Correio da Cidadania

CNN Brasil: de onde menos se espera é que não sai nada

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Nesta semana, a CNN Brasil divulgou a imagem oficial de todos os seus âncoras reunidos. Dos 15 apresentadores (sendo sete mulheres) que aparecem na foto, apenas Luciana Barreto – que já esteve no podcast Lado B do Rio – e Diego Sarza são negros. O jornalista, aliás, aparenta até estar um pouco embranquecido na imagem, algo corriqueiro na TV por conta da iluminação e da maquiagem (e do racismo). Já aconteceu até no Jornal Nacional da Rede Globo.

Não bastasse a falta de diversidade que a fotografia mostra por parte do canal, a principal figura que o telespectador brasileiro verá na CNN será William Waack, aquele mesmo que foi demitido da Globo após vazarem um vídeo em que ele comete racismo explícito.


O sorrisinho não deixa mentir: Waack estará em casa (Divulgação)

Bem, na pauta de desigualdade racial, nem precisamos dizer mais nada, não é?

Pulemos, então, para o posicionamento da CNN no xadrez político brasileiro. O canal estadunidense desembarca em terra brasilis em pleno governo neofascista de Jair Bolsonaro. No primeiro ano de mandato, os grandes veículos foram se adequando à nova realidade da (necro)política.

Enquanto alguns abraçaram o pacote completo com uma fidelidade de emocionar – casos, principalmente, de RedeTV, Band, SBT e Record -, os grupos Folha e Globo parecem tentar frear a verborragia de Bolsonaro e seus asseclas, ainda que digam amém com o mesmo afinco para a política econômica de Paulo Guedes. Ou seja: enquanto Ratinho e Datena gozam (inclusive financeiramente) com o governo xenófobo, homofóbico, racista e machista, William Bonner e outros compactuam com tudo isso em prol do desmonte do Estado e da retirada dos direitos, mas pedem que o governo não seja abertamente xenófobo, homofóbico, racista e machista. “Poder, pode, mas não sejam pegos”, gritam.

É nesse cenário, que confunde o leitor/espectador menos atento, que a Cable News Network do Brasil chega nas TVs a cabo das classes médias e altas. Nos EUA, a CNN é vista como “Canal dos Democratas”, rivalizando com a Fox News, que atende aos interesses dos Republicanos.

Graças à dicotomia do bipartidarismo yankee que ocorre na prática, os democratas são direitistas mais moderados, liberais nos costumes, que até abrigam socialistas. E, por lá, chamam Jair Bolsonaro do que ele de fato é: far-right (extrema-direita).

No Brasil, entretanto, a dúvida sobre em qual espectro a CNN se encaixaria pairou durante muito, muito pouco tempo.

Nem direita, nem de esquerda? Já sabem...

Há alguns meses, pouco após o anúncio da chegada do canal ao Brasil, os escolhidos para comandar a emissora correram pra deixar claro que não seriam “nem de esquerda, nem de direita”. Ou seja, serão de direita.

Sobre os controladores, aliás, um capítulo à parte. Comandarão a marca no país o jornalista Douglas Tavolaro e o empresário Rubens Menin. De antemão, um aviso: desconfie sempre da combinação megaempresário e jornalista.

Douglas é sobrinho do bispo fundador da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), Edir Macedo, e mais nem precisaria ser dito. Foi durante muito tempo o mandachuva do jornalismo da TV da IURD que atende pelo nome de Record. Sua mulher, Raissa, está envolvida em escândalo de improbidade administrativa e enriquecimento ilícito, como descobriu o The Intercept Brasil.

Já Rubens Menin é o bilionário por trás da MRV Engenharia e do Banco Inter. Também mais não precisaria dizer, mas diremos mesmo assim: Rubens é entusiasta de Bolsonaro, sendo um dos empresários recebidos secretamente pelo escroque que habita o Planalto atualmente. O The Intercept, aliás, também mostra alguns corpos no armário do bilionário.

Parece muito, mas tem mais. A CNN não quer ser só de direita, liberal ou governista. Ao contratar Leandro Narloch e Caio Copolla, o canal sediado em Atlanta mostra querer mesmo é abraçar o revisionismo, o terraplanismo social e político, a loucura, a mentira e a vigarice como linha editorial.

É possível que um ou outro jornalista contratado em meio a esse esgoto se esforce para fazer um contraponto minimamente humano e democrático no canal. Ninguém muito notório, entretanto. Assim, não dá para saber se terá a coragem de escapar nas frestas de tamanha onda conservadora entre seus colegas.

Se restava alguma dúvida a você, caro leitor, agora não resta mais: a chegada da CNN ao Brasil dá ao brasileiro uma nova opção para os mesmos conteúdos vistos nos veículos hegemônicos. Como dizia Barão de Itararé, de onde menos se espera, é que não sai nada mesmo.

Fiquem, portanto, com nossa sugestão: invista seu tempo na mídia independente. Leia os veículos alternativos com que você se identifica, ajude financeiramente, se possível, e trabalhe pra aumentar o engajamento e a disseminação da resistência da comunicação de guerrilha, um contraponto tão necessário nos dias de hoje.

Antes que acabe.

Caio Bellandi é jornalista e um dos integrantes do site e podcast Lado B Rio, onde este artigo foi originalmente publicado.

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