Correio da Cidadania

Ainda o conservadorismo do Partido do Chá

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Embora não tenha sido ainda constituído oficialmente como partido, o movimento dos chazeiros alarga-se nos Estados Unidos desde o final de 2008, sem, contudo, vislumbrar ainda sua transformação em uma terceira via. O seu primeiro teste eleitoral maciço será em novembro próximo.

 

Sem líderes de reconhecida ressonância popular, a nova roda-viva política, no entanto, espraia a sua mensagem, por cujo teor se manifestam favoráveis os meios de difusão mais conservadores, como o canal de TV a cabo Fox, ou mesmo mais reacionários.

 

Até o momento, a movimentação chazeira tem demonstrado capacidade razoável de organização, como nos protestos de abril e setembro de 2009, tendo em vista também o seu popular mote – menos impostos e mais equilíbrio orçamentário - bem cativante entre a classe média, bastante esmorecida depois da crise econômica de 2008.

 

Outrossim, parte dela inclina-se a favor de medidas anti-imigratórias mais rígidas, em decorrência do aumento do desemprego. É possível apontar sua influência na recente e polêmica legislação aprovada no estado do Arizona, apesar das estimativas do próprio governo, via Departamento de Segurança Interna, que apontam para uma gradativa redução da imigração ilegal no país.

 

Parlamentares oriundos de outros estados fronteiriços com o México poderiam sentir-se mais pressionados a adotar posturas mais rigorosas no tocante à temática da imigração, o que embaraçaria, sem sombra de dúvida, a atuação do Departamento de Estado.

 

Entre seus defensores, existe a convicção disseminada de que a tradicional prosperidade dos Estados Unidos no longo prazo esteja muito ameaçada, posta a inépcia administrativa da presente classe política, especialmente a do Partido Democrata.

 

Em síntese, uma agremiação informal estimulada por uma postura anti-governamental, mas não anti-sistêmica, uma vez que não há a inclinação à desobediência civil ou à luta armada.

 

Em 1992, houve movimento similar, em vista da incerteza econômica por que passavam os Estados Unidos, a despeito da vitória sem par na I Guerra do Golfo no ano anterior. Naquela altura, porém, havia uma face identificadora: Ross Perot, rico empresário do Texas.

 

A presente insatisfação verbaliza-se em dois momentos distintos em face de manifestações do governo Obama: o projeto de lei relativo ao auxílio de saúde à população mais desvalida, cerca de 30 milhões, e o pacote de estímulo à economia, em torno de 800 bilhões de dólares, em fevereiro último.

 

Na concepção do Partido do Chá, o gasto de quase um trilhão de dólares destinar-se-ia a remediar a incompetência e a ganância desmedida do setor financeiro e do automobilístico, em detrimento de seus clientes, portanto, premiá-los, a despeito da tormenta sócio-política gerada por eles.

 

Contudo, não resta claro se ele será realmente autônomo ou meramente braço auxiliar dos republicanos mais conservadores, como no caso do pleito senatorial em Massachussets. Lá, realizou-se a eleição em janeiro último em decorrência do falecimento de Ted Kennedy, seu titular por 47 anos.

 

Em vez da esperada manutenção do assento pelos democratas, um nacionalmente desconhecido republicano, Scott Brown, arrebatou-a por pouca diferença. Desde o início da década de 70, os republicanos não representavam o estado no Senado Federal.

 

Por outro lado, aspirar à independência por tornar-se um partido dificilmente significaria romper, ao menos no curto prazo, o caráter bipartidário dos Estados Unidos; em cem anos, três tentativas importantes foram feitas – 1912 e 1992 por republicanos e 2000 por democratas – sem que em nenhuma delas houvesse a fratura do sistema.

 

De mais a mais, há uma questão importante para viabilizar-se a atividade partidária dos entusiastas chazeiros: financiamento constante.

 

Em sendo falto de recursos para futuras campanhas, os correligionários do Partido do Chá seriam incorporados por pragmatismo à via republicana. Apenas em um ou outro distrito seria possível para eles concorrer com chances de forma independente.

 

Com os olhos postos na parcial renovação do Congresso ao fim do ano, o que lhes poderia eventualmente proporcionar o controle da Câmara dos Deputados, republicanos cativam os aderentes do Partido do Chá.

 

A forma de atrair o eleitorado mais à direita é reiterar a afinidade ideológica, ainda que haja divergência na execução de tais formulações.

 

O risco diante de um enrijecimento no posicionamento político é estimular os cidadãos mais desinteressados do processo eleitoral a temporariamente engajarem-se, como no possível caso de Nova York, em função da eleição senatorial de novembro.

 

Outrossim, simpatizantes do Partido Republicano de feitio mais moderado também poderiam de maneira provisória deslocarem-se ao espectro democrata, mesmo na eventualidade de que muitos chazeiros tenham por meta não a constituição de um novo partido, mas sim a renovação da grei republicana.

 

Por fim, somente a eleição do final de 2010 poderá sinalizar se o Partido do Chá será como a espuma da onda, tal qual a movimentação de 1992. Se não for, duas comissões parlamentares serão muito influenciadas por seus representantes: a de Relações Exteriores e a de Segurança Interna.

 

Virgílio Arraes é doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

 

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