Correio da Cidadania

Eólica e solar fotovoltaica não são renováveis, nem confiáveis

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O termo “transição energética” traz a ideia que deixaremos de usar rapidamente certas fontes para usar outras. Geralmente se pressupõe que as piores fontes ficam para trás e as melhores chegam para as substituir.

No entanto, a realidade é bem distinta. As fontes energéticas têm se alterado historicamente de forma lenta, sendo que as fontes anteriores não são simplesmente substituídas por novas, mas se somam a elas, como pode ser visualizado no Gráfico 1 que apresenta o consumo mundial das energias primárias, por fonte, de 1800 a 2022. [1]


Gráfico 1: Consumo mundial de energia primária por fonte (1800-2022)

No passado, à biomassa (lenha, carvão vegetal etc), acrescentou-se o carvão mineral e o petróleo, que são fontes mais baratas de serem produzidas, concentradas em energia e de fácil armazenamento e transporte, o que os torna flexíveis, de pronta disponibilidade e bastante confiáveis. Assim, foi observado um aumento da qualidade das energias utilizadas. Por outro lado, as novas fontes energéticas disponíveis comercialmente hoje (eólica, solar fotovoltaica e biocombustíveis) são mais caras e competem pelo uso do solo, sendo que a energia eólica e solar são intermitentes, pouco concentradas em energia, de difícil armazenamento e transporte, ou seja, de pior qualidade.

Assim, há diversos aspectos que limitam que essas novas fontes energéticas cumpram papel histórico equivalente ao das energias de origem fóssil, do ponto de vista do desenvolvimento econômico, social e ambiental.

Alto custo de produção com externalidades negativas

Os custos de produção das novas fontes energéticas são relativamente mais altos, considerando os custos externalizados pelos seus produtores, como o custo de transmissão e distribuição, o custo do complemento de suprimento de energia confiável para compensar a intermitência, além das subvenções diretas e indiretas tais como os impostos relativamente mais baixos, os créditos de carbono, o acesso prioritário à rede de transmissão e de distribuição da energia elétrica e os subsídios de capital.

O preço de equilíbrio da eletricidade é o preço mínimo requerido para viabilizar a economicidade da sua produção a partir de alguma fonte primária de energia. É o preço que traz a receita média por unidade de eletricidade gerada que é necessário para recuperar os custos de construção e operação de uma central geradora, durante uma vida financeira e um ciclo de funcionamento assumidos. O preço de equilíbrio é geralmente medido em termos de dólares por megawatt/hora (US$/MWh).

A energia eólica e solar fotovoltaica não são tão competitivas em termos de custos como sugerem algumas narrativas. Embora o preço de equilíbrio da eletricidade proveniente de fontes ditas renováveis seja comparável com fontes de energia despacháveis, como o gás natural de ciclo combinado, hidrelétricas, esta comparação é altamente enganadora.

A intermitência na produção é típica das energias eólica e solar fotovoltaica, já que elas dependem da disponibilidade do sol e do vento. Ou seja, de fatores como o tempo, estação do ano e a hora do dia, gerando energia apenas 25% a 34% do ano. [2]

No Sistema Elétrico, toda energia gerada precisa ser imediatamente consumida. E toda energia que se deseja consumir, precisa ser imediatamente gerada, pois não há armazenamento significativo dessa forma de energia. Tanto eólica quanto a solar fotovoltaica precisam de complemento de fontes confiáveis, para que o suprimento seja garantido mesmo com sua intermitência. Assim, as fontes de energia de origem hidroelétrica, nuclear, do carvão e do gás natural, produzem eletricidade conforme a demanda, sendo chamadas de despacháveis (o Operador Nacional do Sistema Elétrico solicita a entrada dessas fontes, “despachando-as”). Dessa forma, nota-se que essas novas fontes energéticas, que são intermitentes, não são despacháveis, ou seja, não realizam o mesmo tipo de serviço para o Sistema Elétrico.

A comparação dos preços de equilíbrio deve ser feita entre energias da mesma qualidade, ou seja, comparar o preço de uma energia firme e sempre disponível com outra que não é confiável e varia não é adequado. Diferentes fontes primárias produzem energia elétrica, mas são energias de diferentes qualidades, uma confiável e outra não. A segunda precisa ser complementada pela primeira, e o contrário não é verdadeiro. São serviços diferentes, que precisam ser remunerados de forma diferenciada. O aumento da quantidade dessas novas fontes energéticas no Sistema Elétrico aumenta a importância das energias “despacháveis”.

