Correio da Cidadania

Estados Unidos: duas décadas do início da II Guerra do Golfo

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Invasão do Iraque em 2003 – Wikipédia, a enciclopédia livre
No alvorecer do século 21, os Estados Unidos (EUA) embrenharam-se em dois conflitos de médio porte no continente asiático: o do Afeganistão, em decorrência dos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 a duas localidades do país, e o do Iraque, em função da revelação do desenvolvimento de armas de destruição em massa (ADMs) químicas e quiçá biológicas, objeto de supervisão multilateral, na perspectiva norte-americana, incompleta como a de responsabilidade, por exemplo, da Organização para Proibição de Armas Químicas (OPAQ).

Consoante a propagação da imprensa estadunidense, informes como os da Agência Central de Espionagem (CIA) indicavam por suposto o andamento acelerado do projeto armamentista iraquiano. Na época da divulgação, questionavam-se a precisão das informações levantadas por ela e o método da exposição pelo governo norte-americano, ou seja, ênfase a determinados aspectos do alegado programa bélico.

Nas duas confrontações, o desempenho castrense de Washington seria insatisfatório, ao malograr em fixar nas nações invadidas democracia com o propósito de eliminar uma ditadura religiosa e outra militar respectivamente, outrora, destaque-se, aliadas da Casa Branca contra o comunismo e contra o fundamentalismo.

Na prática, o objetivo não seria o de implementar a mudança real de regime político, mas o de substituir o grupo lá instalado e patrocinar a chegada de um conectado com diretrizes econômicas norte-atlânticas. A derrubada de governantes não seria difícil, porém a substituição, sim, em face do alheamento da população local para apoiar a transição de poder, mesmo sob verniz democrático.

Em se tratando do Iraque, a investida seria preemptiva, ou seja, além da preventiva, ao antecipar-se de possível ação armada do país contra os Estados Unidos, ao direcioná-la contra a sociedade ou contra seus dirigentes, embora jamais tenha sido comprovada a capacidade de Bagdá de efetuar isto em curto prazo.

Ela havia sido, no entanto, especulada durante meses por Washington e pelos meios de comunicação com natural repercussão global, fundamentada em tese por análise fundada, por sua vez, do Pentágono, do Departamento de Estado e de agências de vigilância.

Mais adiante, acrescentar-se-ia a questão humanitária como motivo da deposição do governo iraquiano à opinião pública planetária, ao trazer a questão do contínuo tratamento negativo à minoria curda no norte do país, já guarnecida a área desde a década de 90 pela força aérea estadunidense.

A adição da justificativa teria sido derivada do desgaste político da Casa Branca nos primeiros meses depois de desencadeada a confrontação. Nem assim, os Estados Unidos granjeariam apoio internacional amplo. Considerava-se que a II Guerra do Golfo havia eclodido sem exaurir a diplomacia multilateral.

Como a bilateral não tinha viabilidade havia muitos anos, por causa da rivalidade amero-iraquiana nos anos 90, Washington decidiu acertar-se de maneira direta com Bagdá, após utilizar de forma frustrada o peso da Organização das Nações Unidas (ONU) a seu favor.

O bloco euro-otaniano, encabeçado naquela altura pela França, ainda acreditava ser possível a retomada de inspeções desembaraçadas em solo iraquiano, porém os norte-americanos não se dispunham a aguardar a autorização do Iraque para isso, dado que eles invocavam a necessidade de imediata ação, ao se basear em várias resoluções não observadas do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas pela ditadura baatista.

Dois decênios depois, não se vislumbra na Casa Branca a solução de ocasional desinteligência pelas armas, porém pela negociação, apesar da aparente demora para resultados perceptíveis. A atenção geoestratégica continua em solo asiático, porém em outra parte ao tensionar com a China por causa da autonomia de Formosa (Taiwan) e com a Coreia do Norte por conta do programa nuclear.

Espera-se que a postura dos órgãos de espionagem e da própria administração direta norte-americana não seja a de divulgar dados militares sem corroboração de demais potências, de modo que a imprecisão possa justificar a elevação supérflua da tensão diplomática e desacorrentar em um rompante confronto como em 2003.

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Virgílio Arraes

Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

Virgílio Arraes
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