Regra da identidade física do juiz

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Claudionor Mendonça dos Santos
27/07/2009

 

Há muito tempo se discutemas razões por queo legislador pátrio não abraçou a regra da identidade física do juiz no processo penal, onde se discutem valores maiores, tais como a liberdade e o interesse punitivo do Estado. Era absolutamente incompreensível que o referido princípio fosse aplicado no diploma processual civil, em que são confrontados, muitas vezes, interesses meramente patrimoniais, de valor inferior àquele discutido no processo penal.

 

Visando conferir maior eficiência ao julgamento, estabelecendo que a sentença seja proferida por quem tenha mantido contato com as provas do feito, especialmente as orais, o legislador, laconicamente, determinou que "o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença" (art.399, §2º do Código de Processo Penal). Diante da concentração dos atos processuais, à primeira vista, deparou-se com a efetiva concretização do referido princípio, pois, em face da realização unificada de toda a prova, fácil seria a aplicação da referida regra.

 

Contudo, em face do absoluto alheamento dos legisladores pátrios acerca das atividades forenses, a decantada concentração de atos processuais nem sempre se torna viável, com a necessidade de sucessivos adiamentos. Nesse caminhar, às vezes a aplicação do dispositivo previsto na nova legislação apresenta dificuldades. Necessário frisar que os termos lacônicos do princípio da identidade física do juiz tornam necessárias a aplicação, analogicamente, de dispositivos previstos na legislação processual civil (artigo 132, do Código de Processo Civil), mais aperfeiçoados, ao estabelecerem que o juiz que substituir aquele que presidiu os atos instrutórios poderá refazer a prova, se entender necessário.

 

Diante do teor sucinto, há quem entenda que, no processo penal, seria inaplicável a possibilidade prevista no parágrafo único, da legislação processual civil, devendo o magistrado, na ação penal, ao substituir aquele que instruiu o feito, refazer obrigatoriamente a prova. Embora se reconheça a relevância da causa penal, é de se rechaçar tal postura. Refazer a prova simplesmente porque não instruiu o feito nas hipóteses legalmente permitidas seria verdadeiro atentado à finalidade da recente reforma que veio concretizar dispositivo constitucional pétreo, assegurando a celeridade processual (art. 5º, inciso LXXVIII, da CF).

 

Aliás, em nome da referida celeridade é que se suprimiu dispositivo altamente salutar, que determinava o afastamento do juiz que mantivera contato com a prova obtida ilicitamente. Dispunha o dispositivo que "o juiz que conhecer do conteúdo da prova declarada inadmissível não poderá proferir a sentença ou acórdão". Ora, diante da natureza humana, seria coerente e saudável, sob o ponto de vista da limpidez da prova, o afastamento do magistrado que em tais circunstâncias tomou conhecimento da prova, mesmo que ilícita. Entretanto, em atendimento à celeridade processual, suprimiu-se o dispositivo.

 

A prova ilicitamente produzida e retirada do processo macula o convencimento do magistrado, ser humano que é, não podendo, automaticamente, deletar o que vira e que poderá, indiscutivelmente, influenciar o seu julgamento. Melhor seria a manutenção do dispositivo que não provocaria tanto retardamento no andamento do feito e atenderia melhor ao outro dispositivo constitucional que determina a retirada do processo daquelas provas obtidas ilicitamente.

 

Assim, em que pese a controvérsia em torno do tema, é altamente saudável a vinculação do magistrado que, no exercício de sua atividade, tomou conhecimento das provas, tendo ele, portanto, maiores condições de proferir a decisão, atendendo de forma mais adequada ao conceito de justiça.

 

Claudionor Mendonça dos Santos é Promotor de Justiça e Associado do MPD (Movimento do Ministério Público Democrático).

 

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