Apoio ao MST
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Da redação

 

Os professores Fabio Comparato, Milton Santos, Plinio Arruda Sampaio e o bispo Dom Tomás Balduino, em entrevista coletiva à imprensa, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil, em São Paulo, protestaram contra a desaceleração das desapropriações para fins de reforma agrária e denunciaram a perseguição do governo e de alguns órgãos da imprensa contra o MST. O texto foi lido pelo professor Fabio Comparato (ver abaixo). O professor Milton Santos deixou de comparecer por estar acamado, mas declarou sua integral solidariedade à nota.

Compareceram ao ato e emprestaram apoio ao protesto o Secretário Geral do PT, Arlindo Chinaglia, o deputado Jamil Murad e o vereador Vital Nolasco, pelo PCdoB, a vice-presidente da CUT Nacional, Mônica Valente, o representante da Confederação das Associações de Funcionários do Incra, José Vaz Parente, e da Central de Movimentos Populares, Luiz Gonzaga da Silva. Falando como anfitrião, o advogado João José Sady declarou que irá levar o protesto e as informações prestadas durante a audiência para exame do Conselho Regional da OAB, com vistas ao posicionamento da entidade sobre o assunto.

Vaz Parente entregou aos jornalistas tabelas oficiais de execução do orçamento do Incra comprobatórios de que, até a metade do mês de outubro, o governo havia empenhado tão somente 33% da verba destinada a desapropriações e despesas de assentamentos da reforma agrária.

Quanto ao crédito do Pronaf, foram apresentadas evidências de que o governo está protelando a liberação da quantia total anunciada. A época de plantio nas regiões sul e sudeste já está terminando e os bancos ainda alegam dificuldades burocráticas para atender aos pedidos de empréstimos para custeio. Dezenas de milhares de assentados tiveram que vender animais ou maquinário para comprar sementes e adubos, a fim de plantar uma área mínima para a subsistência familiar.

A sanha do governo federal e de certos órgãos de imprensa ligados aos setores mais reacionários do país contra o MST se deve ao fato de que os ruidosos protestos deste movimento estão impedindo a "mágica" oficial de, por um lado, anunciar, para ficar bem com a opinião pública, a disponibilização de uma verba e, por outro lado, usar medidas protelatórias para deixar de realizar o gasto, com o fim de conseguir saldos para pagamento da dívida externa.

Respondendo à pergunta dos jornalistas sobre as relações entre o MST e o PT, o deputado Arlindo Chinaglia declarou que ambos movimentos são independentes um do outro, de modo que não estão obrigados a tomar sempre a mesma posição diante dos fatos políticos e sociais. O que não quer dizer, em absoluto, que o PT deixe de apoiar o MST, movimento que considera extremamente importante para a realização da reforma agrária e para a consolidação da própria democracia no país.

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O GOVERNO FEDERAL E O MST

O Correio publica abaixo o protesto dos professores Fabio Comparato, Milton Santos, Plinio Arruda Sampaio e o bispo Dom Tomás Balduino, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil, em São Paulo, contra a desaceleração das desapropriações para fins de reforma agrária e a perseguição do governo e de alguns órgãos da imprensa contra o MST.

 

Ao desencadear coordenadamente uma ação repressiva e desmoralizadora contra o MST, o governo federal decidiu enfim abandonar o simulacro de reforma agrária, com o qual vinha se exibindo perante as autoridades políticas e religiosas no plano internacional.

Só no corrente ano, 10 integrantes do MST foram assassinados, enquanto processos criminais foram abertos contra 180 líderes do movimento. Ademais, seis militantes cumprem a inusitada pena de oito anos de reclusão por crime de dano a bem público (instalações de um posto de pedágio em rodovia estadual paulista).

Não contente com isto, o governo federal acaba de condenar à miséria 250.000 famílias de lavradores já assentados, ou seja, mais de um milhão de pessoas, ao recusar-lhes em tempo hábil o indispensável crédito referente à safra 2000-2001, o qual vinha sendo pleiteado desde o começo do ano. Foi somente em 20 de outubro, ou seja, depois de ultrapassada a época de plantio, que o governo anunciou a liberação desse crédito. Trata-se, contudo, de um ardil. Tais recursos não são disponíveis na prática, porque as novas modalidades de crédito foram meticulosamente talhadas a fim de impedir que a grande massa dos assentados e dos pequenos agricultores tenham acesso ao dinheiro. O governo passou a exigir que os pedidos de crédito sejam individuais e os bancos só os atendem na medida em que tenham em caixa recursos disponíveis, o que nem sempre acontece.

Em razão dessa má-fé governamental, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, o Conselho Nacional das Igrejas Cristãs e a Ordem dos Advogados do Brasil retiram-se da mesa de negociações.

Podemos afirmar que em nenhum outro momento de nossa História viu-se um governo acuar 250.000 famílias à súbita miséria, por razões puramente políticas.

Em reforço dessa ação repressiva, o governo orquestrou, com a oportuna coadjuvação de jornalistas bem situados, uma campanha de desmoralização do MST, imputando aos seus dirigentes o desvio de recursos públicos em proveito próprio. De imediato, a Polícia Federal foi instruída a abrir dezenas de inquéritos em todo o país, para investigar tais denúncias.

O objetivo evidente dessa operação estratégica é liquidar o MST, da mesma forma como foram liquidadas as Ligas Camponesas nos primeiros meses do regime militar.

O momento não comporta mais tergiversações. Os signatários estão seguros de que todos os partidos políticos decentes, todas as organizações religiosas e entidades de defesa dos direitos humanos irão mobilizar-se para repudiar o comportamento indigno do governo federal no episódio, e defender o direito à sobrevivência das famílias trabalhadoras de todo o Brasil.

São Paulo, 25 de outubro de 2000.

Fábio Konder Comparato — Doutor Honoris Causa da Universidade de Coimbra, Doutor em Direito da Universidade de Paris e Professor Titular da USP; Milton Santos — Doutor, Geógrafo e Professor Emérito da USP; Plínio de Arruda Sampaio — Professor, ex-Deputado Federal Constituinte e Consultor da FAO; Dom Tomás Balduíno — Bispo e Presidente Nacional da CPT.

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