Trem-bala não é prioridade

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Léo de Almeida Neves
12/11/2009

 

Os partidos de oposição e seus prováveis candidatos presidenciais, José Serra e Aécio Neves, alheiam-se da discussão das grandes questões nacionais, como a sobrevalorização do real, que prejudica as exportações; o déficit da previdência social com risco de agravamento por causa da elevação da média de longevidade da população; as soluções nos temas do pré-sal.

 

Contrastando com essa passividade, o governo Lula parece querer abarcar o mundo com projetos mirabolantes como o do trem-bala, ligando Rio – São Paulo - Campinas, a ser concluído em 2015, um ano antes da Olimpíada – Rio 2016.

 

A voracidade de obras prometidas pelo governo federal atinge custo de R$ 139,6 bilhões, com R$ 34,6 bilhões para o trem-bala; hidrelétrica de Belo Monte no Pará – R$ 30 bilhões; Estratégia Nacional de Defesa, aquisição de caças e submarinos convencional e nuclear - R$ 20 bilhões; ferrovia Norte-Sul – R$ 5 bilhões; compra de plataformas, sondas e navios e novas refinarias da Petrobrás - R$ 50 bilhões.

 

A Lei de Responsabilidade Fiscal, tendo em vista que 2010 é o ano das eleições presidenciais e do término de mandato, exige que as concorrências e licitações devam ser realizadas até abril/2010, daí a correria para levar avante esses e outros projetos de monta, como a usina nuclear de Angra 3 e os programas do PAC.

 

A oposição deveria estar analisando detidamente todos esses problemas e definindo apoio, por exemplo, à realização da terceira maior hidrelétrica do universo, Belo Monte, com potência instalada de 11,2 mil MW. Ao mesmo tempo, poderia manifestar sua contrariedade com o trem-bala, que poderá inflar despesas estratosféricas ao longo da obra.

 

Na proposta em estudo pela ANTT (Agência Nacional de Transporte Terrestre), o Tesouro Nacional vai arcar com financiamento de R$ 20 bilhões, com o BNDES simples repassador desses recursos, porque, se fizesse o empréstimo, estaria extrapolando os limites fixados pelo Acordo de Basiléia, que regula todo o sistema financeiro.

 

Já se comenta na imprensa que o trem-bala não sairá por menos de R$ 50 bilhões. O governo federal pagará a fundo perdido as desapropriações previstas em R$ 2,6 bilhões, com possível ultrapassagem desse valor, e certamente o Poder Judiciário ficará abarrotado de ações discutindo valores e agressão ao meio-ambiente. O Comitê Brasileiro de Túneis (CBT) cita erros nos valores dos túneis, mostrando contradição de preços a mais na área rural do que na urbana, e naquelas com diâmetros menores. Na verdade, o governo não apresentou um projeto básico do empreendimento, e está agindo amadoristicamente em assunto de alta complexidade.

 

De outro lado, as experiências internacionais apontam peculiaridades que não podem ser desprezadas. O Eurotúnel, sob o Canal da Mancha, entre França e Inglaterra, foi orçado inicialmente em US$ 9 bilhões e saiu por US$ 19 bilhões. E, apesar do enorme fluxo de passageiros, tem apresentado déficit operacional.

 

O trem-bala de Taiwan, de 345 km de extensão, iniciado pela iniciativa privada em 1998 e inaugurado em janeiro de 2007, está dando prejuízo, e o governo da ilha deverá tomar as rédeas da empresa.

 

Não é preciso ser especialista para enxergar que o trem-bala brasileiro, se for levado adiante, dificilmente ficará pronto até 2016, custará mais que o programado e o governo terá que subsidiar o preço da passagem.

 

Obviamente, não é cometimento essencial, e haverá mais vantagens para o povo brasileiro ampliar os metrôs do Rio de Janeiro e de São Paulo e investir em ferrovias como a Norte-Sul, a Cascavel-Foz do Iguaçu e a Maringá-Guaira...

 

Na posição de ex-parlamentar que sempre entendeu o papel da oposição no Congresso Nacional mais relevante no seu aspecto propositivo, lastimo que ela fique a reboque do governo Lula e persevere na sua linha de radicalismo inconsistente.

 

Não descarto a importância do trem-bala Rio - São Paulo - Campinas, que poderia estender-se com ramal a Curitiba e Belo Horizonte, porém levo em conta o fator prioridade. O Brasil está em marcha batida para alçar-se a uma das economias líderes do orbe. As imensuráveis riquezas do pré-sal e nossa privilegiada ação produtiva no etanol e no biodiesel, somadas à força da agropecuária e ao poderio industrial, nos asseguram condições inigualáveis para efetivarmos em futuro não remoto o trem-bala. Agora, não é o caso.

 

Léo de Almeida Neves é membro da Academia Paranaense de Letras, ex-deputado federal e ex-diretor do Banco do Brasil.

 

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