da Cidadania

‘O objetivo do Grito dos Excluídos é aumentar o nível de consciência da população’

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Chega mais um 7 de setembro e novamente algumas representações do país vão às ruas. Enquanto um exército até hoje anódino aos anseios populares fará outro de seus desfiles “cívicos”, o tradicional Grito dos Excluídos, impulsionado pelas pastorais sociais da Igreja Católica, passará por centenas de cidades. É disso que conversamos com Paulo Pedrini, da Pastoral Operária.

 

“Nossa prioridade é o direito à manifestação, a fim de valorizar cada vez mais a participação das pessoas, a saída às ruas e reivindicação de direitos. É uma denúncia da criminalização do movimento social e sindical. Outro eixo são os megaeventos e megaprojetos”, afirmou, sem deixar de criticar os limites do PT no governo central, que em sua visão não tocou em nada que permita enxergar uma verdadeira redução da desigualdade.

 

Sobre a reforma política, bastante atrelada ao Grito deste ano, suas respostas deixam claro como boa parte do movimento popular ainda está longe de se encantar e mergulhar em tal projeto. E tampouco se anima com as três principais candidaturas presidenciais, pois, para a população, pouca ou nenhuma diferença haveria entre elas, com exceção, talvez, da ascensão do fundamentalismo religioso num eventual governo de Marina.

 

“É difícil fazer qualquer prognóstico do que seria um governo Marina. Mas não tenho esperança de que venha a ser muito diferente. A separação entre Estado e religião tem de ser muito clara. Todos têm direito de professar sua fé, mas de forma alguma podem impor suas crenças religiosas à totalidade da população. De qualquer lugar que vier, o fundamentalismo religioso sempre é um risco”, criticou.

 

A entrevista com Paulo Pedrini, realizada nos estúdios da webrádio Central3, pode ser lida a seguir.

 

Correio da Cidadania: O que tem a dizer sobre o conceito e importância do Grito dos Excluídos e por que o tema principal deste ano é o Plebiscito pela Constituinte em favor da Reforma Política?

 

Paulo Pedrini: Em primeiro lugar, é importante lembrar o histórico do Grito dos Excluídos: ele nasceu da iniciativa das pastorais sociais da CNBB e neste ano ocorre, em nível nacional, pela 20ª vez. Em São Paulo, onde faço parte da comissão organizadora, teremos a 18ª edição. Em relação ao plebiscito, alguns setores resolveram fazê-lo conjuntamente ao Grito, ainda que não seja uma atividade vinculada, para poder alcançar mais pessoas.

 

Correio da Cidadania: De toda forma, que avaliação vocês fazem das reações dos diversos governos e governantes, desde que os protestos ganharam o volume que vimos, e como a pauta do Grito dos Excluídos dialoga com tal realidade?

 

Paulo Pedrini: Acredito que a questão de junho deu uma boa alterada na conjuntura. Mas o Grito propõe cerca de 15 eixos. E em São Paulo priorizamos alguns: o primeiro é o direito à manifestação, a fim de valorizar cada vez mais a participação das pessoas, a saída às ruas e reivindicação de direitos. É uma denúncia da criminalização do movimento social e sindical pelos governos. Não podemos esquecer que há pouco tivemos uma greve dos metroviários e mais de 40 foram demitidos. Ou seja, ao mesmo tempo em que a greve é direito assegurado pela Constituição, trabalhadores que ousam promovê-la são, simplesmente, premiados com demissão. É também nosso papel denunciar tais fatos.

 

Outro eixo são os megaeventos. Muitos dos protestos tiveram a ver com os gastos efetuados no período das obras da Copa. E não podemos esquecer de outros megaeventos e megaprojetos, a exemplo da transposição do São Francisco e da Usina de Belo Monte, que já gastaram muito mais do que o previsto. Além disso, daqui a pouco teremos as Olimpíadas, os gastos já estão em andamento e temos de ficar atentos.

 

E é bom lembrar que sobre a Copa havia o acordo de a maior parte dos investimentos sair da iniciativa privada. Mas a realidade não correspondeu e tivemos mais de 90% de recursos públicos utilizados.

 

Correio da Cidadania: E a pauta em si da reforma política, não entusiasma?

