Correio da Cidadania

O Estado brasileiro no banco dos réus

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A sociedade brasileira enfrenta todos os dias as mais variadas violências praticadas pelo Estado, justamente a instituição que deveria promover a justiça, garantir a segurança e assegurar o bem estar de todos – sem privilégios e sem discriminações.

 

No entanto, quando a Polícia Militar – o Bope, a Brigada Militar ou outra força armada – invade uma favela ou bairro periférico, arromba as portas das casas, aterroriza as famílias e mata sumariamente homens e mulheres, velhos e crianças, e principalmente jovens pobres e negros, é o braço armado do Estado que pratica a violência.

 

Quando trabalhadores sem terra se organizam para defender a reforma agrária e ocupam áreas ociosas, abandonadas e improdutivas, sem função social, mas são despejados, agredidos e condenados à miséria e à fome por força de uma decisão judicial, é o braço legalizador do Estado que pratica a violência.

 

Quando famílias, comunidades, categorias de trabalhadores e segmentos sociais – especialmente as populações mais pobres do campo e das periferias das cidades – clamam por justiça, por ações e obras públicas, por serviços básicos de educação, saúde, transportes etc., mas não são ouvidos nem atendidos, é o braço burocrático e discricionário do Estado que pratica a violência.

 

Quando pessoas são aprisionadas, julgadas ou não, condenadas ou não, mas encarceradas e colocadas sob a custódia do Estado em presídios superlotados, em condições desumanas, sob constante humilhação e tortura, é o braço punitivo do sistema prisional do Estado que pratica a violência.

 

O Brasil está repleto de exemplos de violações graves e sistemáticas dos direitos humanos praticadas pela ação ou pela omissão dos agentes do Estado, pelos poderes da República, por políticas públicas pensadas, elaboradas e executadas para atingir – seletivamente – parcelas do povo brasileiro.

 

A prisão indiscriminada de jovens negros e pobres na Bahia; a criminalização e o preconceito de instâncias do Judiciário contra os movimentos sociais no Pará e no Rio Grande do Sul; a política de extermínio de favelados no Rio de Janeiro; as execuções de centenas de pessoas pelas forças policiais de São Paulo em 2006, sem a menor investigação e condenação. Todos são crimes do Estado.

 

É com o objetivo de analisar, debater, conscientizar e julgar os casos concretos que comprovam essa situação de barbárie no Brasil que inúmeras entidades populares, movimentos sociais, associações de classe e grupos de familiares vítimas da violência do Estado, estão organizando um grande Tribunal Popular, a ser realizado em São Paulo, de 3 a 5 de dezembro, na Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco.

 

O Tribunal Popular quer mesmo colocar o Estado Brasileiro no banco dos réus, quer mobilizar a sociedade para a denúncia dessa violência contra o povo, quer apontar os responsáveis, quer contribuir para a construção de instituições realmente comprometidas com o respeito à democracia, à cidadania e à vida.

 

No dia 10 de dezembro de 2008, a Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 60 anos. Já está na hora de o Estado Brasileiro cumprir o que assinou em 1948. Não dá mais para calar diante de tanta arbitrariedade e violência.

 

Hamilton Octavio de Souza é jornalista e chefe do departamento de jornalismo da PUC-SP.

 

Fonte: Jornal PucViva

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