Vice não é adereço político

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Frei Betto
19/08/2014

 

O PSB está num impasse. Queria os votos de Marina Silva apenas para anabolizar a candidatura de Eduardo Campos à presidência. Não contava com a mais improvável de todas as hipóteses de futuro: a morte precoce do titular da chapa. Agora, na próxima quarta, terá de sair do impasse: escolher Marina ou um nome que, em poucos dias, atraia parcela considerável do eleitorado.

 

Vice é mero adereço político? Pelo jeito, não. Na história política do Brasil, muitos vices alcançaram inesperadamente a titularidade.

 

Com o suicídio de Vargas, em agosto de 1954, seu vice, Café Filho, assumiu a presidência até novembro de 1955, ao se afastar por motivo de doença. Na época, a chapa não era casada. O eleitor votava, separadamente, no candidato a presidente e no candidato a vice.

 

Jango foi vice de JK, eleito em 1955 e, curiosamente, mereceu mais votos que o titular (44,25% dos votos para o vice e 35,68% para o presidente). Jango foi reeleito vice, desta vez de Jânio Quadros, em 1960. Com a renúncia do presidente, em agosto de 1961, Jango ocupou-lhe o lugar até ser deposto, em abril de 1964, pelo golpe militar.

 

Os vices da ditadura foram todos meros adereços. Os civis eram todos mineiros: José Maria Alkmin, vice de Castelo Branco; Pedro Aleixo, vice de Costa e Silva; e Aureliano Chaves, vice de Figueiredo. Médici e Geisel escolheram militares para vices: o almirante Rademaker e o general Adalberto Pereira dos Santos, respectivamente.

 

Se a morte de Tancredo, em abril de 1985, fez de Sarney presidente, o impeachment de Collor, em outubro de 1992, alçou ao mesmo cargo o seu vice, Itamar Franco. FHC preferiu um vice do PFL (hoje DEM), Marco Maciel, em seus dois mandatos.

 

Lula, para simbolizar o pacto capital e trabalho, buscou um empresário, José Alencar, que acabara de se desfiliar do PMDB. Pensou em voltar, mas o PMDB, na eleição de 2002, apoiava o PSDB. Então Alencar foi aceito no PL. E provou o gostinho da caneta, pois ocupou a presidência por 368 dias intercalados.

 

O PT não leva a sério a possibilidade de Michel Temer substituir Dilma, assim como Sarney veio a ocupar a presidência no lugar de Tancredo Neves. O PMDB serve de andaime ao PT. Mas quem sobe e segura o pincel (no caso, a caneta) é o PT.

 

O PMDB poderia governar o Brasil sem o apoio do PT, como fez Sarney. Já o PT precisa do PMDB como fiel da balança de sua sustentação política.

 

Como se vê, vice, do latim vicis, “volta, troca, substituição”, é para ser levado a sério. O destino é implacável e o futuro só a Deus pertence.

 

Frei Betto é escritor, autor de “Calendário do Poder” (Rocco), entre outros livros.

Website: http://www.freibetto.org/

Twitter: @freibetto.

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