Correio da Cidadania

Por quem os sinos dobram?

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Um tema parece ultrapassado, mas seu debate é recorrente. Trata-se de o governo brasileiro manter os preços, basicamente, do diesel e da gasolina abaixo do preço internacional para ajudar a conter a inflação, acarretando uma redução no lucro da Petrobras. Já alerto para o fato de que esta medida do governo não acarreta prejuízo nas contas da Petrobras. Ela acarreta a diminuição da quantidade de lucro gerado pela empresa, mas esta continua sendo lucrativa.

 

Sempre que você tiver dúvida se determinada medida é atrativa para a sociedade, deve procurar descobrir como se posicionam os neoliberais. Eles estão sempre do lado contrário da sociedade e, neste caso, todos os neoliberais da mídia brasileira advogam que o governo deveria seguir os preços internacionais e não deveria exigir da Petrobras a redução da sua lucratividade. Não pensem que eles tomam tal posição porque amam a empresa. Estão, simplesmente, defendendo a alta remuneração dos grandes acionistas da Petrobras, muitos dos quais, graças a FHC, estão no exterior. Também, os neoliberais não gostam tanto do governo Dilma e, podendo criticá-lo, a oportunidade não é perdida.

 

Mas, há uma novidade, porque pessoas de bem, comprometidas com a sociedade, também advogam que o preço do diesel e o da gasolina devem acompanhar os valores internacionais. Creio que estas pessoas de bem assim advogam sem estarem conscientes do que isto representa.

 

Contudo, é ótimo que o debate ocorra, porque, se não houver manipulação de informações, a sociedade irá descobrir a grandiosidade do lucro da atividade petrolífera, principalmente se for de uma empresa competente em descobrir petróleo, como a Petrobras. O doce problema, que aparece, logo a seguir, é: o que fazer com este lucro extraordinário?

 

Em um país que tem respeito pelo seu povo, será escolhido o modelo de produção petrolífera que garante o máximo benefício social. Com este objetivo em mente, uma empresa pública pode ser chamada, pelo governo democraticamente eleito, a exercer uma política pública de grande impacto social, desde que a empresa não fique tolhida de cumprir com sua obrigação de pagamento, ao menos dos dividendos mínimos para os acionistas.

 

Foi exatamente isto que aconteceu. A contenção da inflação é uma política pública de enorme impacto social. A Petrobras pagou aos acionistas dividendos acima dos valores mínimos estabelecidos por lei. A Petrobras não pagou aos acionistas um adicional de dividendos, que corresponde ao superlucro da sua atividade, porque este valor estava sendo utilizado para conter a inflação, que penaliza prioritariamente as camadas mais pobres da população. E quem deve ser priorizado: os acionistas ou a população?

 

Só faço um reparo na decisão do governo. O subsídio ao diesel é perfeito porque se trata do derivado utilizado no transporte de cargas entre municípios e no transporte coletivo de passageiros. Então, o impacto social de seu aumento seria grande. No entanto, o subsídio da gasolina significa um incentivo ao transporte individual para uma parcela da sociedade que tem razoável poder de compra. O transporte individual engarrafa as cidades e contribui para o aumento da poluição da atmosfera. Se for necessária a contenção do preço de outro derivado para segurar a inflação, eu sugiro o gás de botijão, cujo consumo popular é enorme. Inclusive, em regiões próximas à zona rural, o incentivo do seu uso para a cocção de alimentos, que é seu principal uso, significa a redução do desmatamento.

 

Hoje, tenho medo quando ouço argumentos do tipo: “a Petrobras está precisando de uma gestão eficiente”, porque, certamente, estão querendo manipular sua compreensão dos fatos. Nesta hora, deve-se perguntar: eficiente para quem? Para o povo ou para os acionistas? Estes empedernidos defensores da Petrobras como empresa que visa o máximo lucro nunca reclamaram da política pública de compras locais. Trata-se de uma política que resulta na compra de plataformas, no mínimo, 15% mais caras que aquelas produzidas em Cingapura. Neste instante, argumentam que as compras locais resultam em geração de mais empregos e renda no país. Entretanto, este grandioso impacto da política pública das compras locais é maior que o impacto da contenção da inflação?

 

A rentabilidade da atividade petrolífera é tão grande que Hugo Chávez destinou este lucro excepcional da petroleira venezuelana PDVSA para subsidiar diretamente programas humanitários de postos de saúde, escolas, atendimento aos mais carentes, o cooperativismo e outros. Desta forma, ele colocou a PDVSA para ser o instrumento principal das ações públicas da sua administração. Não recomendo ação análoga com relação à Petrobras porque seria a negação de toda a administração pública brasileira.

 

Neste ponto da discussão, sempre aparece alguém dizendo: “Mas a Petrobras tem compromissos financeiros com os desenvolvimentos dos novos campos e precisa destes recursos”. Esta frase é verdadeira, porém é necessário analisá-la. Os governos FHC, Lula e Dilma, através da Agência Nacional do Petróleo (ANP), colocaram em leilão mais de 1.000 blocos do território nacional para extração do nosso petróleo. Impuseram esta oferta absurda de blocos sem existir uma justificativa social, pois o abastecimento do país estava garantido por décadas. Para minimizar a futura evasão desta fonte de energia, a Petrobras arrematou muitos blocos e, assim, assumiu os citados compromissos financeiros. Contudo, o problema pode ser facilmente resolvido hoje, através de uma simples ordem do governo para a ANP, para esta não exigir da Petrobras a pressa para os desenvolvimentos dos vários campos, que foi colocada pela Agência nos contratos. Desta forma, o novo fluxo de caixa da empresa irá requerer menos recursos para investimentos.

 

Na cantilena neoliberal, ouve-se muito que os países devem procurar suas vocações naturais para criar vantagens comparativas em relação a outros países. Então, como temos petróleo com o barril custando bem menos que US$100, que é o preço internacional do barril, o Brasil pode injetar na sua economia derivados abaixo do preço internacional, sem trazer prejuízo para a estatal, para colocar todos os produtos brasileiros que usam derivados na sua produção com esta vantagem comparativa.

 

Os que lamentam a utilização da Petrobras para conter a inflação são os que querem os lucros dela, os chamados “rentistas”, os que querem derrubar a presidente Dilma e o PT, e as petrolíferas estrangeiras, que não gostam da empresa atrapalhando seus planos. Contudo, gostariam de comprá-la em um processo de privatização. Fico a cavalheiro para falar sobre a presidente e o PT porque canso de criticar, neste espaço, posições deles, que julgo erradas. Mas, no uso da Petrobras para conter a inflação, eles estão certos.

 

Os sinos dobram por todos nós. Morremos. Eles conseguiram. Minaram nossa sociedade com seus seguidores, principalmente na mídia comercial, e esta seguidamente nos doutrinou, de forma que absorvemos a maneira de pensar do dominador e passamos a tomar decisões que nos penalizam. Morremos como seres livres, com possibilidade de crescimento e realização.

 

Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia e colunista do Correio da Cidadania.

Blog do autor: http://www.paulometri.blogspot.com.br/

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