Geral

Morra pela boca
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Por Frei Betto
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Olho no lucro, indústrias alimentícias preferem, agora, investir em produtos transgênicos. No Brasil, cinco variedades de soja da Monsanto já têm sua produção autorizada pelo governo federal, embora não possam ainda ser comercializadas. Uma liminar assegurou estudos preliminares para se constatar o impacto ambiental desses produtos.

Na CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança), há 595 pedidos de liberação para milho transgênico, 32 para soja, 6 para cana-de-açúcar, 3 para algodão, 2 para eucalipto, 2 para fumo, 1 para arroz e outro para batata.

Os transgênicos podem provocar câncer, alergias e imunidade aos antibióticos. Por isso, o Ministério da Justiça exige constar nas embalagens se o alimento é geneticamente modificado, bem como o nome do gene utilizado e a origem da espécie doadora. O mesmo vale para os importados e cardápios de restaurantes. Portanto, se o consumidor compra ou ingere sem pesquisar o risco é dele. Mas de quem é a culpa se a grande maioria dos brasileiros é analfabeta e não consegue decifrar o dialeto químico de rótulos em embalagens? Se consegue, é hora de virar cidadão e reclamar seus direitos.

Enquanto as pesquisas não desfazem os temores, algumas redes de supermercado, como a Carrefour, preferem não oferecer nenhum produto transgênico a seus consumidores.


Ignorância alimentar

O sistema capitalista neoliberal não pretende formar cidadãos. Investe na proliferação de consumidores. Dá-lhes propaganda, mas sem consciência. Por isso, o brasileiro ignora o que come. Nem as escolas educam para formar consumidores responsáveis.

Vi na China pessoas que conheciam o valor nutritivo deste e daquele alimento, bem como os efeitos no organismo. Aqui, somos analfabetos em matéria de nutrição. Poucos sabem preparar o que ingerem e quase ninguém é capaz de dizer o que tal alimento significa para a sua saúde física e espiritual.

Malgrado os avanços técnicos e científicos, que virtualmente nos asseguram melhor qualidade de vida, hoje a cobiça pelo lucro nos obriga a ingerir alimentos contaminados por aditivos, hormônios, pesticidas e antibióticos. Não é de estranhar que o nosso organismo adoeça.

Cabe ao consumidor verificar o rótulo dos produtos que compra, embora não seja instruído para esta tarefa. No Chile, está proibido o aditivo eritracina. O tratrazina (amarelo 5) - presente em certos iogurtes, geléias, chicletes, refrigerantes, sucos, gelatinas, mostardas e balas ­ causa alergias e insônia. Por isso, está proibido na Grécia e, na Nova Zelândia, é vetado nos medicamentos.

O amaranto, contido em frutas em conserva, doces, iogurtes, pode provocar alergias e tumores. Está proibido nos EUA, Egito, Rússia, Kwait e Chile. O BHA, encontrado em maioneses e biscoitos, provoca irritação da pele e câncer. Está proibido nos EUA, bem como o BHT, que produz hipersensibilidade, alergias, tumores, aumento do colesterol, erupções na pele, e é encontrado em maioneses, sucos, biscoitos, margarinas e manteigas.

O glutamato monosódico, encontrado em caldos concentrados, sopas em pó, extratos de galinha, molhos de tomate e salsichas, está proibido para alimentação infantil nos EUA. Provoca lesão cerebral e a doença de Knok, que contrai os músculos da cabeça.

 

Dioxinas

Foram as dioxinas made in USA, contidas no "agente laranja", que contaminaram, durante a guerra do Vietnã, 700 mil vietnamitas. Hoje, há milhares de pessoas naquele país com deformidades físicas e mentais provocadas pela guerra química desencadeada pela Casa Branca. Elas movem um processo de indenização contra o governo americano. E pensar que Tio Sam tem o cinismo de mostrar-se horrorizado quando há notícias de armas químicas em outros países.

Na Bélgica, este ano, houve um transtorno nacional ao se constatar que a ração animal estava contaminada com dioxinas. E no Brasil, há dioxinas? Elas são 500 vezes mais tóxicas que o famoso veneno estriquinina. Modificam o nosso código genético e causam câncer.

Como são produzidas? Pelos incineradores de lixo doméstico, industrial ou hospitalar. Aquela fumaça que sai pela chaminé contém substâncias venenosas, que atravessaram os filtros do incinerador. Para cada 3 toneladas de lixo sólido incinerado, 1 tonelada vira cinza e precisa ser depositada em aterro sanitário. Se no aterro há lençóis freáticos, o risco de um vazamento ameaça toda a população que se beneficia daquela água.

Mas não é só na água que as dioxinas nadam de braçada. Elas viajam pelo ar. As que são expelidas pela indústria de papel e celulose têm autonomia de vôo de até 200 km nas correntes de ar. Caem sobre plantações para, em seguida, serem absorvidas pelos seres humanos através dos alimentos.

No Brasil, o governo não possui laboratórios aparelhados para controlar as emissões de dioxinas. Nem fiscalização suficiente sobre a coleta do lixo.


Leite & sal

Pesquisa recente do Departamento de Alimentação e Nutrição Experimental da USP constatou, ao analisar 30 marcas de leite, que muitos contêm vitaminas em quantidades distintas das anunciadas em suas respectivas embalagens. Há produtos com teor de vitaminas 50% abaixo do declarado e, outros, com teores de vitamina até 100% acima.

Ou seja, não há controle de qualidade dos produtos. Das marcas de leite em pó analisadas, apenas uma apresentou índices de vitamina E correspondentes ao registrado no rótulo. Ora, considerando que o leite é uma das primeiras fontes nutrientes para crianças menores de 1 ano, pode-se calcular as conseqüências dessa alteração criminosa.

O artifício de aumentar a dose de vitamina contida no leite visa assegurar a qualidade do produto até esgotar seu prazo de validade. Mas doses excessivas prejudicam a saúde.

Recente pesquisa do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) analisou 20 qualidades de sal. Em alguns, encontrou iodo em níveis inferiores aos admitidos pela legislação, em especial nas marcas Gauchão e Pirata, de sal grosso. Isso é grave, pois o sal é a principal fonte de iodo para que se evite o bócio e o cretinismo, uma doença mental que atinge crianças carentes dessa substância.

As marcas Sal & Sabor e Cisne, de sal refinado, continham teor de umidade acima do permitido. As marcas Diana e Cinco Estrelas, também de sal refinado, apresentavam granulações maiores que o especificado. As marcas Cinco Estrelas e Jasmin não exibiam, em seus rótulos, registros do Ministério da Saúde, data de fabricação e validade.


O que fazer?

O Fantástico tem testado a qualidade de determinados produtos considerados de necessidade básica para a população. É um começo. Deveriam as escolas introduzir, em aulas de química ou de ética/cidadania, análise dos produtos consumidos pelos alunos. Confira-se em laboratório o que registram as embalagens. E estabeleça-se um canal de diálogo com a mídia, para que parcela do público conheça o resultado da pesquisa.

Em bairros, igrejas, clubes e municípios, é preciso criar instituições de defesa do consumidor, divulgar os serviços prestados pelo Procon, promover campanhas para que a população adquira melhores hábitos no que concerne à alimentação, limpeza doméstica e coleta do lixo.

Na zona rural, a educação deve esclarecer os agricultores quanto ao uso de agrotóxicos e à preservação das fontes de água, das matas e florestas. Hoje, cuidar da Terra é cuidar da viabilidade da vida humana no futuro.

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