 

Paulo Pedrini: Acho a reforma política importante. Mas não nos envolvemos tanto na questão do plebiscito, até porque alguns setores organizadores do Grito não têm tanta disposição para isso. Não sei até que ponto a reforma política e o plebiscito, de fato, vão adiante. Respeitamos quem faz, mas não participamos diretamente da organização do plebiscito.

 

Correio da Cidadania: Como avaliam esses 12 anos de governo PT e o mandato de Dilma?

 

Paulo Pedrini: Infelizmente, a gente ainda tem muito a denunciar no sentindo da exclusão social. Os chamados avanços vieram muito mais através de políticas assistencialistas do que de políticas de verdadeira transformação social. Portanto, não consideramos que evoluímos para um quadro de diminuição da desigualdade social. Até porque não acreditamos que possa ocorrer com “bolsa isso, bolsa aquilo”.

 

Realmente, não vemos muita diferença em comparação com as políticas empregadas anteriormente. As privatizações continuam, temos a diretriz de megaeventos e megaprojetos... A orientação econômica não é muito diferente entre todos os governos recentes. E claro que tínhamos outra expectativa com o PT, como a mudança do modelo econômico. Mas ainda vemos que a prioridade é pagar juros da dívida, gerar superávit primário etc. Tal lógica não foi invertida e estamos praticamente no mesmo trilho.

 

Correio da Cidadania: Quanto a Marina, que decola nas pesquisas de opinião, como avaliam o projeto político em torno de sua possível presidência?

 

Paulo Pedrini: É difícil fazer qualquer prognóstico do que seria um governo Marina. Mas não tenho esperança de que venha a ser muito diferente. Acho que os três melhores colocados nas pesquisas, em termos políticos gerais, não se diferem muito. Infelizmente, para o povo não há muita diferença.

 

Sobre a Marina em si, nem sabemos qual seria a composição de seu governo, entre outros fatores. Mas, de fato, é surpreendente o que acontece. Tínhamos um quadro mais ou menos desenhado de bipartidarismo. Porque nos últimos anos o Brasil vem se aproximando do modelo eleitoral dos EUA, onde democratas e republicanos se alternam nos governos, com pequenas diferenças, pontuais. Nesse sentido, o PT e o PSDB hoje estão muito próximos. Têm pequenas diferenças em alguns projetos, mas no geral é tudo muito parecido.

 

Correio da Cidadania: Como vocês, uma ala da Igreja historicamente atuante política e socialmente, enxergam a atual ascensão neopentecostal na política brasileira?

 

Paulo Pedrini: É preocupante qualquer avanço de fundamentalismo religioso. A separação entre Estado e religião tem de ser muito clara. Todos têm direito de professar sua fé, mas de forma alguma podem impor suas crenças religiosas à totalidade da população. É preocupante, à medida que vemos tais tipos de políticas serem defendidas e avançarem. De qualquer lugar que vier, o fundamentalismo religioso sempre é um risco.

 

Correio da Cidadania: Por fim, qual a expectativa para o Grito desse ano?


Paulo Pedrini: O grande objetivo do Grito é o processo que desencadeia. Culmina com os atos do dia 7 de setembro, mas o grande papel que pode cumprir é aumentar o nível de consciência da população. Trabalhamos nessa perspectiva e qualquer avanço em tal sentido já recompensa nosso trabalho.

 

Além disso, queremos homenagear de maneira especial três pessoas que têm muito a ver com as lutas e a própria construção do Grito em São Paulo: D. Tomás Balduíno, bispo de Goiás que nos deixou recentemente e tem toda uma história na luta pela reforma agrária e na questão da terra; nosso amigo de longa data Plinio Arruda Sampaio, que também nos deixou há pouco e tem histórico de luta em favor de uma verdadeira transformação social; e, por fim, a irmã Beatriz Maestri, que trabalhava no Cimi (Conselho Indigenista Missionário) de São Paulo, uma missionária franciscana que tinha um grande trabalho na questão indígena. Lembraremos dessas três pessoas, que com certeza estarão conosco no dia 7.

 

Ouça aqui o áudio da entrevista


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Gabriel Brito e Paulo Silva Junior são jornalistas.

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