O tempo está doido!

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Gabriel Perissé
11/11/2009

 

Tenho ouvido várias vezes, e eu mesmo tenho repetido sem pensar, uma frase cheia de perplexidade: - É, o tempo está doido!

 

Doido tempo porque simplesmente não quer obedecer à nossa lógica. Ficamos espantados se chove demais, se o sol vem e vai embora sem avisar, sem pedir licença.

 

Ficamos escandalizados se faz calor no inverno, se faz frio no verão. Queremos, talvez, abrir um processo contra o tempo quando ele, doido, não obedece às nossas previsões.

 

Mas doido o tempo não é. O tempo nunca foi sensato. Não se pode fazer terapia com o tempo. Nem esperar que ele se comporte como nós, seres tão sensatos que somos. O tempo e seus temporais não são surtos da natureza. Não são manifestações hormonais. São, apenas, naturais.

 

Que idéia doida a nossa, querer que o tempo seja um rapaz cordato, uma senhora recatada, um cidadão responsável, um funcionário pontual, honesto, sem gestos bruscos, sem palavras intempestivas, um moço ajuizado, de temperamento tranqüilo, uma moça com a cabeça no lugar. O tempo não é gente, minha gente!

 

Dizem, e digo eu, que o tempo enlouqueceu, que o tempo está maluco. Devemos então interná-lo num manicômio? Devemos prendê-lo em camisa de força? Devemos ministrar remédios que o deixem calmo, sereno, sem tremores, sem lágrimas, sem febres, falando em voz baixa, chuvisco em nosso ouvido?

 

O tempo, com o passar do tempo, poderá ficar ainda mais louco. Se não tomarmos providências imediatas, o tempo vai amanhecer cada vez mais desgovernado. Poderá tornar-se um problema insolúvel.

 

Já é tempo de dizer ao tempo que ele administre melhor suas emoções, peça conselhos, leia algum tipo de auto-ajuda. Não é fácil, deve ele admitir, vivermos sob tamanho despautério, não é justo que nós, tão prudentes, sejamos vítimas dessa loucura do tempo, de suas enchentes, suas ventanias, manias.

 

Tempo lelé, tempo aloprado que ele é. Tempo biruta, demente, capaz de matar a gente num acesso de fúria. Tempo que me desatina, tempo destrambelhado, desvairado. Tempo mentecapto. Tempo pancada, batendo até altas horas o seu tambor. Tempo pinel.

 

Saio de casa sem saber o que o tempo vai aprontar. Levo guarda-chuva, roupa de inverno, desconfio das nuvens, não me impressiono com a brandura do sol.

 

E, à noite, o tempo não dorme. Fica acordado, tempo lunático, sua insônia me deixa agitado. Também não consigo dormir.

 

Gabriel Perissé é doutor em Educação pela USP e escritor.

Website: http://www.perisse.com.br/

 

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