Petrobrás: esconder o lucro serve a que propósito?

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Paulo Metri
14/04/2016

 

 

 

 

 

A Petrobrás apresentou seu balanço de 2015 há pouco tempo. Trata-se de um documento de 125 páginas com inúmeras informações, escrito, é claro, com linguagem específica de contabilidade. Entidades empresariais, como fundos de investimentos e bancos, se utilizam das suas áreas de análise de balanços. Entidades sindicais, infelizmente com menos recursos, ficam sem conhecer a fundo os balanços.

 

Com coragem, pois não sou contador, faço alguns comentários sobre este balanço. Disponho a meu favor, para me encorajar, o fato que a cobertura da imprensa foi tendenciosa, passível de ser constatada até por um principiante em análise de balanços.

 

Os grandes jornais do Rio e de São Paulo noticiaram em primeira página o prejuízo mostrado no balanço de 2015 da Petrobrás. Os jornais televisivos que assisti também ressaltaram esta notícia. Assim, a população ficou com a impressão que o ano de 2015 foi péssimo para a empresa. Pessoas, que assistem frequentemente aos jornais televisivos, onde são transmitidas notícias diárias sobre os roubos na empresa, devem ter concluído erradamente: “estes ladrões da Petrobrás causaram enorme prejuízo a ela!

 

No entanto, se for lido o introito dos resultados consolidados do quarto trimestre de 2015 da Petrobrás, documento publicado junto com o balanço anual da empresa, os dados mostrados a seguir podem ser observados.

 

(1)             Houve uma redução de R$ 8,9 bilhões no prejuízo operacional em 2015, pois ele foi de R$ 21,3 bilhões em 2014 e, em 2015, foi de R$ 12,3 bilhões.

 

(2)             O “earnings before interest, taxes, depreciation and amortization” (EBITDA) de R$ 73,8 bilhões em 2015 é 25% superior ao de 2014.

 

(3)             O fluxo de caixa livre positivo de R$ 15,6 bilhões em 2015 é superior ao fluxo de caixa livre negativo de R$ 19,5 bilhões em 2014.

 

(4)             O endividamento líquido foi de US$ 100,3 bilhões em 31.12.2015, tendo diminuído 5% em relação ao de 31.12.2014.

 

(5)             Houve aumento do prazo médio da dívida de 6,10 anos em 31.12.2014 para 7,14 anos em 31.12.2015.

 

(6)             Os investimentos em 2015 são de R$ 76,3 bilhões, 12% inferiores aos de 2014, significando que se conseguiu postergar investimentos.

 

(7)             Houve um acréscimo de 4% na produção de petróleo e gás natural da Petrobrás (no Brasil e no exterior) em 2015 quando comparado com 2014.

 

(8)             Houve menores gastos com a importação de petróleo e derivados.

 

(9)             Como o valor da produção diminuiu, o pagamento de participações governamentais diminuiu também.

 

(10)        Com o desempenho fraco da economia, houve uma redução de 9% na demanda de derivados no mercado doméstico, liberando mais petróleo para ser exportado.

 

Todas estas notícias são positivas, mas não foram divulgadas e, provavelmente, poucas pessoas as conhecem. As justificativas do por que tais índices não foram ainda melhores também foram escondidas pela mídia.

 

Primeiramente, o valor do barril caiu muito no último ano, o que levou a direção da empresa a considerar, após avaliações, alguns ativos e investimentos como não mais atrativos, o que teve como consequência a baixa dos mesmos no balanço, contribuindo para a formação do prejuízo.

 

O Brasil e a Petrobrás foram rebaixados nos seus graus de investimento pelas agências de classificação de risco, o que resultou em maior pagamento de juros pela Petrobrás, na rolagem das dívidas. Aliás, empresas petrolíferas terem suas notas de crédito rebaixadas virou moda, pois a Moody’s rebaixou as da Shell, Total e Chevron. Também a valorização do dólar em relação ao real resultou no acréscimo da dívida da Petrobrás em moeda estrangeira, quando expressa em reais.

 

Assim, a mídia só soube repetir à exaustão que o prejuízo da Petrobrás em 2015 foi de R$ 34,8 bilhões. Esta afirmação, além de ser compreendida pelo leigo como relacionada à corrupção na empresa, leva muitos, incluindo não só leigos, a concluir que há necessidade de vender ativos para poder salvar a empresa.

 

Acho meritório o interesse da diretoria da empresa em fazer o balanço ser o mais correto possível, sem esconder nada. Entretanto, discordo da diretoria com relação ao método utilizado para fazer a avaliação do que ainda é atrativo para a empresa. Foram feitos novos Estudos de Viabilidade Técnica e Econômica (EVTE), utilizando para o preço do barril valor recente, que é bem baixo. Sabe-se que o fluxo de caixa do EVTE é construído a valores constantes, o que significa, em outras palavras, que a atuação da inflação será a mesma para todos os itens que compõem o EVTE.

 

Para um empreendimento de petróleo, que ainda tem uma vida útil de 15, 20 ou 25 anos, não pode ser tomado como preço do barril em todo o período o baixo valor atual corrigido pela inflação média do país, pois necessariamente este preço subirá mais que a inflação. Portanto, não é de se espantar que, por esta metodologia, muitos empreendimentos resultaram em ser não atrativos. Dever-se-ia estimar um valor médio futuro do barril ou considerar valores diferentes ao longo do tempo e colocar estes valores no fluxo de caixa.

 

Como última observação, a Petrobrás tem 40 bilhões de barris descobertos por ela e na totalidade seus, que ainda não foram contabilizados. É certo que precisam estar certificados, inclusive por certificadora estrangeira, para poderem fazer parte do patrimônio da empresa. Se estes 40 bilhões de barris fossem contabilizados, o balanço de 2015 daria um lucro espetacular. Por isso, esta demora na certificação é conveniente para se atingir objetivos antinacionais.

 

Assim, esconder o lucro serve à diretoria da empresa que quer vender ativos no momento atual, ou seja, a preço de banana. Serve a quem quer gravar na cabeça dos brasileiros que a esquerda só trouxe prejuízos para a Petrobrás. Serve, também, para as petrolíferas estrangeiras entrarem no Pré-Sal com o argumento de que a Petrobrás está sem caixa e dando prejuízos. Assim, elas concluem: “há a necessidade de ser aceito nosso oferecimento de apoio de capital”.

 

 

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Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia e colunista do Correio da Cidadania.

Blog do autor: http://www.paulometri.blogspot.com.br

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