Rússia no Oriente Médio: dilema para os países norte-atlânticos

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Virgílio Arraes
18/12/2015

 

A chegada dos russos à guerra síria ampliou a indefinição não apenas no Oriente Médio, mas em países conectados com aquela turbulenta região, seja por interesses econômicos, por causa essencialmente da necessidade de acesso contínuo a petróleo e gás, seja por razões políticas, por conta do deslocamento maciço de refugiados para a Europa Ocidental.

 

Governos da região médio-oriental preocupam-se a todo o momento com a possibilidade de que a instabilidade faculte a demarcação de novas fronteiras, haja vista o impacto da situação cataclísmica do Iraque e da Síria com o avanço da militância fundamentalista sob nova bandeira – o denominado Estado Islâmico.

 

Bruxelas, quartel-general da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), desnorteia-se com a recente desenvolta perambulação de Moscou naquele rincão, apesar de estar instalada em solo sírio há décadas. O embaraçado ataque turco de um F-16 a um jato russo SU-24 no dia 24 de novembro foi o primeiro marco da incompreensão entre os europeus.

 

A Turquia justificou a derrubada da aeronave em decorrência de ter registrado a violação do seu espaço aéreo por ela, ao alegar indiferença a uma dezena de avisos em um intervalo de menos de vinte segundos, ao passo que a Rússia contrapôs a versão, ao afirmar que seus radares haviam identificado aviões de procedência turca em território da Síria, por onde transitaria o supersônico abatido.

 

Outra interpretação acresceu que teriam sido mais de vinte comunicados em torno de cinco minutos à aeronave da Rússia. A iniciativa de abatê-lo teria decorrido da questão de não ter sido o primeiro trespasse em terras turcas, porém o incidente ocasionaria o cancelamento de uma viagem programada para aquele mesmo mês de novembro do ministro das relações exteriores, Sergey Lavrov, a Ancara.

 

De acordo com o Palácio Branco, a nacionalidade do avião, do momento dos alertas até a investida, era desconhecida pelo sistema de vigilância e chamou a atenção das forças armadas turcas a questão de o jato voar em uma conturbada zona fronteiriça, onde não há, no entanto, a existência de integrantes do Estado Islâmico.

 

O Kremlin, por seu turno, retrucou de forma incisiva, ao declarar que o inaudito ato teria consequências importantes para o relacionamento bilateral, notadamente no campo econômico, a despeito de atingir um membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

 

Com a inesperada vinda à confrontação da França e da Grã-Bretanha, por mais opaca que seja a atuação até o momento, os Estados Unidos terão de redefinir sua postura naquela vasta área.  Compartilhar no dia a dia os bombardeios com franceses e britânicos não encerrará o conflito outrora civil na Síria.

 

Se assim fosse, os norte-americanos teriam sido vitoriosos no Afeganistão, Iraque e Líbia. Ademais, o terror não será reduzido apenas com isso, uma vez que está presente em cidades da Europa e da América do Norte, onde iniciativas castrenses não poderão ser implementadas. Mesmo as polícias esbarram em muitas dificuldades se projetada ação em larga escala.

 

Os russos atacam com sua esquadrilha os adversários da ditadura, mas são as tropas sírias as encarregadas de desalojar os combatentes integristas de suas posições – de acordo com a imprensa internacional, a chamada oposição moderada, logo mais afeita a diretrizes político-econômicas do Ocidente, também tem sido objeto das investidas dos efetivos de al-Assad.

 

Cautelosa, a Rússia evita até o momento incursionar em cidades, a fim de que não ela precise passar pelo desgaste prévio dos Estados Unidos com a destruição de alvos civis, como hospitais, por exemplo.

 

Eis o problema da informal aliança norte-atlântica. Não dispor de contingentes locais com número similar de alistados da tirania baathista e com a mesma disposição para os combates de terra e não desejar enviar as suas próprias forçar armadas, ainda que mais bem treinadas e armadas.

 

 

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Virgílio Arraes é doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

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