Correio da Cidadania

2011, o primeiro ano de Dilma

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O início do ano que se encerra foi o primeiro da gestão de Dilma Rousseff como presidente da República. A herdeira de Lula e principal auxiliar do ex-presidente enfrentava em janeiro passado dois temores: o que se chamava de recrudescimento inflacionário e um processo de forte valorização do real.

 

O ano de 2010 havia terminado com um expressivo crescimento do PIB – acima de 7,5% - por conta de um conjunto de medidas que havia sido tomado pelo governo como resposta à retração econômica experimentada pelo país em 2009. O recuo do PIB naquele ano se deu por força da crise internacional e, também, pela demora do Banco Central, ainda em 2008, em reduzir a taxa básica de juros, o que somente ocorreu já em 2009.

 

A retração de 2009 e a adoção de medidas anticíclicas, junto com a liberação de recursos públicos no ano eleitoral de 2010, ajudam, portanto, o desempenho da economia brasileira, em termos do comportamento do PIB. Contudo, é neste contexto que sinais vermelhos se acendem para o novo governo. O desempenho das exportações e a entrada maciça de recursos externos no país contribuem para a valorização do real frente ao dólar. Se este é um processo que acaba por contribuir para atenuar as pressões inflacionárias, o forte crescimento das importações faz com que o saldo da balança comercial sofra igualmente uma indesejável redução.

 

E esse é um processo que não interessa ao governo. Com a desnacionalização do aparato produtivo brasileiro, com a abertura financeira que temos e com o processo de endividamento externo das empresas privadas, nossa conta de serviços é crescentemente deficitária. A obtenção de saldos comerciais, em um quadro como o descrito, torna-se essencial, como forma de administrar o balanço de pagamentos e sua dependência de atração de recursos pela conta de capital – o que apenas faz com que nossos passivos com o capital externo se elevem.

 

Frente a esse quadro, medidas macro-prudenciais, particularmente relacionadas à área fiscal e ao fluxo de capitais externos (embora de forma muito tímida) foram adotadas, ainda mesmo antes da posse de Dilma. Já em janeiro, o ano se inicia com fortes medidas de controle sobre o orçamento e um processo de alta da taxa Selic, além de uma organizada resistência dentro do Congresso para se evitar qualquer surpresa na definição do valor do salário mínimo, que acabou ficando em R$ 545,00, conforme vontade do Palácio do Planalto.

 

A palavra de ordem do novo governo era desacelerar o crescimento. Segundo Guido Mantega, o objetivo do governo seria diminuir o ritmo de crescimento da atividade econômica, sem, contudo, abortá-lo. A maior preocupação era, naquele momento, com os efeitos da sobrevalorização do real, suas conseqüências sobre o ritmo das importações e o temor com a inflação. Mesmo com o bom desempenho das exportações, tanto em termos de volume quanto em relação aos preços das commodities agrícolas e minerais, a velocidade com que as importações cresciam levava a projeções que apontavam o risco de voltarmos a ter um resultado negativo da balança comercial, em 2012. O que não deixa de ser uma ironia e um paradoxo: afinal, para um Brasil que em boa parte do século XX cresceu a taxas muito elevadas e de forma continuada, agora, em plena era de um suposto neodesenvolvimentismo, um crescimento de pouco mais de 7%, em seguida a uma retração econômica, como a observada em 2009, assusta as autoridades e as fazem traçar metas de desaceleração do crescimento...

 

Entretanto, o que de fato acabou por surpreender Dilma e sua equipe econômica foi, com certeza, o recrudescimento da crise internacional e especialmente a instabilidade econômica e financeira da Europa. Desse modo, depois de elevar a taxa básica de juros ao longo de todo o primeiro semestre, ao final de agosto o Banco Central se vê obrigado a inverter a mão e dar início a um processo de paulatina redução da taxa Selic.

 

De janeiro a julho, a taxa de juros básica foi elevada por cinco consecutivas vezes, chegando a 12,5% ao ano (em dezembro de 2010, a taxa Selic era de 10,75%). Agora, em dezembro, o Copom definiu a taxa básica em 11% ao ano, em uma terceira redução consecutiva. A preocupação se volta, novamente, para o ritmo da atividade econômica. Porém, em um sentido inverso daquele manifestado no início do ano. No terceiro trimestre do ano, a economia ficou estagnada em relação ao desempenho do segundo trimestre. Na comparação com o mesmo trimestre do ano passado, o crescimento foi de 2,1%, muito abaixo de países como a Índia (6,9%) ou a China (9,1%).

 

Fica claro, desse modo, que a administração macroeconômica continua refém do curto-prazo e tem como objetivo a busca de condições para a manutenção do modelo em curso, baseado no tripé câmbio flutuante/ metas de inflação/ superávit fiscal.

 

A aposta no mercado externo para o fechamento das nossas contas externas depende cada vez mais da dinâmica e da demanda asiática, e chinesa, por nossas commodities agro-minerais. O endividamento em títulos da União - em dólares, pelas grandes empresas, e em reais, pelas famílias - continua em curso. E, é bom lembrar, nem a inflação, nem a sobrevalorização do real se transformaram nos bichos-papão apontados inicialmente.

 

No plano produtivo, o que voltamos a destacar é a forma como continuamos a assistir a entrada do capital estrangeiro e seu predomínio nos mais diferentes setores da economia, particularmente nas aquisições de terras, como reserva de valor ou em investimentos vinculados à produção de etanol e à atividade agropecuária voltada à exportação.

 

Pela intensa badalação que a mídia dominante, de dentro e de fora do país, assim como círculos de pressão e formação de opinião vêm fazendo em relação ao nosso país, tudo indica que o Brasil é a estrela econômica da vez. Ao menos durante esse ciclo, onde nosso país estará sediando eventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Da mesma forma que, em passado não muito recente, países como o México e a Argentina já foram apresentados como sucessos pela chamada comunidade financeira internacional.

 

Espero apenas que o nosso destino não nos seja tão cruel.

 

Paulo Passarinho é economista e membro do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro.

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