Correio da Cidadania

Até quando vamos aceitar?

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Desde a manhã de domingo, circulam nas redes sociais vídeos mostrando jovens brasileiros do sexo masculino (e não é por acaso que não utilizo a palavra homens) aparentemente brincando com mocinhas russas. A “aparência” termina em poucos segundos.

No primeiro, postado como denúncia no Twitter bem cedo, um grupo sorridente envolve uma jovem e a incentiva a cantar um estribilho com alusões grosseiras a um órgão do corpo feminino. No segundo, moçoilos pretensamente simpáticos induzem três moças – elas também sorrindo, ingenuamente – a tentar repetir, em português, uma declaração grosseira de que gostariam de fazer sexo com eles. No final, um deles grita,  ‘chancelando’ o feito e como que se orgulhando da grande vitória que conseguiram para nós: “Brasil, Brasil, Brasil!”.

Não vou reproduzir aqui os vídeos, por dois motivos. Primeiro, porque são repugnantes. Segundo, porque as moças têm seus rostos expostos em ambos.
Um dos ‘artistas’ é um ex-Secretário de Turismo de Ipojuca, município de Pernambuco.

Fico me perguntando se esses seres trabalharam para comprar suas passagens e pagar hotel, alimentação etc. para essa ida à Copa. Tenho dúvidas, considerando as caras e o comportamento... Como se sentirão os papais e mamães que provavelmente bancaram tudo vendo isso? Envergonhados? Ou será que estarão orgulhosos com a prova em vídeo do quanto seus filhos são ‘machos’ internacionais?

No geral, a reação aos dois vídeos nas redes é de revolta e pleno repúdio. Numa das postagens no Twitter há inclusive alguns comentários agressivos em relação à gangue (merecem outro nome?), prometendo até violências físicas quando do regresso ao Brasil. Já no Youtube, onde o segundo vídeo está postado, em meio a propostas de ações que envolvem denúncias aos representantes diplomáticos russos no Brasil, aparecem também vozes defendendo o caráter ‘lúdico’ da coisa:

Não sei como descemos tão baixo! É óbvio que este país não é habitado por santos e que ao longo dos nossos 518 anos a canalhice sempre esteve presente, ainda que de formas historicamente diferenciadas. Mas não tenho conhecimento de qualquer momento em que pareça haver um certo orgulho generalizado de se mostrar abjeto, violento, racista, misógino, xenófobo, ignorante, inclusive. As porteiras foram abertas, e a turba perdeu todos os limites. Principalmente, perdeu a noção de humanidade e de dignidade.

Não vou repetir aqui que a impunidade pós-ditadura tem a ver com isso. Não preciso. Quando um deputado homenageia um torturador na tribuna da Câmara Federal e isso é aceito como normal, é porque decaímos mesmo enquanto seres humanos.

Quanto aos jovens da gangue da Copa, espero que todos sejam identificados e sumariamente expulsos da Rússia. Não sei se há previsão legal para algum tipo de ação quando aqui chegarem, mas sem dúvida eles não merecem que alguém tome a si a tarefa de castigá-los, como alguns defendiam nas redes.

Merecem, sim, uma execração pública e algum tipo de punição institucional, mesmo considerando a atual falência das nossas instituições.

No mais, precisamos urgente repensar a nossa participação nisso tudo. E agir. Não quero ter vergonha de ser brasileira.
 
Tania Pacheco é jornalista e editora do Blog Combate ao Racismo Ambiental.

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