A energia solar e a eólica podem ser mais baratas do que os combustíveis fósseis em raríssimas situações. Para a esmagadora maioria das necessidades energéticas do mundo, a energia solar e a eólica são completamente incapazes de substituir os combustíveis fósseis ou são muito mais caras.

Acrescenta-se que é necessário transportar as energias eólica e solar produzidas primordialmente no nordeste brasileiro para os grandes centros consumidores, por meio de construção de novas linhas e subestações que refletem no aumento de tarifa da energia elétrica cobrada de todos os consumidores brasileiros.

Ademais, a energia elétrica não serve para os mesmos fins que os combustíveis líquidos e o carvão. Os combustíveis líquidos de origem fóssil são fundamentais para o transporte de mercadorias e pessoas, energia térmica para a indústria, navegação e aviação. As atividades industriais de mineração, siderurgia e tantas outras dependem das energias fósseis. Os combustíveis líquidos e o carvão são facilmente transportáveis e armazenados.

Os biocombustíveis apesar de apresentarem algumas características similares aos combustíveis de origem fóssil (facilidade de transporte e armazenamento) necessitam de grandes extensões de terra para serem produzidos, competindo com a produção alimentícia. Os principais biocombustíveis (etanol, biodiesel e diesel renovável) são mais caros que seus substitutos de origem fóssil (gasolina e diesel, respectivamente), sendo necessário menores impostos, subsídios e obrigatoriedade de mistura com os combustíveis, o que encarece os combustíveis líquidos para o consumidor.

Não renováveis e não confiáveis

Os defensores das novas fontes energéticas apontam frequentemente para os fluxos totais de energia para a Terra e proclamam que os recursos de energias renováveis são essencialmente ilimitados. Sim, é verdade: estamos rodeados por quantidades incríveis de energia renovável difusa (por exemplo, radiação solar e vento). Infelizmente, porém, essa energia é inútil para nós, a menos que seja concentrada em formas como a eletricidade ou os combustíveis.

As energias dos ventos e do sol são renováveis na sua condição original, dispersa e pouquíssimo concentrada em energia. Elas precisam ser concentradas para que sejam adequadas ao uso. A concentração da energia eólica é feita pelos aerogeradores, enquanto a concentração da energia solar ocorre por meio dos painéis fotovoltaicos. Se na sua condição original as energias dos ventos e do sol são renováveis, na qualidade concentrada e transformada em energia elétrica não são. São necessárias energias e insumos não renováveis para se fabricar e manter aerogeradores e painéis fotovoltaicos, assim como para se construir e conservar a infraestrutura para a transmissão e distribuição da energia elétrica.

Não se produz painéis fotovoltaicos, baterias e aerogeradores a partir da energia elétrica. Mineração de metais, siderurgia e fusão de metais para produção de ligas dependem de energias muito concentradas e de altas temperaturas, ou seja, precisam de fontes primárias de energia de alta qualidade. A Figura 1 apresenta a quantidade média de ferro e aço necessária para construção de uma turbina eólica de 4MW em terra. [3]


Figura 1: Quantidade de ferro e aço necessária para construção de aerogerador para produção de 4MW em terra

Os painéis fotovoltaicos são, em sua maior parte, produzidos pela China, que utiliza em sua matriz energética carvão mineral e outras fontes fósseis. Os aerogeradores e seus demais equipamentos auxiliares estão instalados primordialmente próximo à costa brasileira, sujeitos à corrosão, com necessidade de substituição constante.

Também a construção e manutenção da rede de transmissão e de distribuição de energia elétrica, depende de materiais de origem fóssil, como para obtenção dos elementos metálicos dos cabos, equipamentos elétricos, das torres, entre outros.
Já os biocombustíveis são normalmente provenientes de monoculturas (de cana de açúcar e de soja), necessitando de grandes quantidades de fertilizantes e combustíveis de origem fóssil para movimentação de equipamentos, transporte e seu processamento.

