Correio da Cidadania

Em Minas, a juventude e os movimentos sociais superam o medo

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Um recente e complexo movimento de massas eclodiu na quinta-feira, dia 13 de junho de 2013, quando o Movimento Passe Livre (MPL) convocou a juventude a ir às ruas da de São Paulo reivindicar a revogação do aumento das tarifas de ônibus, que haviam sido reajustadas para R$ 3,20. Isto é, no mínimo R$ 6,40 (R$ 12,80 para quem precisa de dois ônibus!) para se ter acesso ao direito de ir e vir em São Paulo. O movimento, que contou com a participação de dezenas de milhares de jovens, foi brutalmente reprimido, com a PM paulistana detendo arbitrariamente manifestantes que portavam vinagre para se precaver dos efeitos do gás lacrimogêneo incessantemente usado pela polícia.

 

A repressão policial gerou comoção e serviu como uma válvula de escape para a revolta latente que vive a juventude – vale lembrar da “revolta do buzu” em 2003 em Salvador, as Revoltas da Catraca de 2004 e 2005 em Florianópolis e movimentos semelhantes, que obtiveram vitórias, em Vitória, Teresina, Porto Velho, Aracajú, Natal, Porto Alegre, Goiânia etc. –, esta que não se vê representada nos tradicionais partidos políticos e se identifica menos ainda com os políticos (quanto mais pelo Estado brasileiro!), e passam a adotar as mobilizações espontâneas combinadas com ações diretas em caráter apartidário, isto é, sem partidos para dirigi-la e representá-la.

 

Belo Horizonte

 

Em Belo Horizonte, durante os jogos da Copa das Confederações, a PM armou por três vezes uma verdadeira cilada repressiva, com bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha contra os manifestantes que marchavam pacificamente rumo ao Mineirão na Av. Antônio Carlos com a Av. Abrahão Caram – onde se localiza o viaduto José Alencar, de onde seis pessoas caíram; uma delas o jovem metalúrgico Douglas Henrique de Oliveira Souza, faleceu. Temendo a desorganização após a sistemática repressão policial, parte dos manifestantes criou a Assembleia Popular Horizontal, onde o movimento (se) discute e delibera ações. As lutas são muitas e organizadas nas seguintes comissões: moradia, democratização da mídia, reforma política, meio ambiente, transporte, cultura, saúde, educação, desmilitarização, Copa, minorias e direitos humanos. Pauta difusa, mas luta unitária.

 

A acomodação política promovida pelo pacto conservador do lulismo não serve a essa juventude que vive(rá) a crise capitalista que se alastra por todo o globo, enquanto a Globo e consortes, ao ver que boa parte da juventude que estava nas ruas era da classe média, não perdeu tempo e tratou logo de reorientar suas abordagens e edições como se tratando de “não é só pelos vinte centavos”, como disse Arnaldo Jabor, tentando fabricar uma indignação centralizada na pauta do “combate à corrupção”, como tanto se tentou nos movimentos direitistas a exemplo do “Cansei”. Essa manobra é uma tentativa de deslegitimar e desestabilizar os governos petistas e forçar a existência de uma oposição automática (isto é, tucana), como se só os governos petistas utilizassem de mecanismos de corrupção para governar. Nada mais hipócrita, basta lembrar da “Privataria Tucana”, a compra da reeleição de FHC etc.

 

Essa manobra obteve considerável sucesso, com uma campanha midiática sistemática que permitiu um giro conservador que escapou a qualquer controle de lideranças presentes nas manifestações nas capitais brasileiras. O que era fundamentalmente uma luta à esquerda se tornou um movimento sem controle e com “gigantes acordados com muito orgulho, com muito amor” se manifestando “contra a corrupção” graças à legitimação e incentivo midiáticos. A partir daí, com a juventude saindo às ruas envolta em bandeiras nacionais, cantando o hino e palavras de ordem que vêm da antessala da ditadura militar como “o gigante acordou”, o movimento se (re)caracterizou, levando mais de 4 milhões de pessoas às ruas por todo o país, inclusive em cidades do interior dos estados, fazendo com que muitas pessoas, que antes condenavam manifestações por mera osmose do consenso conservador e reacionário, fossem às ruas pela primeira vez na vida.

 

Em BH, um comandante da PM chegou a afirmar à imprensa que “quem sair às ruas nesta quarta-feira (26/06) estará cometendo suicídio”, revelando já o que o governo de Anastasia preparava para o dia do jogo da Seleção Brasileira. Parte da esquerda ficou receosa diante do que acontecia, afinal, todo aquele movimento foi reprimido pela polícia a esmo, ao mesmo tempo em que a corporação militar se infiltrava nas manifestações.

 

Provocadores incitavam os jovens a reagir à ação policial com depredação, servindo um prato cheio para a imprensa iniciar sua distinção de um movimento de manifestantes “de bem, pacíficos e ordeiros” dos “baderneiros, bandidos, vândalos e criminosos”. Não deu outra. Quando a juventude pobre e marginalizada, das favelas e periferias, foi às ruas, com seu ódio cultivado cotidianamente – fruto do Estado policial e militar permanente que se vive nessas comunidades –, todo o cenário já estava pronto para criminalizá-la através da mídia, como ocorreu naquela quarta-feira, com a rebelião que tomou conta da resistência à repressão policial. Manifestantes foram feridos e presos às dezenas. Mas, então, com um cenário de incêndio, barricadas e depredações, a justificativa para uma brutal intervenção policial-militar estava pronta.

 

Finalmente, partindo da Av. Antônio Carlos na Pampulha até a Praça Sete, o apelidado Comandante Xuxa, da PM-MG, do alto de um trio elétrico rodeado por carros do GATE e um caveirão blindado, ordenou em seu alto-falante às “pessoas de bem”, que ainda se encontravam nas ruas onde ocorrera o protesto, para que voltassem para casa, pois estavam “devolvendo a cidade ao povo de Belo Horizonte nesse momento histórico de resgate da democracia”. Foi, provavelmente, a maior operação policial da história de Minas, mas os manifestantes seguem e seguirão superando os seus medos nas ruas, sem recolher sua revolta diante do terror policial.

 

Lucas de Mendonça Morais é jornalista.

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