Julho decisivo no Iraque

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Luiz Eça
13/06/2008

 

No mês de julho, Bush pretende ganhar duas paradas fundamentais no Iraque: a aprovação da nova lei do petróleo e do acordo estratégico para permanência das tropas americanas.

 

Desde o começo do ano passado que ele tenta enfiar goela abaixo do governo e do parlamento iraquiano uma lei que acaba com o monopólio estatal do petróleo, privatizando sua exploração através dos contratos PSA (Production Sharing Agreement). Esse tipo de contrato é tão desfavorável que nenhum dos grandes produtores do Oriente Médio os aceita, somente países à beira da bancarrota. Como a Rússia de Ieltsin , em 1999, que firmou contratos PSA com a Shell para exploração do petróleo nas ilhas Sacalinas. Situação que durou até 2006, quando Putin forçou a multi anglo-holandesa a aceitar a estatal russa Gazpron como sócia no empreendimento.

 

Para tranqüilizar mais os futuros investidores, a nova lei estabelece que qualquer controvérsia entre o governo ou particulares iraquianos e as multinacionais seria julgado por tribunais internacionais, não pela justiça do país. O que vale dizer: leis estrangeiras seriam aplicadas no Iraque.

 

Bush deu prazo até 31 de julho para serem vencidas as resistências de políticos do governo e da oposição e do poderoso sindicato petrolífero. E a nova lei ser aprovada.

 

Até essa data ele também exige que seja assinado um acordo que garanta a ocupação militar americana por longo prazo. O pretexto é que o mandato da ONU expira em fins de 2008 e seria necessário legalizar a permanência das tropas estrangeiras.

 

As negociações começaram secretamente. Mas já se conhecem as cláusulas principais apresentadas pelos representantes americanos. Para defender a democracia e o governo do Iraque, algumas tropas continuariam aquarteladas em 58 bases, com uma série de direitos: prender quem os americanos quisessem, lançar operações sem consultar o governo iraquiano e controlar o espaço aéreo. Os soldados teriam imunidade legal – não estariam sujeitos às leis do país –, a qual se estenderia aos seguranças civis contratados para proteger embaixadas e comboios, entre outros serviços. Portanto, o exército americano seria um poder paralelo. E a soberania do Iraque iria para o espaço.

 

Em troca da proteção militar de Washington, o governo do Iraque se comprometeria a oferecer vantagens especiais aos investidores americanos, especialmente na área do petróleo.

 

Reações negativas partiram de todos os lados, até mesmo de membros do governo xiita, até agora aliado ‘malgré lui’ às forças americanas.

 

Para Sami al-Askari, político próximo ao primeiro ministro Maliki, "os americanos estão fazendo exigências que levariam à colonização do Iraque".

 

Jalal al-Din al-Saghir, dirigente do Supremo Conselho Islâmico, declara: "Rejeitamos o acordo desde o início. Ele representaria uma nova ocupação, assinada pelo Iraque".

 

Motaqa Al-Sadr, o principal líder da oposição, conclamou a população a sair às ruas em protesto durante todas as sextas-feiras. Isso já aconteceu em Bagdá, com dezenas de milhares de participantes.

O mais popular clérigo do Iraque, o grande aiatolá Ali al-Sistani expressou sua preocupação quanto à perspectiva da continuidade da presença militar americana no país. Pesquisa realizada em fevereiro mostrou que 73% da população querem a retirada das tropas.

 

Mas Bush não pretende desistir. Com a nova lei do petróleo, ele garantirá para os Estados Unidos o controle das terceiras reservas mundiais desse combustível e, para suas empresas, a exploração e os lucros de suas fabulosas jazidas.

 

Com o acordo militar aprovado, tropas americanas ficarão no Iraque prontas para impedir qualquer tentativa de alteração da lei do petróleo e colocar na linha governos que eventualmente ensaiem aproximações com o Irã.

 

Além disso, sendo Obama eleito, ficaria de mãos atadas, não podendo cumprir sua promessa de retirada das tropas sem ter de violar um acordo entre nações.

 

Diante das reações dos políticos iraquianos, Bush ordenou que se moderassem as exigências americanas. Contenta-se com menos bases; em vez das 58 antes solicitadas, bastariam 30. Na verdade, 30 são as bases importantes, as outras são meros quartéis provisórios. Fala em rever a imunidade das dezenas de milhares de seguranças, mas isso seria difícil. As forças americanas ficaram dependentes desse verdadeiro exército de mercenários, necessitando deles para exercerem diversas funções.

 

Embora Maliki e a maioria dos seus ministros sejam contra um acordo que estabeleça o exército americano no Iraque por longo tempo, a verdade é que o governo é fraco. Sem o apoio militar de Washington, certamente cairia. As maiores chances são de que eles acabem assinando.

 

Mais difícil será que a idéia passe pelo parlamento, onde diversas tendências estão representadas, muitas sensíveis às posições do povo, notoriamente favorável à retirada das tropas estrangeiras.

 

Espera-se também que o Senado americano proteste. Pela constituição americana, tratados devem ser submetidos a ele. Por isso mesmo, Bush, espertamente, usa o termo "acordo estratégico", o que permitiria cuidar do assunto unilateralmente.

 

Julho é o mês em que Bush quer ver suas iniciativas aprovadas. É quando ele pretende pavonear-se como vencedor da guerra do Iraque, já que teria conquistado seu petróleo e uma posição dominante no país.

Lutando contra estão o povo, os sindicatos iraquianos petrolíferos e uma maioria instável no parlamento, além dos senadores do Partido Democrata e Barack Obama, que desejam viabilizar a retirada do exército.

 

O resultado poderá representar um passo importante para o Iraque tornar-se um país livre. Ou para condená-lo à condição colonial.

 

Luiz Eça é jornalista.

 

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