Correio da Cidadania

O crescimento insustentável e heterogêneo da Economia mundial

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O capitalismo vem sofrendo crises cíclicas cada vez mais profundas no processo histórico existencial destes últimos cinco séculos, quando saiu da etapa pré-capitalista para a sua fase adulta, desenvolvida.

Nos últimos 150 anos processaram-se três revoluções industriais que causaram profundas disputas hegemônicas entre as nações, em razão do nível de produtividade heterogêneo das ditas cujas. Dessas viragens nos modos de produção de mercadorias derivam as duas grandes guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945) que ceifaram a vida de 60 a 70 milhões de pessoas, configurando um genocídio como nunca antes se vira no itinerário da humanidade sobre o planeta.  

Agora as crises são mais próximas umas das outras e com um fator adicional: os países periféricos se desintegram por absoluta falta de competitividade na produção de mercadorias num mercado mundial cada vez mais marcado por um controle monetário que manipula a emissão de moedas fortes como modo de indução ao crescimento econômico e salvação do sistema financeiro credor dos Estados (ricos e pobres), endividados e sem capacidade de solvência.

 
Segundo o FMI, a economia mundial cresce pouco, enquanto a brasileira caiu dois anos e depois estagnou.

Após dez anos de queda, com exceção de 2010 (quando se observou um suspiro, graças a instrumentos do capitalismo moribundo), eis que o ano findo, 2017, está sendo alardeado como o início de um novo ciclo de crescimento da economia.

O principal argumento para justificar tal retomada é o crescimento das taxas de empregabilidade da mão-de-obra economicamente ativa nos Estados Unidos desde 2010, quando o desemprego atingiu 9,7%; já no ano passado tinha caído para 4,4%, ainda que com redução dos níveis salariais médios, como imposição da concorrência de mercado internacional na produção de mercadorias.

Mas, esquecem-se os apressados analistas que os números da economia estadunidense continuam a apresentar fissuras que somente são contornadas porque o mundo continua ingenuamente acreditando na solidez dos títulos da dívida pública e da própria moeda dos EUA.

Os países ricos, que têm dívidas colossais relativamente aos seus PIBs (como é o caso dos próprios Estados Unidos, da União Europeia, do Japão e mesmo da China, que, apesar de seu PIB já ser o segundo do mundo e caminhar para o primeiro lugar, não possui renda per capita compatível com os padrões do G7), têm suas dívidas públicas financiadas a baixíssimos custos como resultado das altas somas de dinheiro sem possibilidade de aplicação na produção de mercadorias de modo rentável.

Enquanto os países ricos têm juros baixíssimos (o que obriga os bancos a captar recursos a juros negativos para financiá-los), os países periféricos, onde mora a grande maioria da população mundial, mesmo com suas taxas de endividamentos públicos percentualmente menores em relação às dívidas/PIB dos países ricos, pagam juros escorchantes.

O Brasil, por exemplo, no ano de 2016 desembolsou R$ 407 bilhões em juros, equivalendo a mais de 8% do PIB, o que sacrifica sobremodo as finanças públicas em detrimento da satisfação das demandas sociais. Em 2017 os números tendem a ser ainda mais elevados.

Isso tudo é capitalismo.   

O capital está desempregando justamente porque o desemprego estrutural impõe essa condição e o sistema financeiro fundado em dívidas impagáveis num futuro próximo tende ao colapso. Quem viver, verá.


Míseros +0,2% e o Governo Temer exagerando no auê...

As análises da economia mundial feitas pelos economistas burgueses e pelo grande empresariado nacional e mundial ávidos em manter suas absurdas concentrações de riquezas, se parecem com o entusiasmo daqueles doentes crônicos que, face a uma fugaz melhora do seu quadro geral, passam a acreditar na pronta e sustentável recuperação.   

Costumo dizer que, se um extraterrestre incumbido de relatar sobre a vida no nosso planeta descesse em qualquer grande cidade brasileira e ficasse apenas nos bairros ricos, alheio ao que se passa nos extensos bairros miseráveis como resultante da cisão social citadina, faria um relato totalmente distorcido da realidade.  

Assim, a análise econômica, sem levar em conta o desequilíbrio da macroeconomia global, faz sempre uma avaliação otimista e parcial dos surtos cada vez menores de recuperação econômica, pois, afinal, quando se tem (como no caso brasileiro e da culta União Europeia) percentagens aviltantes de desemprego social, qualquer melhora nos indicativos estatísticos é celebrada como prenúncio de tempos melhores consistentes e duradouros, ainda que a miséria e a barbárie social continuem grassando soltas.

Além da dívida pública impagável, há a questão dos déficits das previdências sociais mundiais em face do desemprego estrutural que atinge principalmente os jovens que chegam ao mercado. É uma bomba-relógio prestes a explodir graças à impossibilidade de montar-se uma equação contábil plausível da matemática financeira previdenciária.   

Sob o capitalismo, os bairros são como as cidades, as cidades são como os países e os países são como o mundo: ilhas de prosperidades decadentes, rodeadas de misérias por todo lado.  

Tudo se torna tão ilusório e irracional como, por exemplo, a até ontem florescente moeda virtual bitcoin: ela deveria apenas representar o valor médio das moedas que compõem a sua carteira, mas, impulsionada pela lei da oferta e da procura, atingiu valores desmedidos, até ter um choque de realidade e causar enormes prejuízos aos que aderiram de última hora à corrida do ouro... de tolo!. Estes agora são obrigados a venderem seus ativos financeiros, sob pena de prejuízos ainda maiores.

 
Euforia com a bitcoin = "corrida do ouro... de tolo!"

Ainda se vê pela internet, sem que seja considerado crime, o chamamento aos pretensos lucros fáceis na aquisição da moeda virtual (a abstração da abstração, como a qualificamos aqui).

O crescimento econômico mundial de 2017 (o qual só pode assim ser considerado em comparação com os 10 anos anteriores, que marcam o grande choque depressivo do sistema financeiro provocado pela bolha financeira do subprime imobiliário estadunidense, cujas consequências não foram ainda mais danosas porque o Estado interveio emitindo títulos da dívida pública e moeda oficial falsa), não tem consistência duradoura, mais se assemelhando a um milagrezinho econômico de um capitalismo em fim de feira.

Bolhas financeiras induzidas pelo excesso de capitais sem capacidade de aplicação no sistema produtor de mercadorias (aplicação dentro das regras da lógica de um capitalismo embasado economicamente na produção de valor dito válido, ainda que seja sempre segregacionista) têm fôlego curto.

Dalton Rosado é advogado, escritor e compositor. Foi secretário de Finanças de Fortaleza no governo de Maria Luíza Fontenele.
Retirado de Náufrago da Utopia.

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