Dessa forma, a hipótese de que as “energias renováveis” irão substituir as fontes fósseis é falsa e uma distração em relação à importância do petróleo, seja hoje ou no futuro. Na entrevista recente do atual presidente da Petrobrás, Jean Paul Prates, para a TV 247, sobre a qual reagi gravando um vídeo com comentários, ele estima que o pico de produção do petróleo brasileiro ocorrerá entre 2030 e 2032. Há previsão que no futuro o Brasil terá que importar petróleo, mantida a produção atual, com exportação de mais de 1,5 milhões de barris de petróleo cru por dia, o que representa 45% da produção nacional, sendo mais de 60% por petrolíferas estrangeiras. É necessário proibir, ou limitar severamente, a exportação de petróleo cru brasileiro e investir na exploração em busca de novas descobertas pela Petrobrás. A volta da necessidade de se importar petróleo traria graves impactos à soberania nacional, balança comercial, preço dos combustíveis (sujeito à oscilação internacional) e a toda cadeia produtiva nacional e sua competitividade. [4] [5]

Pior qualidade

A segunda lei da termodinâmica estabelece as condições para que as transformações possam ocorrer espontaneamente, explica a transformação de calor em trabalho e afirma que a energia deve fluir de uma fonte concentrada para outra mais difusa para realizar trabalho. Toda a nossa sociedade foi construída com base no trabalho realizado através da transformação da energia fóssil concentrada em calor difuso e, para competir, as tecnologias de energia renovável também precisam fornecer essa energia concentrada.

Portanto, existe diferença entre quantidade e qualidade das energias primárias. Por exemplo, as energias solar, eólica, das ondas e marés têm densidades energéticas muito baixas, relativamente baixa capacidade de realização de trabalho, elevado custo para suas obtenções, reduzidas facilidades, flexibilidades e confiabilidades aos seus usos, além de que limitadas temperaturas podem ser atingidas a partir de suas aplicações.

A densidade energética do petróleo é de 35 a 45 giga joules por metro cúbico. A energia solar tem uma densidade de 1,5 micro joules por metro cúbico, mais de vinte quatrilhões de vezes menos do que o petróleo. O vento e maré têm densidades de energia de 0,5 a 50 joules por metro cúbico. A qualidade das fontes primárias de energia reflete inversamente nos seus custos, ou seja, quanto pior a qualidade da fonte primária, maior o seu custo.

Concluímos com um exemplo, “consideremos o que é necessário para substituir uma pequena turbina a gás natural, que produz 100 megawatts de eletricidade, suficientes para até 100 mil casas, com energia eólica. Você precisaria de cerca de 20 enormes turbinas eólicas. Para construir essas turbinas serão necessárias cerca de 30 mil toneladas de ferro e quase 50 mil toneladas de concreto, juntamente com 900 toneladas de plástico e fibra de vidro para as pás e 540 toneladas de cobre (ou três vezes mais para um parque eólico offshore). A turbina a gás, por outro lado, consumiria cerca de 300 toneladas de ferro, 2.000 toneladas de concreto e talvez 50 toneladas de cobre nos enrolamentos e transformadores. Com base num cálculo, precisaríamos extrair mais cobre nos próximos 22 anos do que em todos os últimos 5.000 anos da história humana.” [6]

Referências

[1] Our World in Data.
[2] P. Bonifas e T. J. Considine, “The Limits to Green Energy,” 2023.
[3] World Steel Association, “Iron and steel required for a typical 4 MW onshore wind turbine,” 2023.
[4] F. Coutinho, “Felipe Coutinho reage à entrevista de Jean Paul Prates para TV 247,” 2023.
[5] F. Coutinho, “Exportação de petróleo cru é recorde, Lula conduz o Brasil na rota colonial pavimentada por Temer e Bolsonaro,” 2023.
[6] E. Conway, Material World - a substantial story of our past and future, 2023.
[7] S. Coloete, “The Fundamental Limitations of Renewable Energy,” 2013.
[8] B. E. Layton, “A Comparison of energy densities of prevalent energy sources in units of joules per cubic meter,” 2008.
[9] A. Epstein, “The Ultimate Debunking of “Solar and Wind are Cheaper than Fossil Fuels,” 2023.

Felipe Coutinho é engenheiro químico e vice-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)
Mariana Costa é engenheira química e tem experiência de 15 anos no setor de energia

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