A mídia em 2000: um balanço
em quatro atos (1)

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Por Luiz Antonio Magalhães*

 

Não é fácil resumir sucintamente um ano tão rico em episódios como este 2000. Como os assuntos são muitos, dividimos a análise em 4 artigos. Afinal, foi um ano agitado, de eleições na matriz e na filial e, nesta última, de comemorações em torno dos 500 anos da nação (?). Ainda no Brasil, repetiram-se as deploráveis cenas de barbárie contra sem-terra, sem-teto, índios e desvalidos em geral.

O objeto dessas Entrelinhas, porém, não é o fato em si, mas o jeito que a mídia cuidou de levar ao público o acontecimento. E também para a imprensa, 2000 foi um ano agitado. Afinal, até agora há pouco aí estavam Bush e Gore, que não me deixam mentir. Mais de um mês de espera para saber quem assumiria o cargo de chefe da polícia do planeta não deixa de ser um fato insólito.

Eleições/EUA: a barriga histórica

Quem acompanhou a cobertura das eleições no império pela imprensa norte-americana teve a oportunidade de presenciar cenas cômicas, dignas das velhas fitas dos Três Patetas. Foi muito interessante perceber que uma das âncoras da CNN não aprendeu a fazer contas que incluam porcentagens. A frase "quanto é 5% de 500 mil, mesmo?" saiu da madrugada de 8 de novembro para entrar na história do jornalismo.

Porém, perceber que a turma da filial também comeu bola e repetiu as barrigas da matriz foi ainda mais interessante. Praticamente todos os sites brasileiros acompanharam a madrugada trágica repetindo o noticiário norte-americano. Não fosse o fuso horário, os grandes jornais brasileiros também teriam oferecido a seus leitores, de bandeja, a histórica barriga.

Colonialismos à parte, foi frágil e limitada a cobertura tupiniquim. A mídia brasileira limitou-se a acompanhar o desenlace do pleito sem se aprofundar nas conseqüências para o mundo e para o Brasil. Quem procurou algo sobre a posição da diplomacia nacional, por exemplo, só conseguiu saber, por poucas e pequenas notas, que o Itamaraty torcia por Bush e o atual mandarim, por Al Gore.

"Explosão" da internet

O último ano do milênio, porém, não se limita ao seu "grand finale". Logo no começo de 2000, em janeiro, a bola da vez era a explosão da internet no país. O nascimento dos provedores gratuitos, a entrada dos bancos na brincadeira de dar acesso à grande rede e os "cases" de sucesso de jovens rapazes que ganhavam rios de dinheiro na web deixaram a imprensa em polvorosa.

A excitação que tomou conta dos jornalistas se explica, é bem verdade, pela ampliação do mercado de trabalho, que por um período inflacionou os salários da categoria. Nada explica, porém, a falta de espírito crítico e realismo de vários colunistas, tantos deles escaldados, que apostaram forte e retumbante crescimento da internet brasileira.

O tempo passou, os "cases" de sucesso dos filhos da burguesia nacional foram rareando, a Nasdaq caiu, subiu, caiu de novo e, ao fim e ao cabo, verificou-se que o crescimento da internet no Brasil não vai ser tão espetacular como os contos de fadas que as grandes revistas nacionais publicaram no início do ano. Até porque, é chato lembrar, no terceiro mundo, as condições reais atrapalham um pouco. NY, definitivamente, não é aqui.

Na próxima semana, vamos analisar como a mídia brasileira tratou a "celebração" dos 500 anos, os atos do MST, além de lembrar as circunstâncias do lançamento do jornal Valor, associação entre os grupos Folha e Globo, exemplo recente do movimento de cartelização da imprensa nacional. No terceiro artigo da série, comentaremos as mortes de dois grandes jornalistas – Barbosa Lima Sobrinho e Aloysio Biondi–, o caso Pimenta Neves e os 50 anos da TV brasileira. O último artigo da série é reservado à análise da cobertura da imprensa das eleições municipais e dos casos de corrupção envolvendo o juiz Nicolau.

* Luiz Antonio C. C. Magalhães é editor-assistente do Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br). Foi diretor-adjunto e editor deste Correio (1996-2000).
Endereço eletrônico: laccm@ig.com.br

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