Correio da Cidadania

Os licenciamentos ambientais de mentirinha

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O título deste artigo é menos absurdo do que pode parecer à primeira vista. Nos últimos anos, estão cada vez mais freqüentes as denúncias de EIA-RIMAs (Estudo de Impacto Ambiental – Relatório de Impacto Ambiental) tecnicamente inconsistentes ou fraudulentamente produzidos. E isto é um problema extremamente sério.

 

Para compreender, de forma sintética, o que são e para que servem os EIA-RIMAs, recomendamos a leitura das informações em http://www.geofiscal.eng.br/eia.htm, que serão muito úteis aos leitores.

 

Voltando à questão principal, já é evidente que surgiu uma indústria de EIA-RIMAs, pré-fabricados apenas e tão somente para atender às exigências legais mínimas. A cada dia surgem novos questionamentos sobre a veracidade destes estudos.

 

Neste sentido, encontram-se os casos das hidrelétricas de Barra Grande, das usinas no rio Madeira e outros casos escandalosos. Sobre Barra Grande, recomendamos que pesquisem no próprio EcoDebate e em http://www.consciencia.net/2004/mes/10/barragrande-crime.html . No Ecodebate, a tag "licenciamento ambiental" é rica em detalhes deste problema que se agrava.

 

As ambientalistas Ana Echevenguá (Eco&Ação) e Telma Monteiro (Blog Telma Monteiro) são figuras importantes nas denúncias dos licenciamentos de mentirinha, tão do agrado dos grandes interesses econômicos e do governo desenvolvimentista de plantão. Em seus sítios/blogues discutem, denunciam e expõem esta "linha de montagem" de licenciamentos com clareza e profundidade.

 

Este governo não consegue compreender que o processo de licenciamento ambiental é "ligeiramente" diferente da concessão de um mero alvará e por isso não suporta a idéia de que as licenças não sejam concedidas automaticamente, como se fossem meros detalhes burocráticos.

 

Se dependesse do voluntarismo governamental, teríamos ampla e irrestrita concessão de licenças ambientais para quaisquer atividades, sem qualquer consideração para com as questões sócio-ambientais.

 

Diversos membros do primeiro círculo do poder já afirmaram que a grande fase do desenvolvimento do Brasil se deu durante os governos militares, coincidentemente uma época em que as preocupações sociais e ambientais das grandes obras simplesmente inexistiam.

 

Aliás, o presidente Luiz Inácio da Silva não cansa de elogiar os projetos dos governos militares, quando a agenda desenvolvimentista era imposta na marra.

 

O governo, a começar pelo próprio presidente, reclama dos ambientalistas, dos índios, dos quilombolas, dos ribeirinhos, do Ministério Público, do Poder Judiciário, dos movimentos sociais e de todos os que não concordam com esta opção pseudo-desenvolvimentista. E reclama com razão, porque estes segmentos da sociedade não aceitam este modelo de desenvolvimento a qualquer custo.

 

Enquanto isto, a tragédia dos licenciamentos de mentirinha se agrava. Os erros e inconsistências são de tal monta que os órgãos ambientais em muitos casos chegam a exigir tantas condicionantes que praticamente equivalem a outro EIA.

 

Isto, em princípio, não seria um problema se os órgãos ambientais não estivessem sucateados, sem funcionários técnicos e com uma inadequada estrutura técnico-administrativa.

 

A fragilização estrutural, a falta de funcionários capacitados e corretamente qualificados e a falta de suporte de adequadas políticas públicas dificultam a avaliação técnica dos licenciamentos e abrem portas aos oportunistas. Isto é um problema com mais de 10 anos e continua a se agravar.

 

Outra questão que está sempre presente é o abandono dos compromissos de mitigação e compensação exigidos na Licença Prévia. Os empreendedores sabem que os órgãos ambientais não conseguirão fiscalizar o cumprimento das condicionantes antes da Licença de Operação (LO) e, neste momento, não terão apoio político para revogar o licenciamento.

 

E a indústria de EIA-RIMAs apenas piora o problema. Bem, mas o que fazer?

 

Já foi um grande avanço quando o IBAMA suspendeu a licença ambiental para Hidrelétrica do Baixo Iguaçu (PR) , em razão de uma ação civil pública. O empreendimento seria construído nos municípios de Capanema e Capitão Leônidas Marques, a cerca de 500 metros do Parque Nacional do Iguaçu. A ação afirma que o estudo de impacto ambiental e o relatório de impacto ambiental (EIA/Rima) têm lacunas e omissões que impedem o dimensionamento adequado dos impactos que a construção provocaria.

 

Em primeiro lugar, é evidente que o licenciamento existe para ser rigorosamente observado. E não existe a obrigatoriedade de licenciar toda e qualquer obra, só porque uma empresa e/ou o governo querem que assim seja.

 

Para isto, os órgãos ambientais, na medida do possível, já estão fazendo o que devem – analisando com rigor e critério. Ao empreendedor cabe o risco de ter a análise tão demorada quanto o EIA-RIMA for impreciso ou inconsistente. E, se for o caso, ter o licenciamento negado.

 

Em segundo, no caso federal, excluir do Cadastro Técnico Federal todas as empresas que tenham "produzido" estudos sem qualidade técnica. No caso de fraude, ela deve ser tratada como realmente é: como criminosa. E aos empreendedores, co-responsáveis no EIA-RIMA fraudulento, ficará o ônus do licenciamento negado.

 

E, por fim, os Conselhos Regionais, dos profissionais que subscrevem os EIA-RIMAs inconsistentes ou fraudulentos, devem apurar as responsabilidades profissionais e, definidas as responsabilidades em processos administrativos, aplicar as penalidades previstas em lei, inclusive a cassação do registro profissional.

 

Esta crise só terminará quando acabar a impunidade e é isto que devemos exigir.

 

Henrique Cortez é ambientalista e coordenador do Portal EcoDebate.

 

E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

 

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