Correio da Cidadania

Brasil - Indignados e envergonhados

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Quem acompanhou nas últimas semanas a política no Senado a propósito do caso de seu presidente, Renan Calheiros, seguido do Senador Roriz e o fato da impunidade de um jornalista, réu confesso, que matou sua namorada pelas costas e premeditamente e depois de sete anos, apesar de condenado, estar ainda em liberdade desfrutando seu status de poderoso e rico, só pode se encher de iracúndia sagrada e sentir-se envergonhado. Isso não pode ser.

O caso do jornalista revela a venalidade de muitos juizes. Eles são fortes quando trata dos fracos. Diante dos poderosos são covardes. Mas o quadro mais sombrio é assistir pela TV as discussões no Conselho de Ética do Senado que deve julgar a imputada falta de decoro parlamentar de seu presidente. Este presumivelmente sustentava a jornalista com quem tivera um filho, mediante aportes de uma grande empreiteira. Para negar tal acusação, o Senador armou um arsenal de provas que visavam mostrar sua capacidade financeira. Porém quando analisadas pela Polícia Federal e desmascaradas pela imprensa investigativa se mostraram uma inconfessável farsa.


No Conselho de Ética do Senado predominava a disposição quase geral de engavetamento do processo por um instinto corporativo. É sabido que há senadores em situação semelhante àquela de Renan Calheiros, temerosos de que seus desvios viessem a público e então optam pela absolvição. Outros se mostraram lenientes por considerarem que tais coisas pertencem à cultura machista brasileira que condena as mulheres amantes ao anonimato e à invisiblidade social além de expô-las a situações vexatórias diante de suas famílias e na sociedade em geral. Aliás, quem das mulheres senadoras, abordou a condição da esposa do presidente do Senado e da jornalista, condenada a ser sua amante escondida e mãe invisível do bebê? Por que a consciência dos direitos da mulher ainda não foi incorporada em sua mente política, se de resto fazem um tão belo papel?


Poucos senadores se pautaram por postura ética de investigar os fatos, acolher o peso do contraditório e garantir a lisura do processo. Mas em quase todos a ética foi sacrificada ao jogo político. Até que a máscara caiu de vez: transformou-se a questão ética em questão política. Isto significa: os fatos já não contam. O que conta são as versões. As mentiras já não são mais mentiras, são ilações, os crimes constatados já não são mais crimes, mas acusações movidas por interesses excusos. Quando se instaura a questão política significa que tudo vale, pois, no tipo de nossa democrazia debole os direitos e a justiça não são instâncias referenciais que devem ser sempre garantidas, mas são mera decoração. Se medirmos nossa democracia por estes valores ela é simplesmente uma farsa e uma mentira oficialmente instalada.


Se na questão política há o ânimo de condenar, o acusado, mesmo inocente, será condenado. Se há ânimo de absolver, o acusado, mesmo corrupto, será absolvido. Será diferente nos processos contra Renan Calheiros e Roriz?


Sugestiva é a hipótese apresentada pelo cientista político da UERJ, Luiz Gonzaga de Souza Lima, segundo a qual para se entender o Brasil há que se partir não da categoria Estado e nação, mas de empresa. O Brasil, na verdade, é a maior empresa do capitalismo mundial e desde o início, a mais bem sucedida, empresa para beneficiar os ricos daqui e os de lá de fora. A continuar a encenação feita no Senado, o Brasil nunca vai dar acerto como nação. Dai nossa indignação e sentimento de vergonha.



Leonardo Boff é teólogo e membro da Comissão da Carta da Terra

 

Fonte: http://www.adital.com.br

 

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