Chegou a hora

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Gabriel Brito
13/01/2016

 

 

 

 

Eis que finalmente chegamos ao ano das Olimpíadas do Rio de Janeiro, históricas somente pelo fato de serem as primeiras realizadas na América do Sul. Pena que nem parece.

 

Oito anos após eleita sede, no auge da voo econômico brasileiro e sob confetes de toda a comunidade internacional, não se respira nenhum clima de festa e esportividade.

 

Indo direto ao assunto, e assim como a Copa do Mundo, o advento do maior encontro do esporte mundial, lamentavelmente, não serviu para alterar muita coisa no quartel do Abrantes.

 

É certo que o investimento, em especial público, nas diversas modalidades foi ainda mais elevado do que nos anos anteriores. Segundo a Folha de S. Paulo, desde 2010 quase 8 bilhões de reais foram distribuídos entre 27 federações, 12 das quais fecharam seu balanço de 2015 no vermelho.

 

E a despeito de uma expectativa um pouco melhor no que tange aos resultados, não há nenhum especialista dos diversos esportes afirmando que tivemos um salto histórico de qualidade, algo mais do que esperado de qualquer nação que se proponha a sediar evento de tamanha envergadura – e custos.

 

Além do mais, só uma concepção demasiadamente rasteira para reduzir a oportunidade a metas relativas a uma posição um pouco melhor no quadro geral de medalhas.

 

Continuamos sem políticas coordenadas de promoção do esporte na base e nas escolas, de forma a atrelá-lo também à formação cidadã e à própria saúde.

 

Afinal de contas, como dizem os próprios médicos, técnicos, atletas e analistas, a competição de alto rendimento não tem lá muita relação com a saúde e a valorização do corpo humano. Mas sua disseminação entre a população, sem dúvida, seria de grande valor.

 

Portanto, estamos diante de mais um megaevento esportivo prioritariamente utilizado com fins políticos e econômicos.

 

É verdade que o viés político foi desinflado com a crise econômica que abala de vez o país, além dos protestos contra a Copa do Mundo, entre 2013 e 2014, cujas marcas são indeléveis na história nacional e deixaram todo mundo vacinado.

 

Porém, economicamente, o sucesso se verifica, a exemplo da Copa do Mundo, com governos e seus privilegiados parceiros, em especial construtoras, potencializando seus objetivos e lucros com obras e projetos faraônicos.

 

Como era de se esperar, a capital carioca é um canteiro de obras que deverá cheirar a tinta e asfalto frescos quando a pira olímpica for acesa.

 

Paralelo a isso, o Rio de Janeiro viveu um boom imobiliário e mercantilista sem precedentes, a excluir ainda mais gente dos principais espaços de reprodução da vida cotidiana, conforme denunciado largamente por alguns políticos, jornalistas, movimentos sociais e cidadãos.

 

Dessa forma, é uma pena que não se tenha respirado um clima de maior prestígio às modalidades historicamente eclipsadas pelo futebol, com maior divulgação na mídia e população.

 

Continuaremos festejando triunfos de equipes e atletas que chegaram lá pelo esforço próprio, a despeito de políticas orientadoras de suas federações.

 

Nem mesmo o vôlei, o mais bem sucedido esporte brasileiro no século 21, chega em clima de empolgação, abalado pelos escândalos de corrupção na CBV, expostos pelo brilhante jornalista Lucio de Castro, entre 2014 e 2015.

 

De toda forma, é bastante possível que o Brasil consiga figurar entre os 10 primeiros do quadro geral de medalhas, resultado cuja consistência será posta à prova, de fato, em 2020, nas Olimpíadas de Tóquio.

 

Mas, a exemplo do mundial de futebol, pouco se poderá falar de “legado”.

 

Para ficar em alguns exemplos, o pequeno estádio de futebol de Jacarepaguá foi demolido para a passagem do BRT Transcarioca, uma daquelas ideias muito rentáveis que nada têm a ver com a garantia de 15 dias de funcionamento da cidade para delegações e turistas estrangeiros.

 

Já o estádio de atletismo Célio de Barros, localizado dentro do complexo do Maracanã, passou em branco, já que havia sido fechado para demolição e construção de um estacionamento quando se reabrisse o ex-maior do mundo, ideia derrubada pela indignação da sociedade carioca.

 

Será reconstruído a partir de 2017, para alegria de alguns financiadores de campanha, cuja amizade com os recentes mandatários do Rio marcou época na história das relações público-privadas.

 

Já a Vila Olímpica, tende a servir como futura moradia de famílias que não constavam da lista do déficit habitacional local, que por sinal só aumentou no último período.

 

Para coroar toda a farsa perfumada pelos megaeventos, o Estádio Olímpico do Engenho de Dentro (Engenhão) ainda não foi liberado, dado que as obras que o deixarão apto ao atletismo não foram concluídas. No mais, jamais foi útil à prática esportiva da cidadania que habita seu entorno.

 

Como se o vexame fosse pouco, terminou o ano de 2015 com luz e água cortadas, por conta de dívida que beirava 1 milhão de reais.

 

Enfim, a apoteose de um processo político que teria feito o Brasil “adquirir a cidadania internacional” (palavras de Lula) se resumirá a 15 dias de diversão e entretenimento que população e torcedores mais apaixonados saberão desfrutar, mas com a maturidade de não enxergarem nada do “progresso” exaustivamente vendido por seus propagandistas.

 

Futebol

 

Enquanto deixamos a caravana passar no que se refere às Olimpíadas, no rico futebol brasileiro o ano não começa nada animador. Acossado por denúncias incontornáveis e sob risco de prisão, o presidente da CBF não tem condições de se manter no cargo. Porém, comanda tranquilamente a transição, que ora recai no colo de um obscuro coronel Nunes.

 

Diante de tamanha pequenez da cartolagem e demais administradores do futebol, que insistem em se dizer portadores de novos e modernos métodos, não surpreende que os clubes brasileiros não tenham nenhum protagonismo no ensaio que visa criar a Liga Sul-Americana de Clubes, a fim de reorganizar o futebol do continente e se contrapor ao despotismo da Conmebol e seus eternos coronéis.

 

Enquanto isso, o mais novo eldorado do futebol global varre o elenco do campeão brasileiro, totalmente incapaz de reter suas estrelas, que por sua vez abrem mão de uma carreira mais respeitável e gloriosa em troca de rios de dinheiro – ainda que já ganhassem como magnatas por aqui.

 

Fica difícil pedir que pensem diferentes e “comprem a briga” de ficar no país em nome de um projeto (?) sem nenhuma credibilidade, uma seleção que já não comove ninguém, sendo, ainda por cima, boicotados nas pautas que propõem, a exemplo do que se viu no tratamento reacionário dispensado ao movimento Bom Senso Futebol Clube.

 

Ávidos em imitar a Europa “em tudo”, a realidade é mais deprimente e nos deixa muito mais próximos dos países coadjuvantes ou irrelevantes dessa divisão internacional da bola.

 

 

Gabriel Brito é jornalista do Correio da Cidadania.

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