Correio da Cidadania

Anulação do acordo nuclear ao som de tambores de guerra

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Em mais uma apresentação teatral, Netanyahu denunciou segredos supostamente tenebrosos dos iranianos.

Na calada da noite, eles estariam trabalhando num programa de desenvolvimento de armas nucleares, tendo já superado muitas etapas, conforme provas que gráficos gigantescos mostravam.

Foi a clássica história da montanha parindo um rato. Especialistas em várias partes do mundo notaram que as pesquisas reveladas datavam de antes de 2009 e já eram conhecidas de todos.

Novas provas, segundo o primeiro-ministro de Israel, ainda seriam compiladas pela análise de uns 55 mil documentos guardados a sete chaves pela segurança iraniana, as quais o Mossad teria furtado.

Só alguns radicais de direita norte-americanos acreditaram. Apesar do destaque dado pela grande mídia às revelações do líder de Israel, o resto do mundo não se impressionou.

O fracasso foi tão grande que o perfomer israelense só não levou vaias por estar falando em Telavive, para um auditório educado.

Segundo a Reuters, experts em inteligência e diplomatas europeus afirmaram que ele não apresentou uma smoking gun (prova incontestável) sobre violações do acordo nuclear pelo Irã,

Logo em seguida, a AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) lançou um comunicado, dizendo que as alegações israelenses não eram críveis, pois as atividades nucleares do Irã acabaram em 2009.

A AIEA possui um nível de acesso ao Irã muito superior ao de quaisquer outros acordos de salvaguardas do mundo. Portanto, a ideia de que os iranianos estariam tocando em segredo um programa nuclear militar pertence ao reino da fantasia.

Outros países contestaram Netanyahu, deixaram passar em branco seu rumoroso ato teatral ou, polidamente, falaram que duvidavam, mas não se furtariam a estudar as denúncias.

Apesar dessas declarações polidas, a União Europeia continua firme em sua posição de não mexer no Acordo Nuclear com o Irã. É verdade que a Alemanha, a França e o Reino Unido, liderados pelo presidente Macron, continuaram insistindo em concessões contra o Irã, pensando assim poder convencer The Donald a não retirar os EUA do Acordo Nuclear.

Na sua fraternal visita a Trump, Macron levou os “três pilares” da paz no Oriente Médio, aprovados pelos “três grandes” europeus.

Seriam: 1) o Acordo Nuclear com o Irã; 2) o controle da indústria iraniana de mísseis balísticos; 3) a retração da expansão político-militar do Irã no Oriente Médio.

Pensava com eles salvar o Acordo Nuclear (ainda que a dano de Teerã, que não aceita nada disso).

Voltou com mais um quarto pilar, este de autoria de Trump: estender ad aeternum a vigência do acordo, impedindo que o Irã jamais possa produzir uma arma nuclear.

Nem assim The Donald mudou de ideia. No primeiro momento, ele e os seus áulicos gostaram da fala de Netanyahu.

É verdade que, diante de tantas inconsistências, a Casa Branca, sutilmente moderou seu entusiástico apoio.

Primeiro, o governo de Washington afirmou que o líder de Israel provara que o Irã TEM um programa nuclear robusto. Logo depois, mudou o TEM para TEVE. Depois das manifestações da ONU e de reputados experts, não dava para negar que as perigosas atividades nucleares do Irã acabaram de fato em 2009. Depois desse ano, nunca mais.

Nessa mudança, talvez Trump tenha sido influenciado por pesquisa da Morning Colsult, sobre o Acordo Nuclear com o Irã: 66% dos estadunidenses entrevistados manifestaram-se a favor e só 26% queriam dar fim nele.

Entre os democratas, 68% apoiam o acordo, enquanto 51% dos independentes têm a mesma opinião. Até a maioria dos republicanos é contra a rejeição, por uma maioria de 46% a 42%.

Apesar de o presidente norte-americano prezar o desejo de seu povo, pois isso significa votos, ele ainda está preso a interesses de Israel e aos do seu próprio grupo político.

