Correio da Cidadania

Primeira mulher indígena governadora no Equador

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Foto: Metro Equador

Em 27 de junho, Lenín Moreno, o presidente eleito no Equador, apresentou no Palácio de Carandolet os novos governadores das províncias equatorianas. Entre eles aparece a primeira mulher indígena a se tornar governadora: Paolina Vercoutére Quinche.

Filha de pai francês e mãe indígena, Paolina, da etnia Kichwa, será governadora de Imbabura, uma das províncias mais importantes do norte do país. É uma mulher bastante influente, tendo sido diretora do Ministério de Inclusão Econômica e Social, uma representação respeitável devido a sua trajetória marcada pelo estudo e luta social.

Paolina é a única indígena, mas outras cinco mulheres foram nomeadas:

•    Chimborazo: Margarita Beatriz Guevara Alvarado;

•    El Oro: Rosa Luz López Machuca;

•    Santo Domingo de los Tsáchilas: Mary Nesbith Verduga Cedeño;

•    Sucumbíos: Jessenia Marisela Rojas Solano;

•    Galápagos: Lorena Tapia.

Entre os novos governadores designados por Lenín Moreno cabe ressaltar que alguns foram ex-funcionários do anterior presidente Correa. Percebe-se que ainda com poucos meses no governo, Moreno tenta se aproximar dos laços que foram cortados por Correa, abrindo diálogos com os indígenas, militares e alguns políticos. Também se disponibilizou a dialogar com os prefeitos da oposição em Guayaquil (Jaime Nebot) e Quito (Mauricio Rodas), convidando-os a trabalhar em conjunto.

Um convite paradoxal, mas parte da forma de “fazer política” tradicional, da harmonia entre projetos sociais aparentemente distintos. Contudo, é de suma importância sair do debate das frações de classe e falar da formação da população no Equador. Espera-se que este homens e mulheres, agora governadoras, se atentem.

Os afroequatorianos autodeclarados compõem 15% da população total do país, por volta de 15 milhões de habitantes (1). Assim como em outros países da América Latina, a população negra no Equador enfrenta desafios como os altos níveis de pobreza, marginalização e exclusão, tanto que é praticamente impossível saber quantas mulheres e homens negros existem nas Universidades ou em outros espaços de debate.  

O movimento mais conhecido e organizado no país é o MONUME (Movimento de Mulheres Negras da Fronteira Norte de Esmeraldas (2)). Cabe ressaltar que a partir deste movimento das mulheres afroequatorianas do Norte foi realizado um Congresso em 1999, numa tentativa de visibilizar a luta de todas as mulheres negras no Equador, e não apenas daquelas que vivem no Norte de Esmeraldas, apesar de ser este o local onde vive a maioria. A CONAMUNE (3) possui o intuito de unir as mulheres negras na promoção de direitos e de cidadania.

Segundo o censo de 2014 realizado pelo INEC (4), do total de afroequatorianos já mencionados apenas 1% acessaram ao Curso Superior em 2010 (8440 equatorianos na Graduação e na Pós-Graduação, sendo 458 afroequatorianos).  

Das declarações da Coordenação de Mulheres Negras no Equador publicadas em 2008 (5) - apoiadas por movimentos de mulheres afro de várias regiões do país - o que se vê é uma exigência de revisão das políticas de educação formal e do reconhecimento e valorização da educação não formal. Efetivando reparações históricas por meio de políticas públicas (cotas, inclusão da etnoeducação na matriz curricular), ou seja, acesso, regularização, ampliação e permanência da participação destas mulheres em todos os setores da sociedade.

Dado este ponto, observa-se que se abre uma luta para que as mulheres negras também estejam no governo. É certo que elas devem estar em todos os espaços, bem como os homens negros e todos aqueles que continuam desvalidos, em suas diversas formas de opressão nesta sociedade, porém, isto é insuficiente.

Estes grupos, abandonados, esquecidos, que perdem direitos ou que nunca os tiveram, que perdem terras e que morrem diariamente, formam uma classe e, assim sendo, o formato de fachada democrática da representatividade por meio de frações não garante que o projeto revolucionário avance, ainda que seja a chamada “Revolução do Século 21”. Uma revolução que nos últimos anos tentou se descolar dos grupos “de abajo”, contradizendo seu próprio projeto inicial.

A questão fundamental deste texto é ressaltar a importância de uma mulher indígena no governo, a primeira, algo histórico. Contudo, não se pode incorrer no erro de absorver apenas sob o espectro da representatividade institucional uma sociedade culturalmente heterogênea. Somos povo, somos classe de trabalhadores, de resistência indígena, de mulheres e homens negros, seja qual for a denominação dada aos que não controlam seu destino, temos um laço comum escamoteado pelo capitalismo.

Que os levantes populares continuem, para não caminharmos novamente no rumo da institucionalização confusa diante os anseios da população. Basta olhar para os nossos vizinhos para perceber como não bastou ser um operário do ABC no Brasil ou uma mulher ativista no período ditatorial.

Estejamos atentos para a forma como a política equatoriana está se consolidando, para que tudo não permaneça no lugar ou se agrave (mais).

Notas

1)  Segundo o Instituto Ecuatoriano de Estadística y Censos. Consultado a 25.06.2016
2) Site oficial consultado a 25.06.2017 https://momune.wordpress.com/
3) Coordenadora Nacional de Mulheres Negras no Equador.
4) Instituto Ecuatoriano de Estadística y Censos.
5) Consultado a 25.05.2016 em http://www.movimientos.org/es/show_text.php3%3Fkey%3D13569 

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Elaine Santos é socióloga.
Retirado da página do Instituto de Estudos Latino-Americanos da UFSC.

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