Correio da Cidadania

A votação do PL do Serra sobre o Pré-Sal

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Escrevo este texto no dia seguinte ao da aprovação do PL 131 do senador José Serra sobre o Pré-Sal, que ocorreu em 24/02/16. Assisti a todo o debate no plenário do Senado. A primeira dúvida, que os jornais não elucidam, é sobre a modificação introduzida de última hora pelo senador Romero Jucá, conforme menção do presidente do Senado, Renan Calheiros, que permitiu a conciliação entre os oposicionistas e a presidente Dilma.

 

Isto porque o texto aprovado, pelo que foi depreendido dos debates, foi o original do Serra com a modificação colocada pelo relator do projeto, senador Ricardo Ferraço. Na minha compreensão, Romero Jucá foi ao Planalto, ainda antes da votação, para dizer à presidente que, pela experiência dele e de Renan, o projeto ia ser aprovado pela oposição com os sublevados da base (ele e Renan eram dois deles).

 

Assim, eles estavam preocupados em dar uma “saída honrosa” para a presidente. Acontece que o senador Lindbergh Farias discordava desta vitória líquida e certa do PL 131. O interessante é que eles não ofereceram nada em troca pelo apoio da presidente, porque o que foi colocado em votação depois foi exatamente o que estava para ser julgado antes.

 

Dessa forma, a presidente ficou com a seguinte dúvida: ou apoia a rejeição do projeto e corre o risco de, no dia seguinte, as manchetes dos jornalões serem “Governo perde o embate no Senado do projeto de Serra sobre o Pré-Sal”, ou dá apoio ao projeto e deixa insatisfeita sua base aliada. Decidiu pela opção errada, a meu ver, porque a oposição e os traidores da base aliada vão continuar colocando “cascas de banana” no seu caminho, além de não apoiar quem sempre a apoia.

 

Muitos dos pronunciamentos dos senadores, retirando poucas exceções, foram deprimentes. Um senador não tem obrigação de entender de todos os assuntos que passam pelo Senado para deliberação. No entanto, eles têm de estudar, pelo menos, os temas relevantes e atuais, e se cercarem de assessores que possam lhes explicar as questões em debate. Há senadores que fazem discursos emocionais e, às vezes, bonitos, pensando que estão cumprindo o dever legislativo, quando deveriam expor aos pares explicações necessárias, análises inéditas e aconselhamentos.

 

Não sendo exaustivo nesta citação, contribuíram muito para o aprofundamento da questão os senadores José Serra, Roberto Requião, Lindbergh Farias, Gleisi Hoffmann, Cristovam Buarque e Vanessa Grazziotin. Há senadores que se expressam muito bem, mas só tangenciam o tema. E outros, muito inteligentes, que buscam formas de dizer o secundário para defender o principal omitido, por ser inconfessável.

 

Não vi senador algum citar a lista completa de razões pelas quais a Petrobrás deve ser a operadora única do Pré-Sal. A Petrobrás como operadora significa:

 

1) as compras locais de bens e serviços aumentam, inclusive a encomenda de desenvolvimentos tecnológicos no país;

 

2) a geração de empregos no Brasil é maior;

 

3) passa a ser viável a adoção de uma política industrial, devido à grandeza das contratações da Petrobrás;

 

4) a produção predatória é evitada;

 

5) o controle do Estado sobre o ritmo de produção de petróleo passa a existir;

 

6) a segurança operacional, de comunidades próximas e a ambiental são aumentadas;

 

7) a participação do país em ações geopolíticas passa a poder ocorrer e;

 

8) as fraudes na medição do petróleo produzido e nos custos ocorridos são evitadas. Alguns senadores da base mencionaram um ou outro destes itens.

 

Senadores da oposição mencionaram à exaustão que a Petrobrás está falida e, como tal, eles estão retirando dela o ônus de ter que entrar em todo consórcio que se formar no Pré-Sal e dando o bônus da faculdade de entrar, se julgar conveniente. Quem melhor respondeu a este argumento foi a senadora Grazziotin, que disse algo como: “se existir o leilão de um bloco amanhã e se for descoberto petróleo nele, demorará oito anos para o campo entrar em operação; neste tempo, é impossível que a Petrobrás com a sua geração de caixa, que não é pequena, não consiga se recuperar”.

 

Além disso, os senadores de oposição quererem retirar ônus e dar bônus para a Petrobrás é somente um jogo de palavras sem significado, pois graças a esta proposta, como bem disse um senador, a Petrobrás poderá até vir a falir. Eles deveriam estar preocupados em satisfazer a sociedade brasileira, o que é esquecido.

 

A pressa para se aprovar este projeto de lei só se justifica se for compreendido que as petrolíferas estrangeiras estão contando com o Brasil oferecer muitos blocos do Pré-Sal em leilões, agora mesmo, enquanto todos os preços relacionados com o negócio do petróleo estão baratos, para ganharem os blocos em condições excepcionais e, assim, ficarem com um excelente portfólio de blocos. O senador Lindberg lembrou algo no seguinte teor: “não faz sentido ter pressa para aprovar essa lei, a menos que se conte com a mudança para se realizar leilões imediatamente, em uma época em que o barril está a 30 dólares; isso será uma doação!

 

O senador Requião foi o único que lembrou o aspecto geopolítico do petróleo, que é extremamente relevante. Guerras ocorreram pela sua posse, assim como outras foram perdidas pela falta dele. Também, no início dos anos 90 do século passado, a ação geopolítica de derrubada do preço do barril, realizada pelos Estados Unidos, a Arábia Saudita e outros países do Golfo levou a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas a se desintegrar, uma vez que a grande receita deste bloco era a da exportação de petróleo.

 

Nos dias atuais, se houver necessidade, a garantia de abastecimento futuro de petróleo pode servir como fator de convencimento de países para apoiarem teses brasileiras em fóruns multilaterais. Lembrar que, quando uma empresa estrangeira extrai, por força de contrato, o petróleo brasileiro, este deixa de ser nacional, sendo impossível usá-lo em ações geopolíticas.

 

Gostei da honestidade do senador Cristovam que, sentindo-se incapaz de decidir por ver aspectos lógicos nas duas argumentações e por ter existido uma pressa injustificável, que tolheu as discussões nas comissões, ia abster-se de votar. Gostei também da análise do senador Humberto Costa ao lembrar que esta lei deveria ser uma lei para o Estado brasileiro e, não, uma lei para o governo atual.

 

Em uma situação hipotética, pode vir um novo governo que providenciará vários leilões e dará ordem à nova diretoria da Petrobrás, nomeada por ele, para recusar as ofertas de participação nos consórcios dos blocos do Pré-Sal, onde seria a operadora. Infelizmente, o senador Costa com toda esta lucidez, por dever de lealdade, se absteve.

 

Curiosa foi a emenda do senador Fernando Bezerra Coelho, que propôs a Petrobrás poder participar dos consórcios com um percentual menor que 30%, algo como uns 5%, segundo ele, e ainda poder ser cooperadora no bloco. Pareceu-me uma proposta de interesse das petrolíferas estrangeiras porque elas reconhecem que, consorciadas com a Petrobrás, fica mais fácil descobrir petróleo no Pré-Sal. A emenda não foi aprovada, inclusive por não existir no mundo, que eu saiba, a duplicidade de operadoras em um campo. Enfim, o futuro é nebuloso.

 

 

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Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia e colunista do Correio da Cidadania.

Blog do autor: http://www.paulometri.blogspot.com.br/

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