Os EUA devem renegar seu compromisso e dar os primeiros passos para retirar-se do Acordo Nuclear com o Irã.

A denúncia de Netanyahu, embora totalmente desacreditada, servirá provavelmente de pretexto.

As consequências previsíveis são extremamente graves. O Irã acabará saindo do acordo. Se com a presença dos EUA, as grandes corporações internacionais pouco investiam no Irã temendo sanções de Washington, muito pior será com a retirada dos norte-americanos. Punições dos EUA a empresas que ousarem negociar com o Irã parecem inevitáveis.

Ficaria provado que do Ocidente nada de bom vem para o Irã, sacrificando a ideia da importância das boas relações internacionais, defendida pelo presidente Rouhani.

Os hard-liners de Teerã tomariam o poder, ou através de golpe de Estado ou de pressão parlamentar que reduziriam substancialmente o poder do moderado Rouhani, em favor do colérico supremo líder Khamenei. Com isso, vão para o espaço os planos de liberalização, proteção aos direitos humanos e modernização do Irã, além de tudo que já foi conseguido nessas áreas.

Com sua saída do acordo, o Irã retoma a toda suas atividades nucleares – para produção de energia e usos medicinais – ou mesmo vai adiante e parte para fabricar armamento nuclear.

Aí, Israel vê a oportunidade para atacar seu inimigo.

Sucede que o esperto Netanyahu quer também proteger seu país da inevitável retaliação iraniana. Reduzir ao máximo suas perdas tanto humanas quanto materiais. É de se crer que ele não pretende contentar-se com armamentos estadunidenses e participação secundária nos combates diretos.

Possivelmente, o primeiro-ministro israelense vai pedir a The Donald um papel de protagonista para suas forças militares na guerra aos aiatolás.

Talvez, iniciando as hostilidades com um fulminante ataque desferido por mísseis partindo da frota norte-americana, ora navegando no Golfo Pérsico e por nuvens de bombardeiros de Israel e dos EUA. O que destruiria os principais objetivos militares do Irã.

Ao mesmo tempo, Netanyahu poderia vibrar um golpe decisivo nas forças do Hizbollah (parte delas comprometidas na Síria e no Irã), novamente invadindo e arrasando o Líbano, onde o movimento xiita está instalado.

Como o povo dos Estados Unidos é maciçamente contra guerras, que causam muitas mortes nos seus filhos, Trump pensa numa guerra por procuração. Onde seu apoio militar a Israel seria limitado. Lançamento de grandes quantidades de mísseis balísticos, sim, mas nada de tropas on the ground, com sensíveis perdas dos our boys, o que provocaria sensíveis perdas de votos nas próximas eleições presidenciais. O papel principal ele reserva às forças de Israel.

Como efeito colateral de um conflito com Teerã, teríamos a retirada das tropas iranianas e do Hizbollah da guerra da Síria, a fim de defenderem o Irã.

Sem elas, o regime de Assad dependeria ainda mais da ajuda militar russa para se manter vivo.

Desta maneira, em consequência do abandono norte-americano do acordo nuclear, o Irã, a Síria e o Hizbollah podem até  acabar mudando de lado.
E a Rússia perderia, de uma só vez, todos os seus aliados no Oriente Médio.

Citando o grande Garrincha: “já combinaram tudo para os russos?”
Certamente, Moscou não irá assistir de braços cruzados os EUA e Israel destruírem o Irã e deixarem na lona tanto o regime de Assad quanto o Hizbollah.

Pode-se confiar num grande aumento das atividades bélicas russas em todos os vários cenários dessas guerras que se desenham. Os riscos de combates isolados entre russos e norte-americanos seriam dos mais sérios.

Da prudência do presidente Putin e dos generais dos EUA (não dá para confiar em Trump) depende que não se chegue a algo que o nosso planeta não teria condições de aguentar.

Luiz Eça

Começou sua vida profissional como jornalista e redator de propaganda. Escreve sobre política internacional.

Luiz Eça
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