Correio da Cidadania

O martírio de Gaza prossegue

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Ao menos 25 palestinos mortos após três dias de ataques entre Israel e Gaza  – Mundo – CartaCapital
Com apoio do notório fascista, Itamar Bem Gvir, ministro da Segurança Nacional, Israel prepara-se para tomar terras do istmo para ali construir um novo assentamento (124 news, 21/3/2023).

Para o regime sionista, não há novidade nesse tipo de ação: já arrebataram da Síria as fazendas de Cheeba e as colinas de Golã e violaram disposição da ONU, ocupando Jerusalém Oriental pela força (o status de Jerusalém deveria ser decidido por negociações entre judeus e árabes).
Há fortes suspeitas de que os partidos de extrema-direita, hoje aboletados no poder por Netanyahu, planejam recuperar Gaza para Israel.

A seguinte frase do ministro das Finanças e administrador da Cisjordânia ocupada, Bezelel Smotrich, alimenta esta sombria previsão: “chegará o momento em que não haverá uma escolha senão reconquistar Gaza (The Guardian, 14/5/2023)”.

Enquanto seu lobo não vem, Gaza sofre mensalmente, desde 2007, brutais ataques militares, sendo que em 2004, 2012, 2014 e 2021 o exército sionista penetrou atirando em cidades do estreito, além de promover sucessivos bombardeios aéreos, disparos de tanques e lançamentos de mísseis, o que foi caracterizado como autênticas guerras.

Nas guerras de Gaza, morreram cerca de 5.460 palestinos, sendo a maioria deles civis, de acordo com a ONU.

Em 2007, com a vitória do seu inimigo, o Hamas, nas eleições de Gaza, Telavive decretou o bloqueio da região. Nada, nem ninguém poderia entrar ou sair sem a autorização do governo de Israel, até mesmo produtos destinados a salvar vidas, como medicamentos e equipamentos para exames de saúde.

A lista de itens proibidos de serem importados, sob a desculpa de que poderiam ser usados na produção de armas, é extensa e inclui até materiais de construção.

Nos 16 anos de cerco, sob o governo do Hamas, Gaza foi selvagemente bombardeada, com a destruição de usinas de energia, redes de saneamento básico, redes de distribuição de água, quarteirões de imóveis civis, residências, oficinas, escritórios, escolas e hospitais.

Com 2 milhões de pessoas sujeitas a terríveis condições de vida, a ONU previu que Gaza se tornaria inabitável em 2020.

De fato, nesse prazo, a população sobrevivia em condições subumanas, com 50% abaixo da linha da pobreza, 60% de desempregados e 80% dependendo da ajuda internacional para não morrer.

Mas Gaza não se rende. Vem respondendo a provocações israelenses, lançando centenas, mesmo milhares de mísseis contra o país inimigo.

É verdade que, com eficiência mínima, diante dos avançados sistemas antimísseis israelenses e à qualidade inferior dos equipamentos militares dos movimentos islâmicos da região.

Foi o que aconteceu no último confronto com Israel, entre 9 e 13 de maio deste ano, após a morte de Khader Adnam, militante destacado do Jihad Islâmico.

Encerrado numa prisão israelense, sem ter sequer sido acusado de um único ato de violência, ele morreu depois de 87 dias de greve de fome.

Segundo fontes palestinas, autoridades de Israel negaram-se a transferir Adnam para um hospital, apesar de prevenidas de que as más condições de saúde do prisioneiro ameaçavam sua vida seriamente.

Esta acusação não foi levada em conta por Israel e aliados e a maioria da grande imprensa internacional. Estavam certos?

Na realidade, a explicação dos jihadistas se non è vero é molto ben trovato. As prisões estão na alçada de Ben Gvir, o fascista ministro da Segurança. Ele já combateu a suposta “prodigalidade” das instalações carcerárias israelenses e logo após sua posse tratou de tornar mais sofrida a vida dos prisioneiros políticos palestinos.

Considerando Israel culpado da morte do seu miliciano, o Jihad Islâmico lançou de Gaza, no primeiro dia do conflito, mais de 104 foguetes contra Israel que respondeu com menos mísseis, mas de letalidade muitas vezes maior: morreram 13 civis de Gaza e apenas 1 em Israel.

Quase todos os foguetes de Gaza foram derrubados pelo avançado sistema antimísseis Iron Dome. Os poucos que venceram essa barreira caíram em áreas despovoadas, algumas até no próprio território de Gaza.

Há sérias dúvidas quanto à estratégia palestina de retaliar violências israelenses, lançando foguete de mínima eficácia. Repetida nos 16 anos de lutas após o início do bloqueio, teve como resultado a morte de 5.460 civis e milicianos dos movimentos de Gaza, contra um número irrisório de vítimas israelenses.

As principais explicações dessa aparentemente absurda estratégia são três:

1 - É uma forma de mostrar ao povo palestino que a luta contra o governo sionista está viva, visando manter ativa sua indignação contra o poder israelense;

2 - Os ataques de foguetes a Israel custam caro para o governo de Telavive: 180 mil dólares por míssil interceptado pelo Iron Dome. E ele gasta quase 1 milhão de dólares quando o míssil é interceptado pelo sistema de defesa antiaérea David Slingshodet, de produção local;

3 - Os periódicos ataques das facções de Gaza, que dispõem agora de alguns mísseis capazes de atingir Telavive, obrigam Israel a manter complexas e variadas estruturas de segurança, sobrecarregando o orçamento nacional.

Seja como for, a estratégia dos palestinos forçaria Israel a dispender enormes gastos, além de causar stress generalizado nas populações de áreas próximas de Gaza, as mais atingidas, e perturbar o andamento normal dos negócios em numerosas cidades do país, muitas delas agora ao acesso dos contragolpes dos adversários, desferidos com seus novos mísseis.

O objetivo é levar o país de Netanyahu a sentir-se esgotado por esses problemas, convencendo-o a conceder aos palestinos um Estado independente ou, ao menos, a retirar as forças de ocupação da Cisjordânia e a paralisar a expansão dos assentamentos, que atualmente segue a todo vapor. Por enquanto, nada disso aconteceu.

No fim do primeiro dia do último choque militar em Gaza, Netanyahu ordenou uma breve pausa nos ataques e reuniu seus principais parças para decidir o que fazer.

Nessa ocasião, o governo de Telavive estava sofrendo boicote por iniciativa de Ben Gvir. Esse líder do principal partido fascista (o Lar Judeu) estava descontente com a orientação às operações militares israelenses, que considerava branda.

Por isso, havia retirado seus parlamentares do bloco de apoio ao governo Netanyahu no Congresso. Perdendo os votos desse grupo, o primeiro-ministro ficaria sem maioria e teria de se demitir.

Talvez sob a ameaça desse perigoso lance, Netanyahu resolveu maximizar os ataques e concentrá-los em chefes do Jihad Islâmico (o Hamas foi poupado por se abster de agredir).

Assim saciaram a sede de sangue do feroz Ben Gvir, que se apressou a voltar ao ninho do governo, explicando que a decisão de Bibi representava a volta dos “assassinatos seletivos”, cuja maior letalidade era aplaudida pelo fascismo sionista.

Adotados durante a primeira intifada, os “assassinatos seletivos” (targeted killings) foram abandonados posteriormente depois de pressões da comunidade internacional.

Eles haviam gerado grande indignação em toda a parte pela violação de direitos humanos envolvida. Personalidades e entidades de destaque mundial fizeram erguer suas vozes em protesto. Acrescentamos a seguir alguns exemplos.

O general Colin Powell, secretário de Estado no governo George W. Bush, registrou sua oposição aos assassinatos coletivos e o departamento de Estado dos EUA insistiu para que Israel os interrompesse de vez.

Kofi Annan, ex-secretário geral da ONU, condenou esses assassinatos, considerando-os “contrários à lei internacional”.

São “assassinatos ilegais”, afirmou Jack Straw, que foi secretário do Exterior do governo Tony Blair, do Reino Unido, que os qualificou como “execuções sumárias que ferem os direitos humanos”.

Conforme a Corte Internacional de Justiça, os países não podem nunca fazer de civis o objeto dos seus ataques (artigos 51 e 52 do Primeiro Protocolo),

Nos assassinatos seletivos, restaurados pelo governo Netanyahu nos 5 dias do último ataque a Gaza, os aviões israelenses buscavam matar chefes jihadistas, lançando mísseis de madrugada em suas próprias residências, matando suas esposas e filhos, enquanto dormiam.

Além de priorizar o morticínio de jihadistas importantes, os aviões e tanques de guerra israelenses alvejaram de forma devastadora casas, apartamentos e, campos de refugiados, deixando 2.516 palestinos sem teto, em Gaza.

Os palestinos, por sua vez, lançaram muitas centenas de mísseis, quase todos de alcance curto e precária tecnologia, a não ser uns poucos que chegaram a explodir em Telavive.

A desproporção entre a qualidade dos mísseis israelenses e seus sistemas antiaéreos e o baixo nível dos mísseis jihadistas se evidencia pela diferença entre os o total das perdas humanas das duas partes: enquanto morreram 34 palestinos (sendo 7 crianças e 4 mulheres), os mortos em Israel não passaram de 2.

Por fim, Israel e a Jihad islâmica chegaram a um cessar-fogo. Até quando?

A guerra contra Gaza está longe de acabar. Em Israel, estima-se que deverá explodir nos próximos 12 meses. Será a quinta guerra de Gaza em larga escala, provavelmente a mais terrível de todas.

Avigdor Lieberman, um dos mais ardentes falcões israelenses, fez declarações bastante reveladoras: “precisamos desferir um ataque duro e desproporcional no Hamas – destruindo completamente sua vontade de continuar a lutar contra nós e sua crença de que poderiam jamais nós enfrentar (Palestine Chronicle, /6/2023)”.

E concluiu: “o próximo confronto em Gaza precisa ser o final”. E Joe Biden repetirá que os israelenses têm o direito de se defender.

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Luiz Eça

Começou sua vida profissional como jornalista e redator de propaganda. Escreve sobre política internacional.

Luiz Eça
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